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[LIVROS] AS CRÔNICAS DE ATHENA


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O ano é 1985. Das mais obscuras profundezas do Tártaro, os Titãs são colocados em liberdade por um desconhecido. Alheio a isso, o Santuário de Athena se vê em meio a muita tensão com inúmeras crises acontecendo praticamente ao mesmo tempo. Além de lidar com a ameaça dos inimigos declarados, outros estão a espreitar nas sombras, aguardando apenas o melhor momento para agirem...

 

 

Em as Crônicas de Athena, Titãs e Deuses lutarão pela hegemonia sobre todas as coisas que existe. No meio desse embate de proporções cósmicas, Athena e seus sagrados Cavaleiros, buscarão salvaguardar a humanidade e manter viva a chama do ideal que os une.

 

A margem de tudo isso passado, presente e futuro se encontrarão, revelando entre tantas coisas: a origem das primeiras Guerras Santas de Athena, como a Deusa teria ascendido ao poder obtendo de seu pai Zeus a responsabilidade de governar a raça humana.

 

A você que está neste momento lendo essas palavras e que tenha por alguma razão se interessado por esse projeto, gostaria de agradecê-lo por sua atenção e ilustre visita.

Sou o Leandro.

 

Apesar de ser um membro recente desse Fórum já venho aqui como visitante há bastante tempo.

 

Como tenho uma vida profissional e pessoal bastante agitada ocorreu de toda essa demora para formalizar minha estada por aqui.

 

É com grande satisfação que me incorporo a vocês que compõem essa grande família e espero de alguma forma contribuir para a perpetuação desse sonho do qual agora, de certa forma, também faço parte.

 

Já que estamos falando de ‘sonho’, é com orgulho que venho trazer a essa Fórum as Crônicas de Athena.

 

Um sonho antigo, idealizado a custas de muito esforço e perseverança.

 

A história que a permeia abarca uma reinvenção do universo de Saint Seiya incorporando elementos de todas suas franquias e estabelecendo padrões próprios.

 

Inclusive, as mitologias que servem como base e plano de fundo para as histórias acabaram por sofrer alterações — algumas bastante significativas.

 

Outra coisa interessante com relação às mitologias e demais crenças é a junção das mesmas num contexto geral para Saint Seiya, tendo obviamente como base, à grega que é o alicerce da obra.

 

Os textos estarão divididos em Livros e Gaidens que devem ser postados como capítulos sempre as sextas-feiras quando estiverem à disposição do público.

 

Nos Livros poderá ser encontrado toda trama que norteia a história principal.

 

Já os Gaidens trarão esmiuçados os antecedentes de alguns personagens e eventos que orbitam aquilo que acontece nos Livros.

 

Ainda sobre a história...

 

Não me considero em si o autor dela, seria muita pretensão da minha parte.

 

Confio a mim apenas uma pequena parcela de sua realização, sou como alguém que se serviu do muito que já existia e apenas lapidou e organizou as ideias conferindo-as um toque pessoal.

 

Tudo que os leitores irão acompanhar nas Crônicas foi inspirado em tantas outras obras.

 

Inclusive com passagens de textos retirados e condicionados de franquias como Bleach, Naruto, Fate... HQs... livros de autores consagrados como Tolkien, Anne Rice, Dan Brow... e até mesmo de outras Fanfics como a Middle Age.

 

Aqui abro um parênteses, pois foi a Middle Age que me forneceu a maioria dos parâmetros do qual lancei mão. Desde técnicas, nomes, diálogos e tudo que considerei proveitoso foram de certa forma usados como alicerce para as Crônicas de Athena.

 

Não há em mim a vergonha de ter lançado mão de usar tantas outras obras como referência e até mesmo me apossar de suas ideias e nem considero tal ato como limitação, se bem que não contestarei aquele que assim pensar.

 

Muitos acharão que as Crônicas é uma mera cópia ou arremedo, bem, vou deixar que o tempo defina isso.

 

Pois agora começa as Crônicas de Athena!

 

 

 

“E se vi mais longe foi por estar de pé sobre ombros de gigantes (ISAAC NEWTON).”

 

Boa leitura a todos.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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LIVRO ZERO (ORIGENS)

 

Índice dos Capítulos:

 

Capítulo 1 — Gênese

 

Capítulo 2 — A Grande Ambição

 

Epílogo

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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Capítulo 1 Gênese

 

 

No princípio só havia o Caos.

E das suas imensuráveis forças conflitantes originou-se cinco poderosas Entidades Primordiais que o consumiu.

Eram elas: Gaia, Pontus, Uranus, Érebos e Eros.

Uma explosão, conhecida como Big Bang, precedeu o nascimento desses seres atemporais e foi a partir desta que toda ordem se estabeleceu contrapondo o vazio deixado anteriormente pelo Caos.

Do poder de cada entidade se originou a matéria do Universo e a própria realidade.

Por isso Gaia, a grande progenitora e berço de toda vida, ficou conhecida como a Mãe Terra.

Pontus, o soberano Senhor das Águas, era aquele que detinha o controle sobre a manutenção e proliferação da vida além de velar pelo fluxo de tudo que era determinado e estava de algum modo, preso a realidade e o tempo.

Uranus, o implacável Oráculo dos Céus, governava as forças presentes no firmamento e através das chamadas profecias, conduzia a delicada trama do destino, impondo bênçãos ou maldições.

Érebos, o temido Apocalíptico trazia sobre si a essência do Caos que outrora fora suplantado pela ordem; ele era algo como a antítese. Tratava-se do extremo oposto de tudo que havia. Para a vida ele era a morte. Para o amor, o ódio. A razão, a anarquia e por aí vai.

E por fim, Eros, o reticente e sempre voraz Nada que outrora surgira com a brevidade da inexistência do Caos. Em suma, tratava-se do vazio, da nulidade, a ausência definitiva de qualquer coisa que fosse.

Dois dentre eles, Pontus e Érebos, dividiram-se, gerando outros seres e destes sobreveio descendência.

 

Pontus tornara-se Okeanos e Tétis.

 

E deles vieram: as Moiras, os Potamos e os Telquines.

 

Tártaro, Inferno e Elíseos... esses compunham outrora, Érebos.

 

Gaia e Uranus, por sua vez, decidiram reunir a sua volta, matéria suficiente de toda uma variedade de tipos, para criar para si mesmos um corpo físico, que mais tarde podiam desmanchar e dispersar de acordo com suas vontades.

E foi dessa união que a vida, como a conhecemos, originou-se!

 

Tomaram um jovem planeta em formação, para ser o seu lar e domínio.

 

Sua atmosfera em formação se adensava e crescia, à medida que o próprio planeta era violentado por terremotos, vulcões e chuvas torrenciais.

 

Mas com as duas Entidades Primordiais vivendo ali, logo tudo se tornara estável e em pouco tempo, fervilhava de vida.

 

Primeiro na água.

 

Depois na terra e céus.

 

Minúsculos a principio.

 

Até tornarem-se colossais na figura horripilante de grandes repteis.

 

Gaia e Uranus tratavam aquele planeta e toda vida presente nele como sendo o seu ‘jardim’:

 

Éden!

Não tardou em vir seus filhos:

 

Três diferentes raças de seres divinos.

Os tais possuíam um corpo material físico, um espírito imortal e eram detentores de incríveis poderes.

O primeiro dentre eles fora os Hecatônquiros, a seguir viera os Ciclopes e por fim, os Titãs.

A raça dos Hecatônquiros era formada por três indivíduos: Coto, Briaréu e Gias. Seres gigantescos que iam muito além das mais altas nuvens do céu de compleição robusta com cinquenta cabeças e cem braços. Precedidos em sua fama por sua fúria e inigualável força bruta, não possuíam qualquer traço de inteligência ou racionalidade. Causavam apenas destruição e morte por onde passavam e devido a essa sua cólera desenfreada, Uranus os teria aprisionado no Tártaro.

 

Apesar de deterem uma aparência masculina, os Hecatônquiros não possuíam sexo definido e, dessa forma, eram incapazes de gerar descendência.


Também eram três os Ciclopes: Arges, Estérope e Brontes. Mesmo não sendo gigantescos e fortes como seus irmãos Hecatônquiros, ostentavam uma grande estatura, esculpidos com corpos musculosos que os imbuíam de uma força bruta mais que considerável. Um traço marcante em suas aparências era o fato de possuírem apenas um grande olho central onde vislumbravam lampejos do futuro tal qual fazia seu pai em muito maior grau e poder do que eles. Uranus via naquilo uma afronta e amaldiçoou os Ciclopes impondo a seus filhos apenas a capacidade de verem a própria destruição nos acontecimentos que ainda estariam por vir. Para desfazer a maldição de seu pai, os Ciclopes teriam procurado, nos domínios aquáticos de Pontus, por suas filhas, as Moiras. Estas eram capazes de fazer remendos na realidade, mudando e conduzindo sutilmente um fato ocorrido mesmo elas não podendo entrever com exatidão suas consequências póstumas. E foi por essa razão que as Moiras aceitaram de bom grado atender os Ciclopes desde que esses, abrissem mão de um de seus olhos para elas. De posse disso, poderiam enxergar o futuro e assim conduzir melhor suas ações sobre aquilo que acontecia no presente.

 

Não tardou para que Uranus descobrisse o que havia feito seus filhos e isso desencadearia sua ira fazendo-o encarcerá-los no Tártaro junto de seus outros irmãos que por lá já se encontravam.

 

Os Ciclopes eram seres totalmente masculinos, portanto, isso os impedia de se reproduzir. Apesar de serem violentos, eram criaturas dotadas de um grau avançado de inteligência. Foram eles os primeiros a trabalharem a rocha, sobrepujar o poder do fogo e forjarem os metais.

 

A última raça da prole de Gaia e Uranus, os Titãs, dividiam-se em dez e cada um trazia sobre si a natureza de uma emoção, sendo também regidos pelos planetas e o próprio Sol, do Sistema Solar. Cinco dentre eles eram masculinos: Cronos, Hyperion, Céos, Crio, e Jápeto. Por sua vez, existia dentre eles seis que eram femininas — conhecidas também como Titânides: Réia, Téia, Mnemôsine, Têmis e Febe. Diferentes dos Hecatônquiros e dos Ciclopes, os Titãs aparentavam uma pequenez, exibindo estes ainda, corpos delicados e frágeis. Porém, tanto em beleza, poder como em sabedoria eram muito mais superiores. Tanto que limitavam deliberadamente seu poderio, servindo a seus pais, em principal Uranus, sem despertar ciúmes ou temor. E foi graças a isso que não foram banidos para o Tártaro como havia acontecido com seus outros irmãos.

 

Contudo o banimento dos Hecatônquiros e Ciclopes havia despertado, em Gaia, rancor e descontentamento pelas atitudes de Uranus que cada vez mais se tornava vil aos seus olhos. Apesar de todo seu apreço por ele, Gaia, como mãe, amava, sobretudo, seus filhos e não conseguia suportar a dor de vê-los sofrer.

Ela então inspirou a vingança entre os Titãs prometendo apoiá-los contra seu pai e como amostra de seu comprometimento, teria os gracejado com armas que detinham toda essência da destruição.

 

Teve início então a primeira grande batalha em todo o cosmos.

 

Chamada de Genesemachia que colocava os Titãs contra Uranus.

 

O Oráculo dos Céus não via em seus filhos uma verdadeira ameaça, entretanto foi surpreendido quando estes lançaram mão de seu verdadeiro poder, tornando-se tão, ou mais, gigantescos que os próprios Hecatônquiros, igualando em relação a estes, sua incalculável força bruta.

 

Mas foi graças a uma das armas ofertadas por Gaia, empunhada neste caso por Cronos, que Uranus teve sua derrota consumada.

 

Com sua aniquilação, os Titãs resgataram seus irmãos do Tártaro.

Gaia se sentiu feliz ao ver todos os seus amados filhos juntos mais uma vez, mas sua infelicidade também era grande pela ausência de Uranus.

Tomada de grande saudade, tristeza e solidão, deixou o controle do Éden para seus filhos e antes de dispersar seu corpo físico, voltando a repousar na fonte abundante de suas criações, procurou Cronos, seu preferido, para lhe entregar as Vinte e Duas Cartas.

 

Nelas estava depositado todo o conhecimento que Gaia conseguira agregar sobre tudo que existia!

 

Como se mostravam superiores aos Hecatônquiros e Ciclopes, os Titãs se impuseram no poder e nomearam Cronos para ser seu rei. Este por sua vez, desposara sua irmã Réia, para ser sua rainha.

Em pouco tempo, os Titãs expandiram sua hegemonia para além da Terra, passando a controlar também os outros domínios das demais Entidades Primordiais, enfrentando e aniquilando elas próprias ou seus filhos que por lá se encontravam.

 

Essas batalhas ficaram conhecidas pela alcunha de Theomachia.

Por vastos anos os Titãs governaram com supremacia. Mas Cronos, assim como fora com seu pai, se tornara um tirano.

Temendo o poder dos Hecatônquiros e Ciclopes que cada vez mais se mostravam arredios a sua vontade, ele os devolvera para o Tártaro no Mundo dos Mortos.

Uma nova raça de seres divinos nasceu da copulação entre os Titãs. Fisicamente eram muito parecidos com seus progenitores apesar de deterem traços próprios bem marcantes.

 

Essa raça foi chamada de Deuses.

 

De Cronos e Réia nasceram Zeus, Poseídon, Hades, Hera, Héstia e Deméter.

De Hyperion e Téia: Apolo, Artemis e Eos.

De Céos e Febe: Éolo, Hermes e Íris.

De Crio e Mnemôsine provieram Ares, Afrodite e Dionísio.

 

De Jápeto e Têmis vieram Hefestos, Atlas, Prometeu, Epimeteu e Métis.

Cronos sempre observava os Deuses com certa desconfiança, mesmo àqueles que eram seus filhos. Isso porque algo o perturbava. Ele era constantemente assombrado por uma profecia deixada por seu pai antes desse desaparecer. Segundo Uranus, assim como ele que um dia fora destronado, e morto, pelas mãos de um filho, um dia Cronos seria vítima deste mesmo destino trágico.

 

O Titã, inclusive, até pensara em recorrer as Moiras para desfazer a maldição de Uranus como havia feito no passado os Ciclopes, mas estas haviam desaparecido quando Crio lhes tomara os domínios aquáticos de seu pai.

Alguns dos Deuses estavam muito descontentes com a tirania imposta por Cronos. Dentre eles Zeus, Poseídon e Hades encabeçavam a rebelião.

Disposto a desencadear uma guerra contra seu pai, Zeus reunira os Deuses para lutar a seu lado.

Dos filhos de Jápeto, Hefestos e Métis, se juntam aos Deuses.

 

Prometeu não participa da insurreição, escolhendo não se envolver no conflito, abstraindo este, de tomar qualquer partido.

E Atlas e Epimeteu preferem servir aos Titãs.

 

A fim de consolidar o poder de seu exército, Zeus vai secretamente ao Mundo dos Mortos no Tártaro em busca do auxílio dos Hecatônquiros e Ciclopes. Os irmãos dos Titãs resolvem auxiliar Zeus na guerra em troca desse o libertar de sua prisão.

Para igualar o poder das armas divinas dos Titãs, e salvaguardar os Deuses das mesmas, os Ciclopes forjam para os Deuses, através das estrelas, indumentárias bélicas.

 

Com a definição das duas hostes tem inicio uma guerra sem precedentes, talvez a maior já travada.

De um lado, os Titãs. Os Deuses Atlas e Epimeteu. Liderados, esses, por Cronos.

Do outro, os Deuses. Os Hecatônquiros e Ciclopes. Comandados todos, por Zeus.

Essa guerra ficou conhecida como Titanomachia — a guerra dos Deuses contra os Titãs.

Não se sabe quanto tempo durou esse embate. Sabe-se que foi vencida pelos Deuses e que marcou o surgimento da raça humana.

Com a derrota dos Titãs, os Deuses ficaram com o controle absoluto dos domínios governados por seus pais. Os três mais poderosos dentre eles, Zeus, Poseídon e Hades, dividiram o controle de todo o império deixado por Cronos.

Assim, Zeus, o líder supremo dos Deuses, ficara com a Terra.

Poseídon tomara para si os mares.

E Hades, o Reino dos Mortos.

Os demais Deuses ficaram com Zeus, na Terra, sobre sua liderança em um local, a parte, chamado de Olimpo.

Muitos outros, chamados de Deuses Menores, surgiram da união dos agora definidos: Deuses Maiores.

Dentre eles estava à filha predileta de Zeus, Athena.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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Capítulo 2 A Grande Ambição

 

 

Sua mão macia deslizava pelo mármore da sacada. Nenhuma rachadura.

 

Nenhuma falha. Nenhuma imperfeição, por mínima que fosse.

A mesma exatidão poderia ser encontrada em cada parede, aposento ou objeto naquele palácio. A mesma simetria implacável.

E não apenas no palácio, mas também no mundo à sua volta.

Ao longe, uma cadeia de montanhas exibia picos com a mesma altura, a intervalos iguais.

No céu de azul uniforme, nuvens idênticas corriam em velocidade constante e formações rígidas.

Rios de margens retas e curvas exatas cortavam planícies de formas geométricas.

Mesmo as árvores e suas folhas cresciam seguindo padrões rigorosos, exatos.

Contra o cenário correto do Olimpo, sua forma esbelta e angelical parecia ainda mais deslocada, mais imperfeita.

Mesmo absolutamente imóvel, mesmo observando a paisagem sereno, ele parecia inquieto.

Seus olhos de uma pureza desconcertante, perdidos em pensamentos.

Zeus nunca entendeu o que o fazia tão belo.

Claro, os Titãs e os Deuses eram sempre lindos, representavam à perfeição — e perfeição, ele bem sabia, é o objetivo final pretendido por todas as coisas.

Mas com Cronos era diferente.

 

Como alguém podia ser atraente por sua imperfeição? Por suas falhas? Seus defeitos?

Como sua raça eleita, criada como última afronta por sua derrota, poderia desejar alcançá-lo, alcançar a nós os Deuses, se não havia sequer um padrão a alcançar?

Como seguir as regras de alguém, se não há regras a seguir?

Tal anarquia, em uma criatura supostamente igual a ele, perturbava o Deus da Justiça profundamente.

Mas lá estava o Titã. Nunca o mesmo, mas sempre mantendo o que era. Não o caos mutante e insuportável, mas ainda assim diferente a cada olhar, a cada momento.

O Senhor de todo o Panteão, chegou mais perto, sua Égide(1) exalando música metálica e desprendendo poeira estelar ao mover-se.

Cruzou os braços.

De todos os Deuses, Zeus era o único que parecia gentil de braços cruzados.

— Você sabia que seria derrotado. Sabia que seria castigado. Por que não aceitou seu destino com honra e abnegação?

— Eu sabia que isso poderia acontecer. Meu pai Uranus lançou sobre mim essa profecia... essa maldição quando eu o destruí.

Respondeu Cronos, sem tirar os olhos da paisagem.

— Achou que poderia conseguir reverter o que fora determinado pelo destino? Achou que você e seus seguidores pudessem prevalecer sobre o Panteão? Achou que seus crimes hediondos permaneceriam impunes? Achou que seu reinado de terror perduraria?

— Havia uma chance...

— Contra mim e o Panteão não há ‘chances’!

Grunhiu Zeus, com evidente desprezo pela palavra.

— Ahan... perdão, filho. Vivo esquecendo. Perdoe ao menos isso do seu velho pai.

Virou-se. Fitando o filho Deus com seus olhos rubros cor de sangue.

O contraste entre a imagem dele com a de Zeus era evidente.

 

Enquanto ele tinha a aparência delicada e pura de um adolescente mortal com seus doze anos de idade, o Deus da Justiça possuía a aparência de um mortal com o vigor dos seus dezoito anos.

Cronos tinha uma estatura mediana que beirava a pequenez. Zeus por sua vez ia além dos três metros de altura.

O Titã era franzino e esbelto, parecia até doentio. Zeus por sua vez era robusto, tinha um corpo musculoso, escultural e atlético, muito proporcional a seu tamanho espetacular.

A pele de Cronos era morena e acobreada. O Senhor do Panteão detinha uma pele clara que emitia um resplendor dourado.

Os olhos do Titã possuíam o mesmo tom de vermelho-vivo do sangue e durante seus acessos acendiam-se em brasas. Já os de Zeus não possuíam íris e exibiam um azul-anil semelhante aos céus.

Os cabelos de Cronos eram negros cintilantes, desgrenhados e longos até além da cintura. Os cabelos de Zeus eram argentos, longos até os ombros. Apesar de armados como a juba de um grande leão, mantinham se comportados e bem alinhados. Belíssimas pequenas tranças escapavam de suas mechas.

Os traços do rosto do Titã eram finos, delicados como a de uma mulher. Os traços de Zeus eram fortes, másculos, sua expressão transmitia poder e sabedoria.

Cronos não portava sua Sephiroth(2). Vestia-se com uma túnica simples de cor escura sem adornos. O Deus da Justiça por sua vez estava portando sua Égide, com exceção do elmo. Sua vestimenta de beleza incomparável o revestia por completo, formando um conjunto de placas unidas por uma couraça impenetrável. Existiam diversas runas indecifráveis esculpidas em alto relevo e pedras preciosas incrustadas. O traje era formado por uma liga metálica virtualmente indestrutível que exibia uma tonalidade prateada com um fulgor azulado. Este brilho era comparável ao de mil estrelas refulgindo com seu esplendor máximo. Além de trajar seu robe divino, o Senhor do Panteão trazia uma toga alva com capa sobre a armadura onde, a primeira vista, apenas as ombreiras e a cabeça permaneciam visíveis.

 

Uma coisa que ambos compartilhavam era o fato de serem incrivelmente encantadores, não havia palavras suficientes para descrever a beleza das duas divindades.

— Diga-me meu filho, agora que estou próximo do meu fim, como é estar sempre certo? — disse o Titã, em tom de acusação e depois prosseguiu:

"Jamais ter dúvidas sobre o que se deseja? Jamais chorar por um erro que cometeu, ou nunca lamentar algo que não fez? Como consegue?"

— Você gostaria de ser como eu? Por isso sempre me invejou e me temeu tanto? — rebateu Zeus.

Não! — Cronos gritou, então acrescentou inseguro:

"Não é nada disso..."

 

— Então por quê? — insistiu, o Senhor do Panteão e em seu âmago acresceu para si:

 

Por que nunca amou a mim e meus irmãos?!”

 

“Qual a razão que leva um pai a renegar sua própria prole e odiá-los?”

Silêncio.

Uma brisa de temperatura constante soprou. Cronos não sentiu frio, mas mesmo assim segurou os próprios ombros.

Para Zeus ele parecia tão frágil naquele momento. Tão inseguro de si. Tentando em vão se ater a qualquer coisa que o salvasse do castigo que estava por vir.

— Você conhece a história do sapo e o escorpião?

Perguntou-lhe.

Zeus conhecia. Mas deixou seu pai falar assim mesmo.

 

— O escorpião queria atravessar o rio. Pediu ao sapo para fazer a travessia em suas costas. O sapo tinha medo de ser picado, mas pensou: “se ele me matar, vou afundar e ele morrerá também.” — certo de que não seria atacado, o sapo concordou. Então, no meio do caminho, o escorpião picou o sapo: “Por quê?!” — ele perguntou, enquanto o veneno agia e a vida em seu corpo o abandonava. — “Agora vamos os dois morrer! Por que fez isso?” — e o escorpião respondeu: “porque é a minha natureza.”

O Deus da Justiça não precisava da parábola para entender. Seu pai havia nascido com a dádiva de um grande poder. Conheceu o amor e foi amado. Teve a veneração incontestável de seus seguidores e filhos. Fora, inclusive, o preferido de sua mãe Gaia. Em suas mãos, teve o controle absoluto sobre todas as coisas, até mesmo controle sobre o tempo.

Mas mesmo tendo tudo Cronos nunca se sentiu realizado e jamais foi capaz de compartilhar coisa alguma. O motivo para isso era sua natureza.

 

O Titã representava a ambição.

Ambição!

Zeus tinha completo horror dessa palavra. E Cronos era o Senhor dessa força, dessa emoção que controlava o destino de todas as coisas e que também impelia todo ser senciente a alcançar o inalcançável. Uma qualidade que, se nem sempre pode ser admirada, deve, entretanto, ser respeitada. Talvez tanto quanto a ordem, o bem ou a vida.

O Senhor do Panteão em sua eterna sabedoria entendia que a ambição também trazia uma terrível e dolorosa maldição consigo.

 

Bastava um simples olhar para o seu pai para entender bem isso.

O Titã estava fadado a nunca ser verdadeiramente feliz. Ele sempre estaria em busca de algo que não tinha. Ou pior, de algo que não poderia ter. Como agora.

— Entendo que você seja assim.

Disse Zeus, em seu tom sempre grave.

— Teria acontecido cedo ou tarde. Ambos sabíamos.

“Mas e quanto a eles?” — Zeus apontou com o olhar, de uma forma que apenas os Deuses podem, para além dos limites do Olimpo. Para o Plano Material, onde estava a Terra. Para as vastas nações que prosperavam e guerreavam.

“Por que fazê-los assim? Por que precisam passar pela mesma angústia, o mesmo martírio?”

 

— Olhe para eles, Zeus.

Cronos disse quase ofegante, soltando os braços, os olhos fogueados cheios de orgulho.

— São indomáveis. Conquistadores. Invencíveis.

— Algumas crias de Réia também eram. Tivemos que contê-las. — interveio, Zeus.

— Não creio!

O Titã vociferou, em tom de revolta.

— Como pode compará-los a monstros? Não acredito que não consiga ver a diferença!

— Ah, mas eu vejo a diferença.

E desta vez Cronos ficou surpreso, pois havia compaixão na voz do seu filho.

 

— Eles não são maus. Não são cruéis. Eles temem o desconhecido, mas mesmo assim o enfrentam. Eles aprendem com seus erros, mas não cessam de cometê-los. Contagiam os outros com sua energia. Têm vidas curtas, mas intensas. Não importa o que aconteça, nunca deixam de ser eles mesmos — mesmo sem saber quem os são. Pois não existe o humano perfeito e nunca existirá.

“Incrível. Uma raça que nunca será perfeita, mas mesmo assim nunca desiste de tentar. Admiráveis, esses humanos. De todos, Cronos, não pensei que seria você o pai da raça dominante. Mas agora parece tão lógico... afinal você é o pai dos Deuses.”

— Você... os admira?!

Sussurrou Cronos, incrédulo.

— Eu não fazia ideia... — completara não menos descrente.

— Eu os admiro, sim. Mas também lamento por eles.

 

Respondera Zeus, num tom piedoso quase como num lamento.

 

— Você os fez à sua imagem, mais do que qualquer outro ser que já criou. São eternos descontentes. Mesmo com a conquista do mundo, não vão descansar. Mesmo com a soberania sobre as outras raças, não vão parar. E nunca... nunca vão encontrar a felicidade verdadeira. Jamais conhecerão a realização. Sua jornada estenderá para todo o sempre.

Athena costuma dizer que o importante não é o destino, mas sim a jornada — Cronos falara orgulhoso de como a Deusa da Sabedoria, e filha predileta de Zeus, também acolhera os humanos como seus eleitos e fizera deles um povo de honra.

— Justamente! Uma jornada de desejos irrealizados, de anseios nunca satisfeitos. Não acha isso cruel? Fazer com que os humanos sofram como você sofre?

O Titã sorriu suave, sentindo o peito aquecido. Por alguma razão, era confortante saber que mesmo Zeus não tinha todas as respostas. Seu filho não entendia todas as coisas.

— É assim que você me vê? Acha que estou sempre infeliz? Que sou algum tipo de eterno amaldiçoado?

Zeus não respondeu, limitando-se a encará-lo.

Cronos avançou delicadamente em sua direção, o tocando ternamente, sentindo pelo filho uma estranha e inadequada piedade. Nem parecia ser ele prestes a receber o castigo divino.

 

— Seus seguidores serão todos lançados no Tártaro...

Sentenciou friamente o Senhor do Panteão, afastando-se de Cronos e decidido a não mais estender aquele momento.

— E suas Sephiroths ficarão lacradas por meu Selo nas ruínas do que restara do Labirinto de Cronos.

“Quanto a você, Cronos, terá seu corpo e seu espírito imortal fragmentado e espalhado no continuo do próprio tempo e espaço. Nunca mais poderá se reunir como agora.”

 

Zeus fizera uma pausa e depois, acrescentara.

— Por se tratar da mais terrível das Sephiroths, a sua, em particular, ficará sobe a minha posse.

“Quanto aos humanos, permitirei que vivam suas vidas em paz sem a interferência nossas em seu mundo. Afinal eles já têm como fardo a própria maldição que você mesmo impôs ao criá-los. Não merecem pagar pelo crime de seu criador. Eles já sofrem o bastante, não serei eu a impingir-lhes mais tristeza.”

 

“No entanto, imporei a eles minha justiça...”

 

“O conhecimento do bem e do mal e que, por si só, façam suas escolhas, pagando pelas consequências das mesmas.”

“Você, Cronos, disse a pouco que os humanos são movidos pelo desejo. São movidos pela busca, pela jornada. Pois que eles tenham uma busca. Um desafio. E quando esse desafio for vencido, você e seus seguidores no Tártaro estarão livres para retornar.”

De alguma forma, naquele momento, cada ser humano na Terra podia sentir um estranho entusiasmo enquanto Zeus explicava as regras e Cronos ouvia com excitação crescente.

O Titã ouvia tudo atentamente, mas nada daquilo parecia aterrorizá-lo ou mesmo causar a mínima desestabilização que fosse. Quanto maiores às dificuldades, quanto mais obstáculos Zeus apresentava, mais os olhos escarlates de Cronos chamejavam de emoção.

 

— Tem certeza de que entendeu? — o Deus da Justiça sabia ser inapropriada uma reação daquelas diante do que estava por vir.

— Sim! Claro que sim! Você está colocando meu destino... minha vida e as de meus fiéis seguidores... nas mãos deles!

— Não está preocupado?

— Como poderia?! Como, se agora tenho a certeza total de que serei salvo!

— Como pode ter essa certeza?

— Porque confio neles! Foram feitos assim. Feitos para nunca desistir. Feitos para superar qualquer coisa. Não importa o quão difícil seja.

— Levará muito tempo. E é provável que isso jamais se realize.

— Esperarei. De joelhos. Clamando por sua ajuda.

— Em geral os devotos oram as divindades pela salvação. O contrário não é comum.

— Eles não são um povo comum.

Sem mais nada a dizer, uma das mãos de Zeus, revestida completamente pela manopla de sua Égide se abriu, e ele sacou um relâmpago. Cronos recuou assustado ante a manifestação do poder de seu filho. Mesmo com a confiança que tinha na própria salvação, o castigo não era fácil de enfrentar.

O Titã chorou.

— Eles são a minha maldição para vocês, pretensos, Deuses — vociferou, Cronos.

— Isso é ridículo. Como essas frágeis e desgraçadas criaturas podem ameaçar o domínio e o poder supremo dos Deuses?

— O tempo dirá.

 

Deu as costas a seu filho, pousando as mãos trêmulas na sacada, e esperou pelo golpe. O relâmpago empunhado como uma lança riscou no ar um arco perfeito de luz, mas parou no meio do caminho. Zeus sentira que o Titã condenado ainda tinha algo a dizer.

— Haverá, sim, um fim para a jornada. E um dia eu regressarei. Nesse dia você e o Panteão pagarão caro por terem se voltado contra mim.

“Você e os outros Deuses querem a adoração e admiração de seus eleitos; essa raça abjeta que chamam de Anjos. Querem que seus devotos sejam iguais a vocês. Mas eu, Cronos, não quero que os humanos, meus eleitos, se ajoelhem para mim. Não quero que sejam iguais a mim.”

“Quero que sejam MELHORES que eu.”

“Melhores que NÓS.”

E nesse instante, fitando seu ‘carrasco’ furtivamente, acrescentou:

— Eu criei os humanos para que eles nos SUPEREM!

O relâmpago terminou sua jornada.

Mas a jornada humana apenas havia começado...

 

 

(1): Aqui nas Crônicas de Athena, o termo Kamui, que é apresentado no universo de Saint Seiya para designar as vestimentas dos Deuses, foi trocado para Égide. Então, nas Crônicas, ao invés de Kamui, teremos as Égides.

 

(2): No universo das Crônicas de Athena, substituindo a palavra Sohma que é apresentado em Saint Seiya, mais precisamente no Episódio G, como termo que nomeia as armas divinas dos Titãs, teremos Sephiroth. Ou seja, nas Crônicas, ao invés das armas dos Titãs serem chamadas de Sohmas, serão chamadas de Sephiroths.

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Epílogo

 

 

 

TITÃS! — a voz soou imperiosa como o trovão, subjugando os estrondos das águas revoltas do Rio Estige no Mundo dos Mortos.

As águas estavam suspensas pelo poder daquele estranho ser que se ocultava com um manto negro de capuz esfarrapado.

 

Ele era constantemente açoitado pelas fortes rajadas de vento que faziam suas vestes esvoaçar e traziam também até suas narinas, o fedor insuportável de morte e o cheiro do ozônio queimado.

Flutuava como a uma aparição, parado no ar em meio à vastidão dos céus encobertos por trevas eternas.

 

MEUS AMADOS SEMELHANTES! — dessa vez o som da voz teve a companhia de uma sucessão de relâmpagos.

Por um momento, graças à luz que havia apunhalado os céus e ferido a escuridão, revelara-se entre tantas coisas que a figura do estranho conduzia uma biga de batalha puxada por dois pares de corcéis negros.

 

Os animais estavam ariscos e inquietos, empinando e relinchando com insistência.

 

Esfregavam suas patas dianteiras contra os ventos furiosos do céu.

 

Abaixo deles, a centenas de metros, os contornos de um desfiladeiro submarino insinuava-se no ponto exato onde a muralha aquática havia sido erigida.

 

No fim daquele tenebroso abismo existia uma caverna obscura que tinha sua entrada selada por relâmpagos ancestrais.

 

FILHOS DE GAIA, A MÃE TERRA.

“TAMBÉM PROLE DE URANUS, O ORÁCULO DOS CÉUS.”

 

Uma pausa.

QUEM OS CONDENOU A PASSAR O RESTO DE SUAS IMORTALIDADES APRISIONADOS NESTE ANTRO FÉTIDO E IMUNDO DESDE A AURORA DOS TEMPOS?

Súbito, grunhidos ininteligíveis e sussurros amaldiçoados começaram a surgir do interior escabroso daquela fétida alcova.

 

QUEM OS CONDENOU AO EXÍLIO ETERNO NO TÁRTARO?

 

Lá em cima, o estranho ser continuava atiçando o ódio daquelas terríveis criaturas com suas palavras.

QUEM USURPOU DE VÓS O DIREITO INATO DA SUPREMACIA?

Zeus!

 

O nome foi cuspido, sobrepujando qualquer outro som que pudesse vir da escuridão.

 

O estranho lá em cima sorri maldosamente ante a isso e recebe outro açoite de vento gelado.

 

Na caverna, a criatura que havia se pronunciado abandonara a negritude que a encobria se aproximando da entrada selada por relâmpagos.

 

Seus olhos refugiam em brasas escarlates, traçando um espectro fantasmagórico à medida que avançava.

 

A barreira que impedia qualquer acesso a alcova emitia próximo da entrada um manto ofuscante de luz que conseguia vencer o olho formado pelas trevas que envolvia todo o interior daquele tenebroso lugar.

 

Com elegância e uma desenvoltura cadenciada, a criatura se movia.

 

Quando foi banhada pela luz foi possível distingui-la:

Sua figura diminuta estava toda coberta por uma toga negra de capuz.

 

Havia parado bem perto da entrada da caverna.

 

Lentamente levou uma de suas mãos ao encontro dos relâmpagos que se entrelaçavam como as grades de uma cela.

 

O membro estava nu.

 

A pele possuía um tom moreno bem escuro e as unhas aparentavam ser bem cuidadas sendo lustrosas como o vidro.

 

Uma poderosa descarga elétrica repeliu a ação.

 

Nenhum lamento de dor foi emitido.

 

Apenas a mão recuou trêmula, chamuscada e com sangue vertendo por entre os dedos.

Lá em cima, num momento que pareceu durar uma eternidade, o estranho de manto em sua biga movera os braços para frente do corpo, erguendo-os um pouco para o alto.

 

Seus dedos flexionaram como garras.

Os membros expostos eram revestidos por uma espécie de couraça que emitia um fulgor que se avultava impedindo que qualquer detalhe da vestimenta fosse discernível.

 

Dos dedos fora emitida uma poderosa descarga cósmica que atingira a barreira de relâmpagos que lacrava a entrada da caverna.

 

Do feixe energético partiu um clarão de brilho opaco que cobriu como um manto de luz todo o local ao redor do estranho.

Lá embaixo, no interior da caverna, oito pares de olhos rubros se acenderam de dentro da escuridão.

 

Eles contemplavam a cena acima deles incrédulos.

 

As duas energias estavam se mesclando num embate acirrado.

 

De repente, ouviu-se um estrondo que abalou os alicerces de todo o Mundo dos Mortos.

Um ponto brilhante cintilou no local exato onde as duas forças se colidiam e depois, explodiu para fora em uma onda magnânima de luz que irradiou como a um anel em todas as direções.

Lá embaixo, próxima à detonação, a criatura que tivera a mão repelida, recuou.

 

O clarão ofuscou por um breve momento. Incandescente, cortante e depois se recolheu depressa, absorvendo-se a si mesmo e transformando-se em um cisco diminuto que desapareceu, virando um simples nada.

A criatura, próxima onde antes houvera a barreira, piscou com dor, aos poucos recuperando a visão. Apertou os olhos confusos.

 

O Selo de Zeus... a grade de relâmpagos que estivera na entrada da caverna desaparecera completamente.

 

Evaporara-se. Extinguira-se. Não havia sequer o menor vestígio dela.

Boquiaberto como se estivesse despertando de um transe, a criatura exclamou:

F-FINALMENTE!

Os outros atrás dele, emergiram cada qual do mesmo estado catatônico.

Suspenso nos céus, por sua biga de batalha, a voz do estranho de capuz reverberou uma ultima vez chamando para si a atenção das criaturas que ainda permaneciam no interior da caverna em êxtase.

 

É CHEGASTE O FIM DE VOSSOS EXÍLIOS. E AGORA QUE ESTÃO LIVRES O QUE IREIS VÓS FAZERTES TITÃS?

Da caverna, as vozes de oito, das nove criaturas, ressoaram em uníssono, respondendo a indagação do seu libertador:

DESTRUIR ZEUS!

Somente Hyperion, aquele que estava à frente do demais, ficou em silêncio como em contemplação, ignorando a figura do estranho libertador.

 

Ele ficou ali parado diante da entrada não mais lacrada, com sua mão ainda ferida por ter havido tocado na barreira.

Ao ouvir a resposta dos Titãs o estranho sorriu satisfeito e desapareceu, desvanecendo como a uma miragem ao sabor dos ventos como se ali nunca estivesse estado.

No próximo segundo a seguir, toda uma realidade se altera.

 

Os Titãs estavam livres e nenhuma criatura no cosmos estava mais segura.

 

Fim.

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  • 5 meses depois...

Capítulo 1 Novo Mundo

 

 

São Francisco, Califórnia, Estados Unidos da América.
Século vinte. Ano de 1985.

 

 

O mundo mudou.

Bastava olhar para o céu e ver que mesmo este havia sido profundamente alterado. As belas estrelas que brilhavam na sua época há muito já haviam extinguido sua chama e se perdido no firmamento.

Hyperion e seus queridos irmãos ressurgiram neste século vinte, ano passado.

Duas coisas os trouxeram de volta:

Primeira — um estranho havia conseguido, de forma surpreendente, romper o lacre divino do Selo de Zeus e os libertara de sua prisão ancestral no Tártaro. Até então jamais voltara a procurá-los ou a exigir algo pelo que havia realizado para com ele e os irmãos. Aquilo causava estranheza, mas pouco importava para Hyperion. Afinal, se seu libertador achava que com isso podia manipular os Titãs, Hyperion teria o prazer de mostrar o quanto o sujeito estava enganado em suas pretensões e qual seria o preço pago por sua estupidez.

Em segundo, e o mais importante — era o desejo de vingança que nutriam contra Zeus e os Deuses do Panteão.

Mas caminhando agora tranquilamente pelas ruas apinhadas de gente da bela cidade de São Francisco, o Titã não pensava em vingança. Não pensava nos Deuses do Panteão e em Zeus. Nem mesmo pensava nos seus queridos irmãos, no seu venerado rei e na incumbência de sua adorada rainha. Hyperion estava simplesmente maravilhado com o mundo novo a sua volta, tentando compreender cada nova descoberta.

 

Em seus muitos anos de exílio no Tártaro, os Titãs se mantiveram isolados de tudo e de todos. Remoíam o ódio que sentiam pelo soberano do Olimpo e sua corja, além do desejo de destruí-los. Mas, além disso, o que estava acontecendo com os humanos na Terra os interessava e ao mesmo tempo os fascinava. Graças ao poder desenvolvido de suas poderosas mentes podiam receber as informações de todo o mundo material e com suas sensibilidades, projetar imagens, tais como faziam os humanos quando sonhavam.

Com o tempo, passaram a entender o calibre das mudanças pelas quais a humanidade havia passado e começaram a se interessar ainda mais. Ouviam informações específicas sobre as guerras e as invenções, certas novas maneiras de falar e as chamadas Guerras Santas travadas por Athena e seus Cavaleiros contra aqueles que desejavam impor o controle sobre a Terra afligindo os humanos.

Tudo aquilo tinha sido fascinante, entretanto nada se comparava com o que Hyperion estava experimentando agora. Neste momento, não mais via as coisas como um mero espectador, estava agora vivenciando tudo aquilo.

O Titã experimentava todas aquelas sensações a partir de um jovem corpo mortal com o qual havia possuído com sua essência divina tal como ele havia visto os Deuses e outras entidades fazerem durante os séculos quando estes resolviam caminhar juntamente com os humanos. No começo achou tudo muito incomodo e desagradável. Levou algum tempo até se acostumar com as limitações físicas e com as sensações que o bombardeavam vindas de todos os lados. A fusão de seu espírito imortal com aquele invólucro também havia restringido em muito seus poderes.

 

Provavelmente aquela carcaça não suportaria caso ele resolvesse liberar uma pequena fração de seu vasto poder.

 

Apesar de todos os contratempos, Hyperion se regozijava, pois agora podia caminhar pela Terra como um mortal qualquer e experimentar tudo que o mundo tinha para oferecer.

Estava ‘nadando’ em descobertas. As pessoas a sua volta o deixavam intrigado e ao mesmo tempo despertava nele o mais puro êxtase. Elas eram aventurosas e eróticas assim como ele tinha as vistos ser em sua mente nos velhos tempos, antes das grandes revoluções da classe média no final do século dezoito. Elas possuíam até a mesma aparência que tinham naquela época.

Os homens agora se vestiam como queriam, não mais só trajavam uniformes, gravatas e ternos. Portavam trajes de veludos, de cores estonteantes, e o que mais tivessem vontade. Já não precisavam mais cortar seus cabelos curtos e aparados como os soldados romanos, podiam usá-los com o comprimento e da maneira que desejassem.

E as mulheres — ah, as mulheres! Elas eram gloriosas e magníficas, despidas do calor da primavera como se estivessem no antigo Egito dos Faraós. Usavam saias bem curtas e vestidos parecendo túnicas. Ou então calças masculinas e camisas coladas nos corpos curvilíneos e voluptuosos, caso fosse esse, do seu agrado. Elas se pintavam e se enfeitavam com ouro, prata e bijuterias, mesmo para ir até a padaria ou a farmácia. Ou muitas vezes saíam de cara limpa e sem qualquer adorno — isso não importava. Elas anelavam os cabelos como havia feito Maria Antonieta, faziam cortes bem curtos ou deixavam que crescessem livremente. Pela primeira vez na história, talvez, fossem tão fortes e interessantes como os homens.

 

E essas eram as pessoas ‘comuns’ da América. Não apenas os ricos e abastados, que sempre possuíram traços de androginia, uma certa “joie de vivre” que os revolucionários dos séculos passados chamavam de decadência.

A velha sensualidade aristocrática pertencia agora a todos. Estava ligada às promessas das revoluções passadas, e todos tinham direito ao amor, ao luxo e às coisas agradáveis.

As lojas tornaram-se palácios de um encanto quase oriental — mercadorias expostas entre macios carpetes coloridos, músicas suaves e luzes amarelas. Nas drogarias, abertas à noite toda, frascos de xampu violeta e verde brilhavam como joias nas cintilantes prateleiras de vidro. Garçonetes iam para o trabalho dirigindo luzidos automóveis com estofamento revestido de couro. Portuários regressavam para seus lares e nadavam em piscinas térmicas nos seus quintais, faxineiras e bombeiros, no final do dia, vestiam roupas primorosamente talhadas e manufaturadas.

De fato, a pobreza e a imundice, comuns em todas as grandes cidades do mundo desde os tempos imemoriais, haviam sido quase que inteiramente removidas. Não se viam imigrantes caindo mortos de fome pelos becos. Não havia favelas onde oito pessoas ou dez dormiam dividindo desumanamente o mesmo espaço. Eram poucos aqueles que jogavam lixos nas sarjetas. Os mendigos e os aleijados, os órfãos, os doentes irremediáveis eram tão poucos que praticamente não se notava suas presenças pelas ruas imaculadas. Até mesmo os bêbados, drogados e lunáticos que dormiam no relento em bancos de praças ou viadutos, comiam carne regularmente e tinham roupas limpas para vestirem.

 

Mas isso era somente a superfície, o que mais deixava Hyperion estarrecido eram as mudanças mais profundas que impulsionavam esta espantosa corrente. Ele se perguntava se seu rei, Cronos, havia vislumbrado algo assim em suas visões do futuro. Mesmo considerando o poder quase ilimitado de seu soberano, o Titã achava que não. Nada no cosmos poderia ter concebido algo assim.

Alguma coisa mágica havia acontecido com o tempo. O velho não estava mais simplesmente sendo substituído pelo novo, ao contrário, ele estava sendo incorporado e, absorvido.

No mundo das artes e entretenimento, todos os séculos anteriores estavam sendo ‘reciclados’. Músicos tocavam Mozart tão bem quanto Jazz ou Rock; as pessoas iam assistir Shakespeare numa noite e um novo filme do Spielberg na outra.

Em imensas lojas iluminadas por luzes fluorescentes podiam-se comprar fitas com madrigais medievais e tocá-los no estéreo do carro enquanto se corria a cento e oitenta por hora nas autoestradas. Nas livrarias, a poesia da Renascença era vendida lado a lado com os romances de Dickens ou de Ernest Hemingway. Manuais de sexo estavam no mesmo balcão com o Livro dos Mortos dos Egípcios e a Bíblia Sagrada dos Cristãos.

Às vezes a riqueza e a limpeza de tudo ao seu redor pareciam tornar-se uma alucinação. O Titã pensava estar enlouquecendo.

 

Através das vitrines das lojas ele olhava estupefato para computadores e telefones com formas e cores tão aberrantes quanto as mais exóticas flores concebidas pela natureza. Enormes limusines prateadas ‘navegavam’ pelas ruas daquela cidade como indestrutíveis monstros marinhos. Resplandecentes torres de concreto perfuravam os céus como obeliscos. Incontáveis programas de televisão despejavam um fluxo incessante de imagens e informações em cada quarto das casas e prédios.

Mas nada daquilo se tratava de uma sucessão de alucinações. Este século herdara a Terra em todos os seus sentidos.

E uma parte significativa deste imprevisível ‘milagre’ era a curiosa inocência daquelas pessoas bem no centro de toda aquela liberdade e riqueza. O Deus Cristão estava tão morto quanto estivera nos séculos passados. E nenhuma outra nova religião havia surgido para substituir à antiga.

Ao contrário, as pessoas mais simples desta época se orientavam por uma vigorosa moralidade secular que era tão forte quanto qualquer dogma religioso que Hyperion conhecera. Os intelectuais carregavam as bandeiras. No entanto, pessoas inteiramente ‘comuns’, por toda a América, se preocupavam apaixonadamente com a “paz”, a “pobreza”, as “guerras” e o “planeta” como se estivessem imbuídas por algum zelo místico.

Elas pretendiam erradicar com todos os ‘males’ que afligiam a humanidade naquele século. As doenças seriam eliminadas a qualquer preço. Discutiam ferozmente sobre a pena de morte e o aborto. E as ameaças de “poluição ambiental” e de “holocausto nuclear” eram combatidas tão violentamente quanto à feitiçaria ou a heresia foram em épocas remotas.

 

Quanto à sexualidade, já não era mais uma questão envolvida pela superstição ou o medo. Ela estava sendo literalmente despida dos últimos traços de religiosidade. Por isso se enxergava nas ruas as pessoas se abraçando ou se beijando sem qualquer pudor.

Conversavam agora sobre ética, responsabilidades e a beleza do corpo. A procriação e as doenças venéreas estavam praticamente sobe controle.

Ah, o século vinte! Ah o giro da grande roda!

 

Mesmo um ser divino como Hyperion jamais poderia ter sonhado com um futuro assim. Onde estivesse seu rei, Cronos, sem duvida deveria estar satisfeito com aquilo que tinha alcançado suas criações, os humanos.

Sob a tênue luz âmbar de um quarto de hotel, enquanto devorara, ávido, uma pizza e bebericava um refrigerante, Hyperion observava emocionado na tela diante dele um filme de guerra excepcionalmente bem feito intitulado de Apocalypse Now. Que maravilhoso era a sinfonia de som e cores, cantando a antiga batalha do mundo contra as forças do mal. “Você deve se tornar amigo do horror e do terror moral.” — dizia convicto o comandante maligno enlouquecido em um jardim selvagem no Camboja, a quem o homem, tomado por sua moralidade, respondia como sempre havia respondido e com uma convicção ainda maior: — “Não”.

Não! O horror e o terror moral nunca podem ser absorvidos. Eles não possuem valor real. O mal puro não tem lugar real. Não passa de abominação.

 

E isto significava, acreditava Hyperion, que ele também não tinha lugar neste ‘novo mundo’.

Exceto, talvez, se desejasse subverter aquilo tudo que observava tão fascinado, impondo sua vontade através da força.

Aquilo tudo era mais que suficiente para fazer um monstro da antiguidade como ele voltar para a caverna escura e úmida da qual havia saído no Tártaro. Esta atordoante irrelevância conferida aos desígnios das coisas, onde até mesmo ele, um ser divino de poder absoluto, estava sujeito as correntes que impulsionavam as mudanças. Aquilo era o bastante, para o Titã deitar-se e descobrir que também podia chorar.

 

— Mas onde estavam Zeus e os Deuses do Panteão?

 

Se perguntava, já sabendo no âmago de seu ser, a resposta.

— Provavelmente estavam no Olimpo se escondendo nas sombras como os insetos repugnantes que eram. Certos de sua supremacia, julgando-se superiores a tudo e a todos...

 

Tolos!”

 

Disse consigo em meio a um sorriso cruel.

 

O orgulho sempre antecedia a queda.

“E, bem, quando chegar o momento dele e os irmãos começarem a colocar seus planos de conquistas em ação, ele os traria todos para a ‘luz’ deste ‘novo mundo’ e então Hyperion e os Titãs teriam sua almejada vingança.”

 

 

 

 

 

América do Sul, costa leste do Brasil – Oceano Atlântico.
Ilha de Marajó.

 

 

No passado, essa ilha foi reduto de piratas e corsários que singravam o Atlântico atrás de pilhagens. Mas hoje, seus poucos habitantes viviam da pesca e da agricultura. Em paz, longe de qualquer conflito, apenas viviam suas vidas. Isso, até que o Senhor da Guerra chegou. E todas as pessoas daquele pacato lugar descobriram, em meio a um sofrimento indescritível, qual era o horror da sensação de serem subjugados e trucidados como se fossem menos que animais.

Num vilarejo, sentado no meio do que restara de uma praça pública, em cima de um tronco cortado, estava à criatura responsável por toda aquela desgraça: um homem incrivelmente alto com mais de dois metros de altura, mulato e absurdamente musculoso, que aparentava ter pouco mais de trinta anos.

 

Trajava sobre sua forma corpulenta um pedaço de tecido escarlate, provavelmente uma cortina ou lençol, que semelhante a um manto, cobria-o por completo, deixando somente exposta, sua cabeça e parte dos antebraços. Seus cabelos curtos e descoloridos, raspados bem rentes nas laterais como a um corte militar, estavam todos tencionados para cima. Seus olhos negros eram incisivos. Tinha uma tatuagem sombria na face direita, parecendo um símbolo tribal. Suas orelhas eram adornadas com brincos dourados de argolas. Segurava, naquele momento, um crânio humano, olhando com macabro interesse, perscrutando cada nuance até que algo chama sua atenção. Ele se levanta, sorri diabólico e esmaga o crânio.

 

— Depois de tantos anos, esperava mais satisfação.

 

Disse, olhando com desprezo as casas destruídas, colheita perdida e as centenas de corpos que jaziam esmagados no chão, alguns ainda agonizantes, outros sendo devorados por abutres e cães, infestando o local com um odor pútrido e infinitas moscas.

 

— Testando as habilidades de seu novo corpo, Crio?!

Uma voz calma e familiar trazida pelo vento.

— Sim.

 

Retorquiu o sujeito, mudando seu semblante, agarrando com ambas as mãos as laterais de seu ‘manto’ que esvoaçava, numa amostra clara de imponência.

— Pensei em ir até uma grande cidade do continente, mas eu me encantei por essa mísera ilha. Talvez faça dela meu refugio quando o mundo nos pertencer novamente e Zeus e os malditos Deuses do Panteão forem devidamente punidos e... esmagados.

Passos.

 

Um sorriso franco e gentil em reposta ao irmão homicida. Hyperion estava agora a poucos metros de Crio.

O corpo mortal que tomara para si o Titã era de um adolescente com pouco mais de quinze anos. O invólucro tinha a pele pálida e os cabelos bem negros caídos até a altura do queixo. Seus olhos, em mesmo tom, pareciam calmos e insondáveis.

Caminhava negligente, os polegares enfiados nos bolsos de seu jeans azul desbotado. A blusa de mangas longas, branca e fina, feita de algodão, dava um caimento agradável sobre seu corpo magro e delicado. Crio se perguntava por que o irmão escolhera aquele corpo mortal de aparência tão frágil. Poderia ter escolhido qualquer outro que lhe aprouvesse.

— Pressupunha que estivesse com os outros, Hyperion?

 

— Eu estava. Mas, Réia me mandou até aqui para uma missão. Acabei aproveitando para estudar esse novo mundo. Ver as coisas com meus próprios olhos e experimentá-las também.

— Claro. E já que mencionou nossa rainha, o que ela a nossos outros irmãos andam fazendo?

— Estão no Labirinto de Cronos discutindo estratégia, tentando romper o Selo de Zeus sobre nossas Armas Divinas e buscando descobrir um meio de trazer de volta, nosso rei.

Hyperion chegou mais perto fitando, de baixo para cima, Crio. Seus olhos então se estreitaram e ele falou em tom de repreensão:

— Sabe que não devemos chamar em demasia atenção sobre nós. Ainda não estamos preparados para a guerra que virá. Foi imprudente procedendo desta forma, Crio. — lançara um olhar de soslaio para a destruição que os cercava.

Antes que o outro pudesse justificar qualquer coisa, o interrompeu com um gesto, fazendo-o de imediato se calar:

 

— Sua insensatez pode nos custar caro. Sinto presenças cósmicas vindo nessa direção.

 

Crio ficara aparentemente surpreso mediante a isso. Olhara para os lados um tanto receoso; a maneira como havia se colocado em guarda sugeria que as tais ‘presenças’ mencionadas pelo irmão fossem saltar, a qualquer instante, das sombras, para atacá-lo. Depois de perceber o quanto estava sendo ridículo, voltou novamente sua atenção para Hyperion, tentando manter a compostura e recobrar a confiança.

— Eu já sabia disso. — mentiu.

 

Seus sentidos cósmicos, na verdade, não haviam detectado coisa alguma. Nem mesmo, há instantes atrás, percebera Hyperion, até que este se revelasse. Aquilo deixava Crio levemente preocupado e irritado, pois podia torná-lo vulnerável.

 

O Titã queria ocultar a todo custo do irmão, essa sua deficiência.

Ao que tudo indicava tal coisa, certamente, deveria estar sendo ocasionada pela fusão da sua essência divina com aquele inseto mortal que havia tomado. Crio ainda tinha muitas dificuldades para controlar as funções daquela carcaça desprezível que provisoriamente havia se tornado sua.

— Pelo tipo de Cosmo deve se tratar dos sagrados Cavaleiros de Athena. — falara Hyperion em um tom neutro tirando Crio de seus devaneios.

Bah! Os capachos da filhinha predileta de Zeus, heim?! Esses infelizes têm, de fato, muita coragem, ou bom senso nenhum, em virem até aqui para ter comigo. Que seja! Eu estava precisando mesmo me exercitar. Vai ser divertido, vou esmagá-los lentamente.

Você deveria era se retirar. Não há motivos, por enquanto, para confrontos desnecessários.

Crio arremessou com um travo de cólera, o ‘manto’, em resposta. Exibindo por debaixo deste, o corpo nu e musculoso que logo, depois dele esbravejar "COLOSSO TITÂNICO", começara monstruosamente, se agigantar.

 

O Titã agora atingia as mais altas nuvens do céu com sua nova estatura adquirida e abaixo dele, tudo parecia insignificante, inclusive o próprio irmão.

 

— Sabe o quanto respeito e amo, Hyperion. Mas não posso de maneira alguma atendê-lo nisso que me pede. Depois de tanto tempo confinado desejo me exercitar um pouco...

 

“Até mesmo as melhores armas se enferrujam após um longo tempo sem uso...”

 

“Preciso praticar!”

 

— Faça como quiser, Crio. Não vou mais tentar dissuadi-lo. Peço-lhe apenas para não exagerar. E como antes já lhe adverti, repito: não é do nosso desejo, e vontade, chamar, por enquanto, sobre nós, uma atenção excessiva.

O gigante sorri mostrando os alvos caninos protuberantes.

— Pode ir em paz, irmão. Crio, o Senhor da Guerra, só vai se divertir um pouco, nada mais que isso.

Com a palma de uma das mãos segura pelo punho à frente do próprio peito, ele exerce uma tensão sobre o local, fazendo com que os ossos daquela região, estralem.

 

De soslaio, mira o cenário a sua volta.

 

Semelhante a um vulto, sua figura monstruosa perde a nitidez; movendo numa velocidade pouco condizente a sua enormidade; ia de um ponto ao outro do vilarejo, atacando as construções com pisões e aquelas que eram mais elevadas, com movimentos em arco de seus antebraços. O ecoar de cada investida era como o ribombar de um trovão e fazia com que elipses de pressão agitassem ao próprio ar e gerassem ainda mais destruição. Os alaridos são ouvidos desde toda a extensão da ilha até o continente. O colosso sorri novamente, ao se deter no mesmo ponto de outrora, para contemplar o resultado de sua força inigualável. Nada restara das construções, a não ser entulho. Não demoraram em se fazer audível, as lamúrias dos desgraçados que, escondidos em seus lares, os viram ruir sobe suas cabeças.

Crio então se abstrai de tudo aquilo e volta à atenção para onde deveria estar o irmão, e percebe que este, se fora.

Ele nem se despediu...

 

Resmungou com as feições em desagrado. Então emendou outro sorriso, fixando o olhar maníaco no horizonte.

— Que venham então estes Cavaleiros de Athena. Estou ansioso para ver como eles são...

 

“Por dentro!

 

A risada ecoa.

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  • 4 semanas depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

 

 

 

Capítulo 2 O Arauto e o Guardião

 

 

 

Costa leste do Brasil.
Próximo da Ilha de Marajó.

 

 

Entardecer.

 

Eram, se assim podemos chamá-los, dois ‘velocistas’.

 

De posse de MARATONA(1), uma técnica de deslocamento que empregava a velocidade sobre-humana dos Cavaleiros de forma prolongada, conferida especificamente à função que, orgulhosamente, desempenhavam:

 

Batedores do Santuário de Athena!

 

Tão velozes eram em suas passadas, que mesmo os observadores mais aptos, teriam dificuldades para discernir os contornos de seus corpos delgados e das pesadas mochilas que carregavam nas costas, como bagagem.

 

Denotava que algo havia passado por ali apenas aquilo que era agitado em suas esteiras — e mesmo isso, era bastante mínimo, quase nulo, já que a explosão cósmica gerada abaixo das solas de seus pés, que lhes serviam de propulsão, irradiava, de baixo para cima, contínuas ondas, que similar a um campo de força, salvaguardava seus corpos frágeis contra todos os impropérios de um deslocamento absurdo daqueles e atenuava também os danos no ambiente.

 

Quando cruzavam com alguém em seu caminho, este, depois do sobressalto e constatar que não havia nada ao redor, apenas imaginava que fora o vento, num açoite mais abrupto.

 

Desde que os Oficiantes(2) captaram o surgimento de uma atividade cósmica naquelas paragens, Dante e Capella, foram convocados e postos imediatamente em ação.

 

Bastaram algumas horas e já estavam cruzando, a , o Mediterrâneo, indo em direção ao Atlântico, até chegarem ao nordeste brasileiro.

 

Segundo os informes dos anciões que os orientavam o tempo todo, a Manifestação assim nomeava-se, pelo Santuário, toda atividade cósmica desconhecida — deslocava-se contornando a costa continental.

 

Não sabiam, ainda, qual era o meio usado por ela para se locomover.

 

Seja o que fosse, pelas grandes distâncias que conseguia cobrir em intervalos curtos de tempo, só podia ser rápida...

 

Muito rápida!

 

Talvez até mais que Dante e Capella.

 

A Manifestação parecia à procura de alguma coisa.

 

Depois de um certo tempo, detera-se numa ilha.

 

Estando os Batedores agora tão próximos e com a Manifestação estacionada em um lugar específico, passaram a se orientar sozinhos sem o suporte dos Oficiantes que os havia guiado mentalmente até então.

 

Com seus Cosmos mascarados, algo que já conservavam desde a partida do Santuário, deixavam um pequeno centro urbano e passavam agora pelas cercanias de uma mata tropical que os levaria até a costa de onde esperavam alcançar a ilha.

 

Faltava pouco para atingirem o ponto desejado quando uma coisa totalmente inesperada os obrigara a se deter:

 

O Cosmo da Manifestação havia, num salto, se intensificado!

 

Ambos, combatentes experimentados e poderosos, se entreolharam em silêncio; estavam aturdidos com a elevação súbita daquele poder.

 

Mesmo dentre os poderosos Cavaleiros de Ouro jamais sentiram tal força.

Um deles, Capella, tenta constatar os Oficiantes para tratar do assunto, mas a linha de comunicação telepática com os anciões se mostrava, para a sua mais completa consternação, muda.

 

Fizera, em vão, mais algumas tentativas até entender que tinha alguma coisa interferindo.

 

Seja o que fosse, havia os isolado e agora estavam sozinhos!

 

Sem pronunciarem qualquer palavra, e como que munidos do mesmo pensamento e determinação, evocaram mais uma vez o poder de MARATONA, saltando por sobre as copas das árvores, avançando velozmente pelos galhos, na direção do poder desconhecido que perseguiam, percorrendo quilômetros em instantes por conta de sua habilidade de locomoção única.

Nada é dito entre eles enquanto se aproximam, nem mesmo um olhar é trocado. Apenas a garganta fica embargada com receio do que virão, até que vislumbram algo que jamais poderiam imaginar:

Por Athena! — murmura incrédulo o mais baixo da dupla que exibia uma cabeleireira ruiva.

 

Com sua preocupação dando lugar ao medo, vê de uma elevação rochosa, precipitando de uma ilha distante da costa, uma imensa silhueta humanóide que parecia tocar o firmamento.

— O que, em nome de nossa Deusa, é aquilo?

 

Independente de ser um Cavaleiro de Prata e Batedor do Santuário, Capella sente a espinha gelar.

— Um gigante. E pelo visto, o Cosmo que sentimos e temos perseguido vem dele.

 

Disse o outro, em meio a um sorriso forçado, quebrando seu silêncio momentâneo.

 

A descontração em sua voz denotava uma confiança que tentava disfarçar o mesmo temor que estava acometer seu companheiro.

 

Capella lançou, de soslaio, um olhar para Dante, ficando com uma expressão zangada ao perceber que esse sorria.

 

— O nível cósmico...

 

Uma pausa.

 

— É bem diferente daquele que vínhamos sentindo anteriormente. Esta fora de qualquer escala. Talvez seja tão, ou mais, elevado que o poder de um Cavaleiro de Ouro.

 

Estava tentando, como era de seu feitio, lidar com a situação da forma mais sensata.

 

Abstraindo de sua mente o que seus olhos estavam vendo e dedicando-se a analisar friamente as nuances que, a primeira vista, sempre acabavam passando despercebidas.

 

Claro que era impossível apagar da cabeça a imagem daquela sombra colossal se elevando da ilha aos céus.

 

Aquilo era por demais aterrorizante para ser ignorado.

 

Talvez...

 

Dante fizera questão de dar ênfase à palavra, já que nada daquilo podia ser dado como certo.

 

— O Santuário precisa ser alertado... o Grande Mestre precisa saber do poder que esta em andamento por aqui... e já que perdemos contato com os Oficiantes deveríamos voltar e...

— Você pode ir, Capella.

 

Interrompeu secamente o rapaz de pele negra e cabelos castanhos claros, aproximando-se da beirada do precipício que levava até uma pequena enseada.

O que?!

 

Surpreende-se o ruivo.

 

— Vá você. Corra, avise ao Santuário o mais depressa possível.

— E quanto a você, Dante... o que pretende fazer? Não me diga que pretende ir de encontro aquele poder?

Vou.

 

Responde, olhando de esguelha o outro, e alargando o sorriso.

— Você só pode estar brincando.

— Eu pareço estar brincando?

— Aquele poder está além das nossas forças. É suicídio...

 

Disse Capella apontando para a ilha aonde o vulto ainda agigantava-se em direção a abóbada celeste.

Sem dizer nada, Dante movera uma das pernas para frente do corpo; flexionara um pouco o joelho, deixando o membro bem na borda do penhasco.

 

Inclusive, algumas pedrinhas, que haviam sido deslocadas pela ponta de seu pé, acabaram se precipitando no abismo.

 

O rapaz parecia prestes a saltar.

 

— Dante, para com isso.

 

“Não há como você vencer, além do mais, nossa missão era de reconhecimento.”

 

“O Grande Mestre nos enviou para averiguar essa Manifestação e analisá-la.”

 

“Fizemos isso, constatamos o seu poder e até mesmo sua figura, agora, já que perdemos contato, e não temos ordens para agir, devemos voltar o quanto antes e reportar o que vimos.”

 

Capella ficara em silêncio esperando que suas palavras fossem injetadas no seu amigo.

 

Depois, prosseguiu:

 

— O quanto antes isso for feito, mais rápido o Grande Mestre, com toda sua sabedoria, vai preparar uma defensiva contra essa ameaça e...

E vamos deixar que mais pessoas sejam mortas?!

 

Não houvera resposta por parte de Capella.

 

Diante daquela situação em que se encontravam, não era só a figura apavorante do gigante que a mente do ruivo tentava ignorar, havia também as pessoas daquela ilha que aquele monstro estava assassinando.

 

O Batedor podia sentir o pequenino Cosmo de cada uma delas no limiar de suas existências.

 

Quase dava para ouvir seus gritos e pedidos por socorro.

— Isso não está em nossas mãos... não é nossa responsabilidade...

 

A voz de Capella soava com pouca convicção.

Eu discordo...

 

“Não vou dar as costas e simplesmente partir daqui como se nada estivesse acontecendo...”

 

O outro se cala e se sente profundamente envergonhado diante do amigo por sua conduta perante aquele fatídico evento.

 

Dante estava coberto de razão; não havia como sair sem que aquelas vidas pagassem o preço por conta disso.

 

Um dos dois teria que ficar e de algum modo, tentar deter o máximo possível essa Manifestação, impedindo-a assim, de prosseguir com aquela mortandade.

 

Porém, o Cavaleiro de Prata de Auriga conhecia bem o conceito de impossível.

 

A contragosto tomara uma decisão:

— Vá então você, Dante. Avise ao Grande Mestre, diga tudo e preparem o Santuário para esse poder. Eu sou mais capacitado para agir e posso mantê-lo aqui até que...

 

— Não perguntei sua opinião, Capella.

 

— Dante...

 

— Aquele monstro exala força bruta... e dentre todos os Cavaleiros de Prata dessa geração sou um dos que mais detém esse tipo de poder...

 

“Sem mencionar que minhas recém adquiridas habilidades de cura, agregadas agora ao meu ADVENTO DO GUARDIÃO, poderão salvar muitas daquelas pessoas...”

 

O outro não encontra palavras para argumentar.

 

Sabia que seu amigo não estava se gabando ou sendo exagerado em relação ao próprio poderio.

 

Inclusive, enquanto ele, Capella, havia cessado, há muito, com seus treinos, algo bastante corriqueiro entre os Cavaleiros já ordenados, gozando de sua posição e satisfeito com a força já adquirida, Dante sempre estava em busca de mais poder.

 

Isso tinha relação, pensava Capella, com sua obsessão em salvar pessoas.

 

Recentemente havia sido aceito por Marfic, para que essa, o conduzisse na aquisição do desenvolvimento de habilidades curativas provenientes do Cosmo.

 

A velha Amazona de Prata de Ophiuchus era a maior perita nessa área em todo globo, e não à toa estava à frente do Centro de Recuperação, residência esta, que servia para tratar os adoentados e feridos do Santuário.

 

Mas mesmo com todas essas credenciais, Capella ainda achava que faria um melhor trabalho que o amigo.

 

Ou será que estava querendo se sacrificar no lugar dele?!

 

Difícil saber...

 

Sua reserva de Cosmo era mais ampla e suas técnicas consumiam muito menos energia.

 

Não que Dante possuísse pouca força cósmica para desprender.

 

Muito pelo contrário.

 

Afinal, dentre todos de Cavaleiros de Athena, os Batedores eram, por obrigação, devido à função que desempenhavam, os que detinham mais vigor energético.

 

Conseguiam, inclusive, superar os Cavaleiros de Ouro nisso.

 

Entretanto ter mais Cosmo para gastar não significava, em absoluto, ter mais poder.

 

— Como vê, Capella...

 

“Eu sou o mais indicado para essa batalha!”

 

Sorrira o Cavaleiro de Prata de Cérbero se lançando finalmente do precipício enquanto o outro ponderava todas aquelas coisas; saltava o rapaz de uma forma sobre-humana por entre as rochas mais protuberantes da encosta, indo na direção da superfície marinha que o levaria até a ilha.

 

O Cavaleiro de Prata de Auriga não tem tempo de dizer nada, apenas observa à silhueta do companheiro desaparecer correndo sobe as águas; depois, baixa a cabeça e some nas sombras das árvores.

 

 

 

 

Oceano Atlântico.

Nordeste Brasileiro, próximo a

costa da Ilha de Marajó.

 

 

Diante da imensidão azul, enquanto o sol se punha no horizonte, lançando uma mancha avermelhada nas águas e nos céus que já se tingiam de negro, o Cavaleiro de Prata de Cérbero, mais uma vez busca, dentro de si, a razão pelo qual iria apostar sua vida.

 

Nos minutos que o separam do seu destino, enquanto percorre velozmente o terreno aquático que lhe serve de chão para seus pés, se recorda de tudo que passou para chegar até aqui.

 

Em especial, vinha a sua mente, os anos de preparação na Ilha de Andrômeda com Capella e o restante daqueles que considerava como sendo sua ‘família‘.

 

Depois, sobreveio sua sagração no deserto com Jared e Irulane.

 

Lembra-se dolorosamente daquilo que tivera de deixar para trás.

 

Do sacrifício de um de seus mestres para que ele tivesse uma chance de obter a Armadura.

 

De como Irulane, por quem se apaixonara, a todo custo quisera evitar isso, primeiro tentando dissuadi-lo e depois lutando até o fim com ele.

 

Tudo isso para impedir a morte de Jared, a quem a jovem, em segredo, amava.

 

No passado, ela fora uma das muitas Aspirantes enviadas pelo Santuário para a obtenção da vestimenta de Cérbero, mas com o tempo passara a amar seu Tutor e por saber que este teria que se sacrificar para que ela fosse até o Mundo dos Mortos e tomasse posse da Armadura, desistiu de se tornar um Cavaleiro, passando a servi-lo como uma serva.

 

Quando outros Aspirantes eram enviados para tentarem, o que Irulane havia aberto mão de conseguir, a jovem, sem nenhuma piedade, os eliminava; isso, caso, as próprias circunstâncias do severo treinamento com Jared, não se encarregassem deles.

 

Com Dante, fora a mesma coisa.

 

Só que Irulane não esperava que ele a superasse em poder.

 

E como não podia vencê-lo, recorreu aos sentimentos de Dante por ela:

 

— Serei sua, Dante. Para sempre. Só peço, em troca, que desista da Armadura.

 

Mesmo permeada em desespero, a voz era cálida.

 

E como Dante queria aquiescer a ela.

 

Abraçar Irulane e amá-la mesmo sabendo que seu coração era de outro.

 

Mas ele não podia sucumbir ao mesmo sentimento egoísta que fizera a jovem desistir de seu compromisso com Athena.

 

Vidas aguardavam, para que ele, Dante, as salvassem.

 

Ele era Cérbero...

 

O Guardião!

 

 

 

 

Noite.

Extremo oposto de Marajó.

 

 

Se Cronos, seu rei, governava a Ambição, em se tratando de Crio, este era o senhorio da Paixão.

 

Emoção esta que despertava o temor até mesmo dentre seus próprios irmãos e que muitas vezes impelia o Titã a não medir as consequências de seus atos.

 

Bem diferente de Hyperion que por sua vez, prezava sobre todas as coisas, a Razão.

 

Crio era, sobretudo, direto e intenso.

 

Não perdia tempo com meias verdades, longas manipulações de subconsciente e jogadas de caráter. Via a coisa da maneira mais lógica, incisiva e simples.

 

Tinha sido essa a constante máxima de sua interminável existência.

 

Toda vez que algo ousava se colocar no caminho dos Titãs, ele se incumbia desta.

 

Foi assim quando tomou a força das Moiras o controle sobre os domínios submarinos de Pontus, enfrentando os Telquines que agiam sob as ordens delas, liderando contra estes, o Titã sozinho, um famigerado exército de feras aquáticas provenientes das entranhas de sua rainha Réia.

 

Feito esse que lhe rendeu o título de Senhor das Bestas Marinhas.

 

Na Titanomachia, punira seus irmãos Ciclopes por sua pérfida aliança com Zeus.

 

Com sua Sephiroth(3) tirara de um deles a preciosa essência divina que o animava e de posse disso convertera em flagelo para os outros dois, aniquilando-os até a última molécula.

 

Do Ciclope que teve sua imortalidade roubada, restara somente uma carcaça congelada e sem vida, do qual Crio fez questão de ostentar e deixar ali para que fosse um testamento de qual era o preço da traição para com os Titãs.

 

Dada a extremidade de seu ato e sua gélida consequência, ficou imputada sobre sua figura a incumbência dele ser o Senhor do Frio.

 

Por ser como é, havia vindo a Terra, possuindo com sua essência divina, aquele invólucro mortal com o qual agora, exibia-se, mesmo a sensação sendo tão repugnante.

 

O intuito era preparar o mundo para o retorno de seu soberano por direito:

 

CRONOS!

 

O rei dos reis e legítimo governante de todo universo estava voltando e ele, Crio, seria o seu:

 

Arauto!

 

Não queria partilhar dessa glória com os irmãos, por isso os deixara de fora e não revelara, a pouco, suas reais intenções para Hyperion.

 

Mas havia em Crio também o desejo, uma vontade inquebrantável, de lutar.

 

Por isso também era chamado de Senhor da Guerra!

Seu legado — a paixão — lhe garantia um prazer enorme na guerra, na luta pelo simples prazer de batalhar e massacrar seus inimigos e não se arrependia disso. Na verdade, cultuava tal coisa. Entendia perfeitamente que todos os seres, divinos ou não, precisavam da guerra para sobreviver, era parte de seus instintos mais primários lutarem, guerrearem. Seu filho Ares herdara os seus mesmos instintos, contudo este via a guerra mais como uma ferramenta do que uma necessidade, já ele não, para o Titã a guerra era algo vital para que sua própria existência fosse justificada.

 

E do seu cárcere no Tártaro assistira, satisfeito, às guerras que revolucionavam o mundo. Vira através delas, grandes impérios serem formados e destruídos. Vislumbrara a humanidade sofrer imensas revoluções com a guerra e para a guerra. E por mais que ensinassem nas escolas humanas que a guerra era algo ruim de acontecer, por mais que dissessem que aqueles que as causavam muitas vezes eram derrotados, poucos seriam capazes de declarar com plena convicção a total inutilidade das guerras, seja do ponto de vista real, seja do histórico.

 

Até mesmo as Guerras Santas de Athena atestavam isso.

De pé, Crio, o algoz de boa parte daquelas pessoas que viviam em paz naquela ilha, queimava seu Cosmo de poder imensurável. A aura rubra que se manifestava tomava todo o céu, trazendo pesadas nuvens, vendaval e chuva. A destruída vegetação queimava por conta das faíscas de energia que escapavam de sua silhueta colossal.

 

Seus olhos ganhavam uma tonalidade carmesim; sorrindo como um maníaco, erguera os braços, lançando para os ares, toda força acumulada na forma de uma reverberante pilastra de luz.

 

A guerra move a grande roda!

Grita.

— Ela, e somente ela, controla os desígnios de todas as coisas...

 

Fúria.

O gigante cerra os punhos junto ao rosto tremendo de ódio.

 

— Por isso eu sou seu senhor absoluto... por isso sou o único ser digno de controlá-la. Ares deve pagar o preço por ter tentado usurpar de mim essa posição. Zeus e toda sua corja do Panteão também devem pagar por ter se rebelado contra nós... todos sofrerão com o meu poder... TODOS!

A luz cessa. O vendaval vai aos poucos se acalmando até dissipar na mais serena das brisas. Abaixando os braços, o Titã é tirado de seus devaneios quando sente um forte tremor ecoar abaixo dos seus pés.

 

Tamanho é a intensidade do abalo que toda ilha parece sacudir em seus alicerces.

 

Por pouco não perde o equilíbrio e vai ao chão.

De repente, observa, incrédulo, brotarem da terra, correntes negras com manguais; estas arrebentavam as rochas e o que mais encontravam pelo caminho, surgindo aos montes, permeando o solo até revestir toda a paisagem; a maneira como se contorciam davam ao Titã a sensação desagradável dele ter caído num ninho de víboras.

 

O que? Mas... o que é isso... — indaga recuando alguns passos, buscando apreensivo, um pedaço de chão que não estivesse coalhado de correntes e bolas espinhentas.

 

O farfalhar metálico é sua única resposta.

 

Para sua mais completa indignação percebe que sua figura monstruosa não era o alvo da atenção daquelas coisas.

 

Ignorando-o completamente, as correntes, como tentáculos, estavam tirando dos escombros, às vítimas moribundas massacradas outrora por ele.

 

Agiam em toda parte como braços cuidadosos.

 

Sua força era espantosa.

 

Moviam, sem qualquer esforço aparente, toneladas de entulho.

 

E das alcovas, retiravam os corpos; enrodilhando-se neles, formando uma espécie de casulo protetor e depois, passavam emitir uma leve, e constante, pulsação energética.

 

Ao notar que a perna ensanguentada de uma das vítimas, enquanto era abraçada pela malha de metal, estava se curando, entendeu a razão de todo aquele ‘espetáculo’.

 

Furioso e decidido a acabar com aquilo de vez, Crio investe, agarrando um bom punhado de correntes do solo, tentando parti-las com sua força colossal.

 

Contudo, como que dotadas de inteligência e prevendo suas intenções, essas, mais céleres, começaram a se enroscar nos seus membros, obrigando-os a se afastar, não permitindo assim, que este, conseguisse completar o pretendido.

 

O Titã pragueja alto.

 

Tenta se libertar, mas não consegue.

 

A maneira como fora imobilizado o estava impedindo.

 

Pior, as correntes estavam triturando, num severo aperto, os ossos de seus braços.

 

Exibindo uma careta de dor, o gigante dobra um dos joelhos no solo e arqueia para frente o tórax soltando sofregamente o ar.

 

Se não fizesse alguma coisa logo, seus membros seriam estraçalhados!

 

Foi então que, com a visão alternando no turvo e no nítido, percebera uma única e pequena silhueta de pé num grande escombro de uma das construções que ele, instantes atrás, destruíra.

 

A figura diminuta ardia numa pira de Cosmo argento.

 

— E-Então é você o Cavaleiro de Athena de que Hyperion me falou há pouco...

 

Crio, à medida que tentava se aprumar e recuperar a costumeira altivez, soltava uma risadinha do mais caudaloso desdém.

 

— Venha cá, para que eu possa ‘cumprimentá-lo’...

 

Seu Cosmo rubro avultou e as correntes de ébano que o prendia e afligia, partiram-se vitimadas por um poder que transcendia qualquer explicação ou lógica.

 

Não vem?!

 

Indagara o Titã totalmente refeito.

 

— Pois então, deixe-me ir até você!

 

Sem rodeios, cravara, o gigante, os dedos no solo; os músculos dos seus braços dilataram assustadoramente; as veias do seu pescoço e testa, agitavam como loucas, denotando o tamanho do seu esforço; em meio ao clamor que escapava dele como o rugido de uma besta, duas indistintas fissuras, partindo cada qual, do lado de cada membro, vitimaram o solo, traçando um caminho irregular até se encontrarem.

 

Um pedaço bastante considerável do chão fora arrancado.

 

Ao erguê-lo acima da cabeça, Crio tomara novo fôlego e o arremessara com toda força que detinha.

 

O impacto teria posto abaixo uma montanha, entretanto, se mostrara ineficaz contra a ‘parede‘de correntes e manguais que se erguera a frente daquele que buscava atingir.

 

Por de trás dela, o jovem rapaz de pele negra e cabelos castanhos claros permanecia imóvel e confiante.

 

Suas mãos estavam postas nas alças da mochila que carregava; lentamente seus olhos, até então fechados, foram se abrindo.

 

Acompanhava esse ato, o paredão de ferro, se desfazendo a sua frente.

 

— Poupe-me de suas gentilezas, seja lá quem, ou que, você for...

 

“Economize também seus esforços...”

 

O rapaz deixara os braços penderem ao lado do corpo.

 

— Diante de você está meu ADVENTO DO GUARDIÃO...

 

Dante, o Cavaleiro de Prata de Cérbero e Batedor do Santuário, lançara um olhar permeado de orgulho para as correntes e manguais que os cercavam de todos os lados.

 

Pareciam, essas, tensas e prontas para atacar.

 

— São como um organismo vivo que se alimenta gradativamente do meu Cosmo...

 

“Podem, curar... proteger...”

 

A perspectiva da cena enquadrava os inúmeros moradores de Marajó enrodilhados, agora a salvo e sendo tratados, nos casulos metálicos.

 

Quase que ao mesmo tempo, Crio, movendo-se numa velocidade que não condizia com seu tamanho extraordinário, sumia, repentinamente, das vistas de Dante enquanto este ainda falava.

 

Detectar qualquer presença que esteja se deslocando no seu raio de ação através de pequenos sensores dispersos em sua estrutura que agem como terminações nervosas...

 

“E... reagem com violência a qualquer ameaça!”

 

O rapaz não podia acompanhar o rápido deslocamento do Titã e nem tinha outros meios para a realização de tal façanha, no entanto, suas correntes pareciam bem cientes de onde Crio estava.

 

Tanto que voaram na sua direção quando ele, movendo por um dos flancos de Dante, pretendia esmagá-lo com um dos seus pés.

 

Vindas de todas as direções, menos do alto, as correntes arremeteram, como verdadeiras balas de canhões, os manguais pontiagudos presos em suas extremidades.

 

O gigante, em meio a sua ofensiva que não chega a se concretizar, acaba alvejado como se tivesse sendo vítima de um fuzilamento.

 

Acompanhando com certo retardo a ação de suas preciosas armas, por um instante, o rapaz acredita que obteve êxito em sua investida.

 

Porém, percebe que seu mortífero ataque fora pouco mais que ‘picadas de mosquitos’ para o colosso que sequer se abalara.

 

Inseto...

 

Vociferou, Crio num misto de alívio e superioridade.

 

Com um simples movimento, onde inflara toda a musculatura, revolvera o ar, fazendo com que as bolas espinhentas, ainda em contato com seu imenso corpo, fossem rejeitadas e devolvidas para o mesmo local de onde haviam se projetado.

 

Muitas chegam a se destroçar devido à forte pressão que as acometem.

 

Outras assumem rotas erráticas colidindo-se com aquilo que encontram pelo caminho.

 

Por conta desse impropério Dante se vê obrigado a abandonar, com um salto, o local onde permanecera até então parado, esquivando-se de algumas correntes que fatalmente o teria golpeado.

 

— Não acabei ainda...

 

Disse, ainda, confiante o rapaz quando tocava ileso o solo mais adiante como se tivesse guardado o seu melhor para aquele momento.

 

— Como o nome da minha técnica sugere, ela serve de prenúncio para algo muito maior...

 

As correntes espalhadas por toda ilha, com exceção daquelas que haviam enclausurado as vítimas de Crio para protegê-las e curá-las, começaram a aderir à diminuta figura de Dante.

 

— Contemple o:

 

“GIGANTE ENCARNADO!”

 

Tinha o Batedor desaparecido dentro daquela massa fervilhante de metal.

 

Uma figura em negro, com os mesmos traços e contornos de Dante, erguia-se como um verdadeiro colosso que despertava de seu sono e se colocava de pé.

 

Era tão descomunal como Crio.

 

A cena, em si, é surreal:

 

Dois ’gigantes’ estavam prestes a se enfrentarem em Marajó!

 

 

 

(1): Maratona, segundo o mito, fora o lugar, especificamente uma planície, onde os atenienses combateram sem trégua, os persas, no ano de 490 a.C. Antes da batalha, os persas haviam dito/ameaçado, que caso vencessem, iriam até a cidade de Atenas onde violentariam as mulheres e sacrificariam os filhos de seus rivais. Dessa forma, os atenienses, antes de partirem para a guerra, ordenaram as suas esposas, que caso não retornassem da batalha no prazo de 24 horas, elas deveriam matar seus próprios filhos e em seguida, suicidar-se. No fim, a guerra acabou sendo vencida pelos atenienses, só que diante do fato da batalha ter se estendido em demasia e receosos que suas esposas fizessem o que fora planejado, o general Milcíades ordenara que seu melhor batedor, Feidípedes, partisse imediatamente para Atenas e relatasse a todos de sua vitória. Ao que parece o intento fora alcançado, só que custara a vida de Feidípedes devido ao tamanho esforço físico que desprendera durante tal jornada. Em sua homenagem, em 1896, que data a criação de um dos primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna, fora criado uma prova de corrida de longa distância, executada em ruas ou estradas, onde a distância a se percorrer era a mesma da planície de Maratona até a cidade de Atenas (mais ou menos 40 quilômetros). No ano de 1921 a distância da Maratona passou a ser oficialmente de 42,195 quilômetros, algo que já havia acontecido na Olimpíada de Londres de 1908. No universo das Crônicas de Athena, MARATONA também dá nome à técnica de locomoção usada exclusivamente pelos Batedores do Santuário. Sua eficiência se revela por empregar a velocidade sobre-humana dos Cavaleiros durante longos períodos de tempo.

 

(2): Oficiantes é um termo, agregado as Crônicas de Athena, retirado da tradução em português da obra Gigantomachia escrita por Tatsuya Hamazaki.

 

(3): Não custa lembrar, que no universo das Crônicas de Athena, as armas divinas dos Titãs são chamadas de Sephiroth.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 4 meses depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

 

 

 

Capítulo 3 Quando Gigantes se Enfrentam

 

Ao largo, em meio a escuridão da noite e às ruínas do que antes fora a paisagem urbana de um vilarejo, as trágicas ocorrências deixadas no solo por suas pesadas passadas, testificavam a enormidade daqueles horríveis seres em conflito.

 

O cenário em volta, apresentava-se minúsculo em relação a eles, parecendo-se com o arremedo de uma maquete.

 

O mínimo movimento daqueles monstruosos corpos gerava vendavais.

 

Bastava um sussurro deles para que o ar vibrasse como que acometido pelo ribombar de um trovão.

 

Mente alguma conseguia a faceta de se manter sã diante de tal visão.

 

O medo que inspiravam era por demais avassalador...

 

Primitivo!

 

A certeza da insignificância esmagava qualquer que fosse o ímpeto.

 

Gigantes!

 

Enquanto seus punhos colossais, capazes de demolir montanhas, buscavam afligir um ao outro, elipses de pressão, não menos monumentais, geradas a partir da efetividade de suas investidas, propagavam-se continuamente, condensando o ar ao redor, gerando uma devastação cataclísmica, que ‘feria’ tanto o céu como a terra, fazendo-os ‘gemer’ em profunda agonia.

 

Apenas aqueles estranhos casulos de metal, feitos outrora, a partir do fantástico poder do Cavaleiro de Prata de Cérbero, espalhados em meio ao cenário com os moradores de Marajó em seu interior, sendo salvaguardados e curados, resistiam aquele horror.

 

O açoite das sucessivas ondas de choque, assim como o desabamento de toneladas de entulho e o ‘engolir’ da própria terra que os tragavam, devido às enormes fissuras que vitimavam o chão, era incapaz de romper a malha enrodilhada de correntes e manguais, causando nelas, pouco mais que avarias nada significativas.

 

Um dos gigantes, de natureza mortal, que fora forçosamente tomado pela essência divina de Crio, adquirira aquela envergadura assombrosa por intermédio do poder do próprio Titã.

 

Em contrapartida, o outro, Dante, também humano, mas livre de qualquer controle que o reduzisse a uma marionete, através da combinação de suas incríveis técnicas ADVENTO DO GUARDIÃO e GIGANTE ENCARNADO, imergira no interior de um colosso feito das mesmas correntes negras que formavam os casulos.

 

Um gigante de carne e osso e outro, de metal!

 

Nitidamente Crio era mais célere em suas ofensivas e demais ações.

 

Inclusive, movimentava-se como se a enormidade de sua carcaça, não afetasse sua desenvoltura física, impingindo a ele, uma lentidão característica a criaturas daquele porte.

 

Aquilo lhe oferecia ampla vantagem no confronto já que suas ofensivas atingiam regularmente o alvo ao ponto que os ataques deste, com pouca frequência o alcançavam.

 

Mesmo com a situação desfavorável, o Cavaleiro de Prata de Cérbero, contava com recursos valiosos que o impediam de ser facilmente sobrepujado.

 

Enquanto o dano em Crio permanecia após este ser duramente afligido, o construto metálico de Dante regenerava, quase que instantaneamente, a área que fosse eventualmente atingida.

 

— Como ousa se colocar dessa forma no meu caminho?!

 

Sibilara Crio, enquanto evadia um soco lateral, se abaixando, golpeando depois, seu agressor, junto ao abdômen; à medida que este se dobrava, com seu outro membro, o Titã, atingia-o nas costas, cravando-o no solo, com uma cotovelada descendente.

Você sabe o que eu sou?

 

Fizera nova pergunta, Crio, enquanto observava o outro, esparramado no solo, em meio a uma nuvem densa de pó e sedimentos a cobri-lo parcialmente, se levantar sofregamente.

 

— F-Feio pra diabo.

 

Gracejara, finalmente, em resposta, Dante, com as avarias em seu gigante já recuperadas.

 

Houve nova troca de golpes!

 

Até que então, o conflito físico entre eles, passara a resumir-se, num enlace de mãos.

 

Músculos e metal mediam forças!

 

Não havia retrocesso de nenhuma das partes.

 

Nem o mínimo esboço que denotasse fraqueza.

 

Abaixo deles, seus pés afundavam no chão.

 

Os olhos do Titã queimavam em rubro...

 

Indignado...

 

Colérico...

 

Assustador!

 

Respondendo a isso, sem deixar-se ser intimidado, como um aríete, Dante arremeteu a cabeça do seu colosso metálico, atingindo com a testa, severamente a face de Crio.

 

Ele o acerta uma...

 

Duas...

 

Inúmeras vezes!

 

O rosto do invólucro mortal do Titã torna-se uma massa horrivelmente disforme.

 

Com exceção dos seus braços, que se mantinham ainda firmes agarrados aos de Dante, todo o restante do seu imenso corpo vacilava.

 

— D-Desgraçado...

 

“Eu sou um ser divino...”

 

“Sou um Titã...”

Esbraveja profundamente inconformado.

 

O rapaz de pele negra, por sua vez, não acredita que o maldito ainda possa estar vivo. Mesmo afundando parcialmente seu crânio e esmagando mortalmente seu cérebro, ele continuava desperto.

 

Crio grunhe.

 

Ódio e dor se misturam.

— Entende isso moleque?! Um TITÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃ!

 

O surto faz com que labaredas de Cosmo extravasem do interior do Titã.

 

Como ‘línguas’ elas ‘lambem’ o solo, fendendo-o e chamuscam o peito e a face do construto de Dante.

 

Veios de metal derretido traçam grotescamente, como cicatrizes, o caminho por onde o Cosmo extravasado passara.

 

Em meio a isso, os braços de Crio, incrivelmente, imbuíam-se de mais volume.

 

Sua boca deformada se abrira deixando escapar um rugido bestial.

 

Todos os animais da ilha e até mesmo as criaturas em alto mar, debandaram da área sentindo a ameaça pungente.

 

Do outro lado, o colosso de Dante se dobra, apoiando um dos joelhos no solo.

 

Muitas correntes que compunham seus braços partiam-se.

 

Logo todo chão estava permeado por elos destroçados e bolas espinhentas.

 

— N-Não. Não entendo. E nem me importo. — respondera, com a confiança ainda inabalável, o Cavaleiro de Prata de Cérbero ao mesmo tempo em que dava outra forte cabeçada certeira em Crio.

 

— Desgraçado... eu farei com que se importe... farei com que se arrependaaaaaaaaaaaaaaaaa!

 

Crio dá ao Cavaleiro de Athena uma pequena amostra do seu vasto poder.

 

Uma coluna reverberante de luz emanara de sua figura monumental e tomara o seu lugar.

 

Ascendia aos céus, expurgando as nuvens, como se fosse um ‘caminho’ traçado pelas divindades até as estrelas.

 

A pilastra também englobara Dante e nada, ou quase nada, restara do seu outrora GIGANTE ENCARNADO, que se consumira em instantes mediante aquele brilho abrasador, semelhante a papel no ‘abraço’ irresistível das chamas de uma fornalha.

 

O rompante cósmico afundara o nível do solo e fizera com que os estrondos sônicos que o cingiam, destruíssem partes elevadas da ilha.

 

As águas do Atlântico recuam por dezenas de metros, gerando um verdadeiro reboliço na superfície marinha.

 

Ao fim daquele pesadelo, quando da coluna só restara um fino traço luminoso que também se extinguia, aparece Crio.

 

Diga-se de passagem, não mais na figura de um gigante e sim na de um homem.

 

Jubiloso pela aparente vitória, seus sentidos se demoravam na paisagem caótica que se estendia para além do horizonte.

 

O entulho fumegante das construções, somadas às ruínas do próprio solo, havia ocultado deste e de qualquer outro possível observador, os casulos metálicos com os habitantes de Marajó em seu cerne.

 

Mesmo com a derrota de Dante e seu sumiço, que logicamente endereçavam a constatação de sua morte, os enrodilhados de correntes e manguais se mantinham presentes e ativos.

 

— O-O que... o que está acontecendo comigo?

Crio desabara, ficando amparado no solo pelas mãos e joelhos.

 

Arfava em demasia.

 

E muito suor estava sendo vertido, em respingos, pelo chão.

 

Seu corpo tremia e o Titã sentia abater sobre si, uma dolorosa fadiga.

 

Buscou consertar a postura.

Contudo, o menor dos gestos causava-lhe uma dor lancinante.

Demora certo tempo até que compreendera o que estava acontecendo.

Sua casca mortal havia sido seriamente comprometida devido a suas liberações de poder.

 

Não podia contê-lo por mais tempo.

 

Tinha chegado ao seu limite e o processo degenerativo que a acometia, devido à possessão indevida do Titã, acelerara consideravelmente.

 

Crio sabia que deveria abandonar imediatamente aquele corpo.

 

Mas antes precisava fazer uma coisa...

 

Ao custo de muito esforço e sendo massacrado constantemente pela dor, conseguira colocar-se de pé.

 

Precisava ver em que condições, o corpo do Cavaleiro de Athena que acabara de assassinar, tinha ficado.

 

Mais do que nunca desejava a certeza de sua morte!

 

E depois dessa constatação, apagar o menor dos vestígios de sua existência, para que este nunca fosse lembrado.

 

Dante, com sua irreverência maculara seu hospedeiro e o tinha ofendido.

 

Lutara bravamente, fora um adversário forte, digno, mas o Titã jamais admitiria isso.

Ninguém tomará conhecimento que sofreu tamanho insulto de um mísero humano.

Hyperion e seus outros irmãos jamais saberão!

 

 

 

 

Oceano Atlântico. Costa Brasileira.
Próximo a Ilha de Marajó.


Dante...

Sussurrara o rapaz de pele morena, olhos castanhos avermelhados e longos cabelos ruivos no momento que sentira o Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero se apagar momentaneamente.

De pé, equilibrando-se na extremidade de uma bóia sinalizadora, Capella, já trajado com sua armadura argenta da constelação de Auriga, contemplava preocupado o horizonte, onde no amontoado de terra que era a ilha de Marajó, assistia um assombroso pilar de luz, suspender-se até o firmamento.

— Dante... — sussurrara uma vez mais, tomado agora pelo remorso.

O Cavaleiro de Athena estava profundamente arrependido de ter deixado o amigo ir sozinho de encontro aquele Cosmo maligno que haviam outrora perseguido.

Seja lá quem fosse, seu poder atingia picos erráticos que o elevava, pasmem, acima dos invencíveis Cavaleiros de Ouro, os seres mais poderosos do planeta!

 

Era suicídio ir sozinho e sem preparo ao encontro de algo assim. Capella tinha plena consciência e convicção disso, mas deixara Dante ir do mesmo jeito.

Tomara essa difícil decisão por causa de seu dever e obrigação como Batedor do Santuário.

O Grande Mestre tinha que ser avisado, o quanto antes.

Isso seria vital para determinar a eficácia das ações defensivas tomadas pelo Santuário contra aquela Manifestação.

 

Muito estava em jogo!

Além do que, Capella sabia ser impossível demover Dante de sua decisão. Conhecia bem a impulsividade do Cavaleiro de Prata de Cérbero e o seu senso exacerbado de justiça quando este, envolvia, “salvar pessoas”.

Aliás, foi pelo amigo ser assim que Capella se afeiçoara tanto a ele. Dentro do Cavaleiro de Prata de Auriga ardiam os mesmos preceitos, só que em contrapartida a Dante, ele era uma pessoa sensata e a razão o ajudava medir o peso de seus atos.

Na verdade, em seu intimo, Capella gostava de Dante porque este simplesmente fazia aquilo que ele, Capella, não tinha coragem de fazer, pois sua prudência e sentimento de obrigação para com Athena, sempre o impedia.

 

Para ele essas coisas estavam acima de tudo.

No entanto, mesmo diante dessas máximas que governavam sua vida, sentia-se impelido a ir atrás de Dante.

Essa convicção o incomodava profundamente, pois o fazia agir contra tudo que acreditava ser certo.

 

Era como perder o controle sobre si mesmo.

 

E a quem Capella estava tentando enganar?!

 

Não foi pela gravidade da situação, ou por Dante ser daquele jeito, que ele o deixara ir.

 

Queria que o amigo descobrisse da pior maneira o quanto estava errado!

 

Certamente um pouco de dor e desespero colocaria juízo naquela sua cabeça dura.

 

Contudo, não queria que o amigo se machucasse seriamente.

 

Ou mesmo que morresse.

 

Se tal coisa acontecesse, jamais se perdoaria.

 

“Maldição, Dante. Por que você sempre tem que agir dessa forma?! Por que não me dá ouvidos?!”

Disse alto, consigo mesmo, em tom de revolta, os sentimentos em confusão, sua voz se misturando ao som da agitação que agora afligia a superfície do Atlântico.

 

Depois, completara num tom mais brando:

Droga! E por que não consigo deixar que você quebre a sua cara sozinho?! Por que tenho que me meter e participar de suas loucuras?!”

Capella soltara um pesado suspiro resignado e xingara o amigo baixinho, dizendo que se eles morressem ou fossem punidos severamente pelo Grande Mestre, a culpa seria toda dele.

O Cavaleiro de Prata de Auriga ficara por um tempo em silêncio e depois sorrira ao se vê diante daquela situação.

 

Ele estava, não somente, desobedecendo ordens e indo contra aquilo que acreditava, como também estava agora falando sozinho.

“Por Athena.”

Pensara com bom humor.

“Estava enlouquecendo!"

"A convivência excessiva com Dante finalmente afetara seu juízo.”

Balançara a cabeça e em tom sério arquitetara uma decisão:

“Quando aquilo tudo tivesse acabado, e ele, por alguma razão, conseguisse sobreviver, Capella se afastaria de uma vez por todas de Dante. Faria isso mesmo que tivesse que abrir mão da função de Batedor, um dos maiores orgulhos de sua vida. O Cavaleiro de Prata de Cérbero poderia se fuder que ele não estaria nem aí. Já estava de saco cheio de tudo aquilo. Dante poderia morrer que ele não estava ligando."

"Estava decidido!”

Por um breve momento Capella acreditara naquilo e imaginara como seria boa sua vida sem Dante por perto, mas em seguida, fizera cara de contrariado, deixando seus ombros, em derrota, murcharem. Odiou-se por saber que não faria nada daquilo, estava claro para ele que seu destino estava de certa forma, ligado ao do amigo.

Ao pensar nessas coisas, a lembrança de uma situação recente que havia vivido ao lado do Cavaleiro de Prata de Cérbero, aflorara e viera a sua mente, trazendo a tona, recordações que revelaram a Capella um lado de Dante que ele não gostaria de ter descoberto.

 

 

 

Lembranças de Capella.

Grécia — uma de suas infinitas ilhas.
Alguns anos atrás.

 

 

Aquele era um bom dia para uma emboscada. E de qualquer forma, era um dia em que uma emboscada iria ocorrer.

Os dois Cavaleiros de Prata, recém nomeados como Batedores do Santuário, eram jovens, tinham sede de aventura, sangue e justiça.

O sol escaldante e a brisa marinha eram hesitantes e naquele dia, pessoas se matariam por honra e outras causas sem sentido.

Dante e Capella, prontamente armados, trajando com orgulho sobre seus corpos, suas sagradas Armaduras, espreitavam, mal respirando e controlando o fluxo de suas energias cósmicas, as reduzindo a um nível praticamente nulo. Suas mentes também estavam fechadas devido ao uso da técnica ARMADURA MENTAL Esperavam, dessa forma, não ter suas presenças detectadas pelas Manifestações que caçavam e que logo, emboscariam.

— Como você está? — perguntara em desafio Dante, com o canto da boca.

“Pode lutar direito ou vai continuar com essa cara de emburrado?” — emendara em meio a um erguer de sobrancelhas para o companheiro de pele morena, pensativo ao seu lado.

— Não precisa se borrar de medo Dante, eu consigo proteger você. — respondera Capella fazendo questão de deixar evidente o aborrecimento que trazia em sua voz.

 

O Cavaleiro de Prata de Cérbero assentira em meio a um sorriso, tendo arrepios de inquietação pela batalha que estava por vir.

A verdade era que Capella não estava nada bem. Sentia que aquilo que estavam prestes a fazer era uma arrematada idiota.

Dias atrás uma atividade cósmica hostil foi detectada pelos Oficiantes próxima a um conjunto de pequenas ilhas localizadas na costa grega.

Como recém nomeados Batedores, Capella e Dante, foram incumbidos pelo Santuário de encontrar o paradeiro dessas Manifestações, analisarem o seu poderio e averiguar suas intenções. Uma vez feito isso, deveriam regressar e reportar ao Grande Mestre tudo que presenciaram.

Acontece que nesse ínterim, dois vilarejos que serviam como postos avançados do Santuário, para o preparo de Soldados e eventuais Cavaleiros, foram completamente arrasados e seus habitantes dizimados.

As evidências levavam a crer que isso fora obra das Manifestações que estavam perseguindo. Capella, e principalmente Dante, ficaram visivelmente estarrecidos quando contemplaram a extensão dos estragos. Tanto a selvageria como a crueldade os havia deixado revoltados. Casas, animais e plantações tinham sido queimados. Crianças, velhos e até recém nascidos, todos, assassinados indiscriminadamente.

Tomado pela ira, o Cavaleiro de Prata de Cérbero queria vingança. Desejava ardentemente punir os responsáveis e impedir que aquele horror se repetisse.

Capella sentia no seu âmago a mesma coisa. Mas sabia de seu dever para com Athena.

Combater diretamente os culpados daquela chacina não era sua missão; ele não havia sido enviado pelo Santuário para ser juiz, júri e carrasco.

 

Sua função era apenas observar e relatar.

Por isso tentara demover Dante de sua decisão, mas toda sua argumentação fora inútil. O Cavaleiro de Prata de Cérbero simplesmente se negava a ouvi-lo e não se importava quanto ao fato de estar se rebelando contra uma ordem direta do Grande Mestre. Afirmara inclusive, que sozinho podia dar conta de tudo e que ele, Capella, podia se retirar e retornar ao Santuário.

 

Aquilo irritara profundamente Capella e ele quase perdera o controle investindo contra o amigo.

Resignado, o Cavaleiro de Prata de Auriga, mesmo a contragosto e odiando a decisão tomada, decidira ficar ao lado de Dante nessa empreitada. Afinal, se ele o deixasse por conta própria, o idiota provavelmente acabaria morto em poucos segundos.

Os dois estavam agora deitados, muito quietos e lisos contra o chão, sobre uma encosta coberta de vegetação indecisa.

 

Poucos metros abaixo havia uma trilha, estreita e tortuosa o suficiente para permitir que poucas pessoas passassem juntas de uma única vez. Do outro lado da estradinha, o inicio de um arremedo de vilarejo, que cobria um terreno elevado e irregular.

As Manifestações se aproximavam lentas; já caminhavam alguns dias, vindos da costa marítima de onde emergiram das profundezas.

 

Pouco a pouco se encaminhavam para aquilo que acreditavam ser, seu destino.

 

Seus passos cadenciados relutavam contra o chão pedregoso.

 

O calor parecia os incomodar profundamente.

Estavam armados com lanças semelhantes a tridentes e trajavam sobre seus corpos, pesadas e reluzentes vestimentas de batalha que se assemelhavam em muito, com escamas de peixe.

Alguns carregavam preso abaixo das hastes pontiagudas de suas armas, o estandarte suntuoso de Poseídon, o Soberano dos Mares.

No total eram vinte guerreiros e seis ou sete servos que os seguiam de perto, carregando consigo, bagagens e suprimentos.

 

Um dentre os súditos da divindade marinha, que obviamente por conta de sua presença majestosa, destacava; possivelmente por se tratar do líder daquela companhia.

Sua indumentária em forma de escama refulgia vistosa mais que as outras, em contrastes em dourado, laranja e amarelo. O traje metálico ainda possuía grandes espinhos, como lanças, nas costas e ombros; além de uma espécie de ‘asa’ semelhante à nadadeira caudal de peixe, caída e recolhida atrás da cintura indo até os pés, formando uma espécie de saiote longo.

— Eles são muitos. — reclamara baixinho, Capella.

— Metade vai fugir quando nos virem em ação. — Dante fizera uma careta de desdém.

— Está vendo o estandarte, Dante?

O Cavaleiro de Prata de Cérbero notara pela primeira vez as bandeirolas fixadas nas lanças-tridentes dos dois guerreiros que vinham ao lado do líder da tropa.

Reconheceu de imediato a insígnia!

 

Mas aquilo não lhe parecera importar.

 

Não deu ouvido quando Capella fizera questão de frisar que aquele era o estandarte de Poseídon, o implacável Deus dos Mares que juntamente com Zeus e Hades, encabeçaram a rebelião contra Cronos e os Titãs.

“Seus Marinas eram famosos e temidos por diversas razões. Entre elas havia o fato de que suas Escamas eram capazes de trazer a tona o Cosmo adormecido em seus interiores sem que esses necessitassem de qualquer preparo ou aptidão.”

 

“Tinha também a BÊNÇÃO DE POSEÍDON que se manifestava, em prol dos mesmos, onde as águas marítimas pudessem chegar.”

 

“Seus benefícios iam desde o suporte direto nos confrontos, onde serviam tanto para atacar e defender, como meio de transporte, teleportando-os, e ainda, podiam curá-los de seus possíveis ferimentos, moléstias e até mesmo, recuperar-lhes o vigor.”

 

— Esses ‘peixinhos’ não poderão contar com o mar para ajudá-los estando tão longe como estão da costa. — interviera confiante o Cavaleiro de Prata de Cérbero, no monólogo do amigo, com ares de quem sabia do que estava falando.

— Marinas não são vítimas de emboscadas, Dante.

— Por isso mesmo não esperam por uma. Vão estar surpresos. Nem darão pro cheiro!

Capella controlou um suspiro de irritação. Mirava o amigo como se quisesse fulminá-lo ali mesmo e vira só confiança em seu rosto.

Dante era um rapaz bonito, por mais que Capella odiasse ouvi-lo se gabar disso; não era muito alto e tinha um corpo franzino e elétrico. Sua boca era enorme e debochada. Os olhos verdes amendoados eram repletos de inocência e desafio. E seus cabelos castanhos claros eram longos e crespos. Dante fazia questão de ostentá-los em um desleixo cuidadoso. Ele era o tipo do garoto contra o qual as mães avisavam suas filhas.

O Cavaleiro de Prata de Cérbero devolvera o olhar, imitando com exagero, a cara de preocupada de seu amigo. Capella parecia nunca tirar a seriedade do rosto angular e simétrico. O queixo quadrado nunca afrouxava, enquanto este ponderava sobre as infinitas chances de algo dar errado em cada minúscula tarefa da vida. Era mais alto que Dante e tinha um corpo mais desenvolvido fisicamente. Tinha o peito largo e ombros retos, que arrancavam suspiros de menininhas idiotas, que Capella fingia não notar. Sabia usar como poucos as palavras e podia arrebatar uma multidão com uma de suas declamações. Era vaidoso em demasia com sua aparência, em principal com seus revoltos cabelos ruivos, mantendo-os sempre limpos e escovados.

 

Capella, assim como Dante, não passava de um adolescente entrando na fase adulta.

Haviam nascido no continente africano em meio à pobreza extrema. Desde muito jovens travaram uma luta ferrenha pela sobrevivência.

A pele escura de seus corpos era a herança genética de seus povos aborígines e a cor exótica de seus cabelos e olhos era o legado deixado pelos conquistadores europeus que exploraram e extorquiram as riquezas de suas terras no passado.

Eles haviam se conhecido, ainda muito pequenos, dentro dos alojamentos do Santuário.

Juntamente com mais alguns jovens, os dois meninos tinham sido trazidos até o Santuário por Agentes que viajavam o mundo em busca de indivíduos especiais com algum potencial cósmico inerente.

Após alguns meses de preparação, foram enviados juntamente com outro grupo de Aspirantes até a Ilha de Andrômeda, onde receberiam do Cavaleiro de Prata, Albiore de Cefeu, a primeira etapa do seu árduo treinamento para que um dia, pudessem se tornar, a nova geração de sagrados Cavaleiros de Athena.

 

De lá para cá muita coisa aconteceu.

 

Muito se foi perdido e deixado para trás.

 

Anos depois, já sagrados com o título de Cavaleiros de Prata, ao se reencontrarem no Santuário, já não eram mais os mesmos de outrora, até mesmo seus verdadeiros nomes haviam sido esquecidos na esteira do passado.

 

Contudo, quisera o destino que trabalhassem juntos como Batedores.

 

E a cá estavam.

— Pelo menos prometa que não vai atacar sozinho. — pedira, Capella.

Prometo. — mentira, Dante.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 1 mês depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

Capítulo 3: Exibindo-se com a figura aterradora de dois gigantes, Crio, que teria alcançado aquela envergadura através de seu incrível poder divino, que por sua vez, teria forçado o crescimento indiscriminado do corpo possuído pelo Titã, e o outro, Dante, que a partir do ajuntamento de suas correntes e manguais gerara um construto metálico para si, protagonizaram um duelo de proporções colossais onde no fim, Crio acabara sagrando-se vencedor. Próximo dali, e indo de encontro aos dois na ilha de Marajó, Capella externava toda sua preocupação quando pressentira o desaparecimento súbito, do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero. Inclusive, um acontecimento recente do seu passado, que envolvia ambos numa situação muito similar aquela, acabara emergindo de suas recordações.

 

 

 

 

Capítulo 4 Dois para Emboscada

 

 

Judá era, dentre tantas coisas, um orgulhoso Marina de Poseídon.

 

Beirando os vinte anos, sua pele era alva e seu corpo delicado em nada lembrava o de um atleta ou de um adepto das batalhas, contudo, seu físico harmonizava com sua estatura pouco elevada. Seus cabelos excessivamente negros e cintilantes eram curtos, volumosos, encaracolados e crespos. Uma única e ostentosa trança escapava por um dos lados da cabeça, próxima a orelha esquerda, ocultada esta, pelo elmo da vestimenta que envergava. Seu rosto fino, marcado por um nariz aquilino e um cavanhaque, era um contraste com a ferocidade predatória emanada de seus perversos olhos acinzentados.

Nascido e criado em Jerusalém como o filho mais velho de um comerciante nos vales de Cédron, a vida de Judá seria como a de qualquer outro rapaz judeu de sua idade: cuidar dos negócios da família, se casar com a filha de um dos amigos de seu pai, talvez a jovem e bela Débora, constituir família e continuar vivendo no vale até os fins de seus dias. No entanto, o rapaz, e sua vida, mudaram drasticamente quando ele começou a ouvir um estranho cântico trazido pelo vento. Essa ‘música’ vinha das águas turvas do mar Morto, onde em uma noite fria, Judá encontrara a sagrada Escama de Peixe Leão chamando por ele.

Após ser vestido por ela, sentiu-se imbuído de poder. Seu Cosmo, que sempre estivera adormecido, aflorara graças aquele robe metálico com aparência de peixe.

 

Mal assimilara todas as implicações daquilo quando acabou teletransportado, por meio e vontade das águas do próprio mar Morto até o Reino Submarino de Poseídon.

 

O rapaz de feições femininas e olhar assassino viu-se estupefato diante de um esplendor imensurável.

 

Todo o mundinho pequeno e tacanho o qual era relegado desapareceu de sua mente no mesmo instante, ainda mais quando fora recebido, com entusiasmo e cordialidade, no Palácio Real de Poseídon, por Leviatã(1), General Marina que guardava o oceano Atlântico.

 

Após dizer o que estava acontecendo, dera início, nos dias que estavam por vir, ao doutrinamento que faria de Judá, um devoto de Poseídon.

E desde então, o rapaz tem vivido sua vida dessa forma.

Sua missão:

 

Servir sua majestade como seu Comandante(2), sob as ordens do General Marina do Índico, protegendo o mar Morto a quem representava.

 

Todavia, neste momento, tudo que o Marina de Peixe Leão queria, era voltar para ‘casa’!

 

Regressar, o quanto antes, para o reino abaixo das profundezas.

 

E acima de tudo, queria conseguir vomitar.

A náusea, tanto como o desconforto pelo ar ser tão quente e com pouca umidade, o havia acompanhado desde que chegara à superfície e tivera que ficar diante das imundices dos povos que viviam sob a terra. Judá considerava uma mancha repugnante de selvageria toda a civilização terrena.

No entanto, ele tinha suas ordens, e sem o cumprimento dessas, não poderia regressar.

 

Leviatã havia sido enérgico, e claro, ao lhe enviar:

“Os povos daquelas ilhas próximas à costa da Grécia, deviam ser todos sumariamente mortos. Homem, mulher, velho ou mesmo criança, nada e nem ninguém podia sobreviver.”

“Há muito tempo atrás, esses infelizes adoravam e serviam a Poseídon. Mas após o Soberano dos Mares ter sofrido uma derrota infame para Athena, eles se rebelaram e passaram a render culto e veneração a Deusa da Sabedoria.”

“Aquela traição não podia continuar a ser ignorada e relegada.”

 

“Os malditos mereciam uma terrível punição.”

— Mas que fique claro que nós, devotos de Poseídon, não somos assassinos... — enfatizara, o General Marina do oceano Atlântico.

 

“E tirar a vida dessa corja, mesmo sendo eles merecedores, em nenhuma hipótese nos agrada, mas toda revolta e traição contra nosso Deus devem ser combatidas com severidade, para que o exemplo nesse sentido, seja dado.”

 

Dessa forma, Judá fora enviado, juntamente com um batalhão de Soldados Marinas, a classe mais baixa entre os guerreiros de Poseídon, para mostrar para aquele bando de traidores, qual era o preço por se rebelar contra a vontade de seu Senhor.

 

O primeiro confronto contra os infiéis de uma daquelas ilhas havia sido fácil — como matar ovelhas.

 

As poderosas lanças-tridentes dos seus subordinados não encontraram dificuldades para atravessar os corpos desprotegidos dos aldeões.

Inesperadamente, durante o massacre, haviam enfrentado uma meia dúzia de Aspirantes a Soldados do Santuário de Athena que estavam no local sendo dirigidos por um Tutor, isso tornara um pouco mais complicado as coisas.

Quatro de seus subordinados acabaram mortos nos confrontos e quando Judá regressasse ao reino marinho com a notícia dessas tristes baixas, seriam tanto heróis como justificativas para uma invasão em massa de Marinas, naquela região.

Judá queria uma guerra contra os seguidores de Athena — mas ansiava por uma guerra fácil.

O Comandante do mar Morto executara pessoalmente alguns desses malditos servos da Deusa da Sabedoria e se divertira imensamente com isso.

O seu prazer acabara junto com a facilidade, durante a invasão da segunda ilha, onde seu séquito tivera que enfrentar uma batalha extremamente ferrenha.

O local, muito mais amplo e organizado que o anterior, estava guarnecido por um vasto grupo de Aspirantes a Soldados, inclusive, tinham alguns já consagrados que faziam os últimos preparativos para se apresentar no Santuário, e liderando-os, estava diversos instrutores, entre eles, um que era extremamente capaz e que treinava, inclusive, uma moça para que essa tornasse Cavaleiro.

Havia neste Tutor, em particular, um imenso poder, e mesmo não vergando uma sagrada Armadura de Athena, fora um rival a altura de Judá e seus comandados.

A ferocidade e o desejo por matanças deste, observado com cautela, pelo Marina de Peixe Leão, igualavam-se ao de feras, loucos e do próprio Judá.

 

Sua discípula não ficava atrás e foi preciso o sacrifício de muitos Soldados Marinas, para que essa, finalmente tombasse.

 

E por falar em baixas, o Comandante do mar Morto perdera praticamente todo contingente militar de seu batalhão no conflito, e sua orgulhosa tropa formada por cem soldados, acabara reduzida a um punhado de pouco mais de vinte, isso sem mencionar os serviçais, dos quais ele nunca se lembrava, ou se importava, e que pareciam morrer, indiscriminadamente, aos montes nas batalhas.

Em seu confronto particular contra o Tutor sanguinário, ele, mesmo vencendo-o e explodindo o miserável, recebera um talho feio na linha do abdômen onde sua Escama o desguarnecia. Olhara as suas próprias tripas, vagamente cônscio do fedor e da gelatina sanguinolenta e em delírio, pensava algo indefinido sobre injustiça, raiva dos seguidores de Athena e morrer como herói.

Ao seu lado, no acampamento improvisado, enquanto ele repousava e recebia cuidados médicos apropriados, seus lacaios cochichavam que apenas o mar, com a BÊNÇÃO DE POSEÍDON, poderia curá-lo.

 

Como estavam, consideravelmente, distante da costa e como imaginavam que Judá não fosse suportar a viagem de regresso, davam como certa, sua morte.

Mas na manhã seguinte, para a surpresa de todos, o corte fechara. E em pouco mais de um dia, cicatrizara.

Não havia explicação lógica para aquilo e então Judá decidira que o destino lhe reservara um grande propósito, e desde então, entreteve-se com fantasias sobre ascender na ordem hierárquica dos Marinas:

 

Quem sabe, tornar-se um General!

 

Afinal, apenas o posto de um dos cinco(3), fora ocupado.

 

Entretanto, a náusea persistia. O ferimento ainda não estava curado por completo e incomodava um pouco. Judá estava irritadiço e distraído, pensando que um guerreiro com sua predestinação nunca deveria sentir enjoos.

 

— Comandante... — chamou por ele uma soldado, tirando-o de seus devaneios.

 

Judá começou uma resposta impaciente, mas interrompeu-o um grito selvagem de guerra, e um garoto de pele escura trajando uma vestimenta reluzente de ébano, que saltava de forma sobre-humana do alto da encosta e golpeava com uma força sem igual, o primeiro Soldado Marina da fila.

Dante, não! — era Capella gritando com o amigo, mas é claro, sendo completamente ignorado por ele.

O Cavaleiro de Prata de Cérbero mal esperara o contingente do exército do Deus dos Mares chegar à distância de um ataque seguro, ansioso que estava, por sangue e justiça.

 

Erguera-se como um leão faminto à espreita nas savanas africanas e saltara num bote certeiro contra o Soldado Marina incauto que estava ladeira abaixo.

A boca de Dante estava aberta e enorme, derramando um rugido para todos os lados. As pernas se encolheram em pleno ar e ele voou os metros que ainda o separava da presa.

O soldado mal tivera tempo de esboçar qualquer reação. Fora atingido no peito pela investida aérea do rapaz que o alvejara em cheio, destroçando o peitoral azulado de sua Escama, empalando seu corpo com a perna direita, utilizando Dante em seguida, à outra perna, à esquerda, para se apoiar, retirar a direita e saltar então para longe, mais a frente.

Sentiu o Cavaleiro de Prata de Cérbero o chão bater-lhe nas solas dos pés. Desorientado por um momento, rindo e tonto, olhos dilatados como um viciado.

 

Por sua vez, o Soldado Marina entrara em choque, e de seu ferimento e boca, escapava uma torrente absurda de sangue.

Como se estivesse cego, ele deu alguns passos titubeando e depois dobrou os joelhos.

A seguir, o fiel guerreiro do Soberano dos Mares tombou, olhos arregalados de pavor, balbuciando desarticuladamente e agonizando até sua morte irremediável.

Emboscada! — gritou outro soldado que estava à frente do batalhão.

Marinas, adiante! Trucidem este lixo da superfície!

Ordenara Judá de Peixe Leão, fulminando Dante com os olhos, sua voz soando colérica.

Inflamados pelo seu Comandante Marina, os Soldados, recuperados do choque parcial e da confusão causada pela ação intempestiva do rapaz, avançaram em marcha, lanças-tridentes em riste.

Diante daquilo, o Cavaleiro de Prata de Cérbero sorrira de modo ameaçador. Confiante, aguardava até que os primeiros daquela horda o alcançassem.

 

“O local que Capella escolhera para a emboscada era perfeito, tivera que admitir.“

 

“Naquele corredor estreito e distante da costa marítima, além de não poderem contar com o auxílio decisivo das águas que representava a BÊNÇÃO DE POSEÍDON sobre eles, a vantagem numérica que possuíam, de nada valeria.”

Dois soldados clamando ao seu Deus se arremeteram ao ataque quase que simultaneamente, impelindo vigorosamente suas armas na direção de Dante, prontos para abatê-lo.

Ante a investida, o Batedor apenas deixara se mover para os lados opostos dos ataques, evitando assim, as hastes afiadas que passaram perigosamente próximas ao seu corpo.

Suas mãos então agarraram e se fecharam com violência, em torno dos pulsos dos dois Marinas, apertando a proteção da Escama e os ossos, até o ponto de esmigalhá-los entre os dedos.

Os soldados de Poseídon se detiveram e gemeram alto de dor, largando suas inestimáveis armas.

Em seguida, o Cavaleiro de Prata de Cérbero girou os pulsos destroçados, forçando-os com brusquidão para baixo e quebrando os membros. O urro de dor de suas presas só serviu de incentivo para que Dante puxasse-as para junto de si e as chutasse ao mesmo tempo, com ambas as pernas, arremessando-as contra seus próprios pares que vinham ao seu encontro.

 

Dante, seu idiota! — a voz limpa e clara de Capella cortara o ar e o combate.

Era a vez do jovem ruivo, saltar da encosta; seus movimentos sendo mais rápidos e fluídos do que os do amigo.

Antes de tocar o solo, suas mãos se moveram com velocidade e perícia até o cinto de sua Armadura e retiraram de lá, dois suntuosos discos com bordas cortantes e em tons de laranja e dourado, que destoavam do argento do restante de seu traje metálico. Havia ainda neles, esculpidos em alto-relevo, uma nuance do astro rei.

Ainda no ar, o rapaz executara uma cambalhota, arremessando suas armas na direção da falange, que por sua vez, deslocavam-se prontos para rechaçar Dante.

 

Com um perfeito, e apertado movimento em arco, os discos lançados por Capella, se moveram até as lanças-tridentes em punho e as retalharam pouco abaixo de suas três hastes.

Quando os pés do Batedor tocaram o solo, suas armas gêmeas já haviam retornado e ele as guardado nas laterais do cinto de sua Armadura.

Atônitos e sem conseguir acreditar no ocorrido, os Soldados Marinas, se detiveram e perceberam que suas poderosas armas, acabaram por serem inutilizadas, pelo segundo Cavaleiro de Athena que também se fizera presente no local.

 

Somente por meio daquelas lanças-tridentes, os soldados do Deus dos Mares eram capazes de fazer uso da força e velocidade sobre-humana provenientes do Cosmo.

 

Sem elas, eram como humanos normais!

— Não me xingue na frente desses ‘peixinhos’, Capella! — sorrira Dante para o amigo, falando em tom de falsa repreensão e se posicionando ao seu lado.

— Não estou te xingando, Dante... esse é o meu grito de batalha. — justificara, Capella.

 

“Não!”

 

Pensara o Cavaleiro de Prata de Auriga em seguida, com calma e sorriso.

 

O grito de batalha dos sagrados Cavaleiros de Athena era outro e era algo de que ele sentia um imenso orgulho:

Por Athena! — bradara, queimando seu Cosmo e correndo na direção dos soldados que ainda esboçavam confusão e lástima por conta da perda de suas preciosas armas.

O que acontecera a seguir chegara a ser constrangedoramente cruel: Capella, movendo-se como um borrão indistinguível, saltava e atingia um golpe certeiro, semelhante a um pisão, em cada um dos Marinas, desviando do próximo com elegância e destreza surpreendente, ganhando nova impulsão a cada alvo abatido, atacando e acertando o pescoço da vítima com a ponta de sua bota, na terceira vértebra cervical.

Como um relâmpago vivo, ele atravessara todos os soldados, em menos de um piscar de olhos, aterrissando mais ao longe, e ficando de costas para eles.

— O que? O que ele fez? — indagou a mesma guerreira que antes chamara por Judá e que estava com o pequeno grupo que não participara da investida contra os Batedores do Santuário.

A resposta viera a seguir: todos os soldados atingidos por Capella desabaram diante dos olhos atônitos de todos, semelhantes a marionetes desprovidas de cordas, sem força ou qualquer controle de seu corpo.

 

Aleijados para sempre!

— Então este é o poder dos sagrados Cavaleiros de Athena?! — sussurrara incrédulo um Soldado Marina que estava na outra extremidade de Judá.

“Nunca imaginei que pudessem ser tão terríveis e poderosos.” — completara.

 

Ele e os poucos que ainda restavam, observavam com temor indisfarçado nos olhos, os dois Cavaleiros de Prata que se preparavam para mais uma investida.

Dante tinha os olhos cravados no líder, um maldito assassino seboso, que parecia ter uns nove Deuses na barriga.

 

Surpreendeu-se com sua frieza, pois ele parecia indiferente com o massacre de sua tropa.

— Não importa o quão forte sejam... — dissera prepotente Judá, retirando de suas costas, um afiado espinho com ponta em ambas as extremidades, segurando-o como se fosse, uma estaca.

“São apenas lixo diante de nós, Marinas do Imperador Poseídon:”

 

“BOMBA DINAMITE!”

O Comandante do mar Morto arremessara então, como a um dardo, o espinho na direção dos dois seguidores de Athena.

 

Este, em pleno voo, passara a irradiar de pequenas reentrâncias, esculpidas como guelras nas laterais de suas hastes, um pulso energético. De imediato, revestira-se de luz, o espinho, convertendo sua forma, para o de um globo avermelhado.

 

Partes inteiras da encosta são calcinadas, desaparecendo nas chamas, consumindo-se em instantes, mediante o ‘abraço’ da detonação do espinho-bomba. Tal fim também fora reservado aos soldados moribundos de outrora, abatidos por Capella.

 

Os lacaios próximos a Judá, desfazem suas posturas defensivas com o qual se protegeram dos estilhaços fumegantes da explosão.

 

Estavam, sem exceção, assombrados com a imensidão do poder de seu líder e também chocados com sua crueldade, pois o Marina de Peixe Leão, em nenhum momento esboçara preocupação, ou remorso, para com os soldados sob seu comando, que ele mesmo acabara de chacinar.

 

As chamas virulentas do holocausto refletiam-se nas retinas dos seus olhos implacáveis e homicidas.

Judá estava imerso num profundo êxtase. Sentia-se inebriado de morticínio.

Naquele dia, descobrira que matar seguidores do Deus dos Mares era tão prazeroso quanto matar os de Athena.

O fogo crepitava e aos poucos ia perdendo intensidade. Os Marinas ainda olhavam para a devastação a frente e ao menos pensavam aliviados que esse fora o fim dos dois malditos Cavaleiros de Athena.

“Nada dentre as fileiras dos exércitos da Deusa da Sabedoria suportaria a força do poder do seu Comandante.”

 

Pelo menos, é o que pensavam os devotos de Poseídon e também essa era a certeza acalentada pelo seu líder.

Entretanto, equívocos são comuns àqueles que se apressam em prejulgar. Ou para aqueles que cometem o erro absurdo, e estúpido, de subestimar o poder dos combatentes de Athena.

O que? — espanta-se, quase que juntos, todos os soldados, quando a nuvem negra de fogo e fumaça abaixa-se por completo.

No local onde Dante e Capella foram engolidos pela explosão existia uma barreira de correntes negras entrelaçadas, que se projetavam do interior do solo em direção ao céu. Havia bolas espinhentas no alto, como hastes de segurança de um muro.

 

Não, não um muro, mas e sim uma barricada que suportara a potência arrasadora da BOMBA DINAMITE de Judá de Peixe Leão.

 

Em seguida, como que se jamais houvesse estado lá, as correntes se desentrelaçaram e voltaram a se esconder no subsolo, diante dos olhos pasmados que as fitavam.

Impossível! — berrara Judá, visivelmente alarmado.

O que era aquilo?” — completara ainda aos berros.

— 'Aquilo' era o ADVENTO DO GUARDIÃO, Marina. Técnica de Dante, Cavaleiro de Prata da Constelação de Cérbero.

— Mas como é possível que essas coisas tenham sido expelidas do chão e que possam suportar a força destrutiva dos meus espinhos-bombas?! — perguntara, tentando ainda digerir o fato de seu poder ter sido facilmente rechaçado.

— Eu explicarei: — retrucara calmamente Dante, enquanto descruzava os braços, que até então estivera naquela posição.

“Graças ao meu poder cósmico, posso reunir uma infinita variedade de partículas de metal que estejam dispersas e repousadas no interior da terra. Dessa forma eu as reúno e as desestabilizo molecularmente para que juntas formem as correntes negras que você e seus malditos subordinados viram. Tudo acontece quase que de forma instantânea. Essas correntes agem como uma extensão dos meus próprios membros e seu poder depende de quão forte é o meu Cosmo...”

 

“Ou seja, quanto mais forte é o meu Cosmo, mais fortes elas o serão:”

ADVENTO DO GUARDIÃO!

 

Os Marinas, inclusive Judá, e também o grupo de serviçais que os acompanhava, estando mais ao longe, foram lançados para o alto, transpassados por inúmeras correntes negras e manguais, que brotavam subitamente do solo abaixo de seus pés.

 

Girando descontroladamente, seus corpos eram açoitados, repetidas vezes pelas correntes, e esmagados pelas bolas espinhentas que, como balas de canhões, destroçavam e arrancavam grandes partes dos seus corpos.

O som metálico de Escamas se despedaçando, ossos se quebrando e carne sendo dilacerada, enchiam o céu, assim como o sangue e os gritos de terror das vítimas.

Capella emudecera ao observar a intensidade e a brutalidade do Cosmo de Dante na utilização de sua poderosa técnica. O amigo nem mesmo poupara os serviçais que nada tinham a ver com o confronto.

O corpo de Judá tombara juntamente com os dos seus falecidos lacaios.

A suntuosa Escama de Peixe Leão ficara irremediavelmente danificada e grandes fragmentos de sua estrutura em dourado, laranja e amarelo, adornava agora o chão, em vários pedaços, juntamente com o sangue do Comandante do mar Morto.

Todavia, exatamente por conta dela, Judá tivera um destino diferente de seus comandados e serviçais, todos mortos de imediato, pelo poder daquele Cavaleiro de Athena.

 

O elmo em forma de cabeça de peixe não mais existia.

 

A trança que antes escapava lateralmente por ele havia se desmanchado.

Sangrando muito, com vários ossos quebrados, lacerações, hematomas e contusões sérias, o orgulhoso Judá erguera-se apenas por pura indignação, acendendo seu Cosmo e tremendo.

 

Ardendo de ódio!

 

— L-Lixo...

 

— Fique no chão, Marina. — ordenara Capella em advertência, tomando, naquele momento, a frente da situação.

“Você não suportaria outro ataque, dessa forma renda-se e fique aí mesmo onde esta.” — completara.

 

— A-Atreve-se a me dar ordens?!... Eu sou um Comandante... um futuro General... faço parte dos poderosos e invencíveis Marinas de sua majestade Poseídon. N-Não vou... não vou me sujeitar a essa infâmia! Um destino grandioso me aguarda...

Pare! — insistira, Capella.

— Que recaíam sobre vocês, lixos da superfície, o maior poder de Peixe Leão:

 

“BOMBARDEIO MASSIVO!”

O Cosmo de Judá se inflamara de forma absurda.

 

A ‘asa’ caída, que em verdade tratava-se de uma nadadeira caudal, arruinada em suas costas, que envolvia sua cintura e pernas como a um saiote, se erguera e se abrira espalhafatosamente como a um leque.

Os espinhos nas costas e ombros de sua Escama mudaram de coloração para um carmesim vivo, unindo-se a energia em mesmo tom, que explodia para o céu como a um gigantesco pilar, sendo forte, seu esplendor, o suficiente para obrigar Dante e Capella a desviar o olhar ou proteger suas vistas.

Antes que os dois Batedores possam verbalizar, ou fazer qualquer coisa, um sibilo cortara o ar, revelando, vindos do alto, incontáveis globos de energia.

 

O Cavaleiro de Prata de Cérbero uma vez mais evocara o poder defensivo de seu ADVENTO DO GUARDIÃO, que conseguira inicialmente os proteger, mas a força somada de inúmeras e ininterruptas, explosões, ameaçava colocar abaixo, aquela guarnição feita de correntes e manguais.

 

Diversos elos partidos e bolas espinhentas despedaçadas, choviam em chamas do céu, coagulando o chão.

 

Os estrondos de cada detonação abalavam o solo, causando desmoronamento nas encostas, fazendo grandes partes do mesmo, ao redor de Dante e Capella, se projetar em blocos irregulares de seus alicerces, arruinando-se.

 

No vilarejo, que estava a poucas horas de caminhada dali, os moradores, detidos em suas tarefas do cotidiano, assustados e confusos, viam ao longe, os clarões que tingiam o céu de vermelho, sentindo também os fortes abalos que faziam toda a ilha sacolejar.

 

Dante buscava intensificar seu Cosmo para que mais correntes irrompessem do solo e recompusesse a sua barricada, tentando a todo custo, mantê-la.

É inútil, lixo da superfície! — gritara Judá, embriagado em êxtase homicida.

Seus braços estavam abertos e seu Cosmo ardia com virulência, alimentando o pilar rubro que fendia os ares e fazia chover sobre os dois Cavaleiros de Athena, um bombardeio de luzes e destruição.

— Esses espinhos são gerados indefinidamente pela minha Escama e em conjunto com meu Cosmo, podem imbuir-se de uma carga explosiva, contendo uma força de detonação equivalente a de inúmeros quilos de dinamite...

 

“Por mais forte que sejam suas correntes não poderão suportar por mais tempo!”

Em meio à voz ensandecida do Comandante Marina, os globos continuavam caindo com uma intensidade avassaladora, e por fim, aniquilaram completamente a barreira defensiva criada por Dante.

Judá sorrira diabolicamente, arregalando os olhos acinzentados, aguardando impaciente o momento em que viria os pedaços carbonizados dos corpos dos dois Cavaleiros de Athena, espalhados pelo chão.

Entretanto...

 

SOLARIA(4)!

Entretanto Capella decidira agir momentos antes da muralha de seu amigo ser arruinada.

O Cavaleiro de Prata de Auriga arqueara o corpo e arremessara seus discos, que se detiveram a frente dele, no ar, alguns metros acima do solo, e começaram a girar cada vez mais céleres, afetando a gravidade a sua volta, fazendo com que a luz incidida sobre eles, ganhasse solidez e realizasse uma série de movimentos curvilíneos que acabaram por si só gerando uma ilusão particular de algo, que não estava de fato lá:

 

Solaria A Carruagem Mítica de Apolo!

 

Capella saltara para a projeção com contornos reais da suntuosa biga pertencente ao Deus-Sol.

 

Tendo as rédeas em suas mãos ele fizera com que o veículo, conduzido pelos mais belos cavalos já viventes, se deslocasse numa velocidade muito próxima a da luz, indo em direção aos espinhos-bombas de Judá.

 

O atrito dos cascos dos animais e das próprias rodas, contra o vento, gerava uma combustão abrasadora, que se espalhavam ao redor da biga e em seu próprio rastro, como línguas de fogo.

 

Os globos explosivos são consumidos em instantes pelas chamas solares, que como chicotes, os açoitaram em sua passagem.

E é assim, em segundos que mais se parecem com horas, que Judá de Peixe Leão contemplara estarrecido, sua mais poderosa técnica, ser rechaçada por um poder com ares divino.

Após debelar o BOMBARDEIO MACIÇO, o rapaz de pele morena regressara ao solo com sua carruagem, que por onde passava, trazia o esplendor do amanhecer.

 

Saltara dela e essa se desfez no momento que os discos detiveram com seus giros constantes e retornaram para o Cavaleiro de Prata de Auriga que por sua vez, os acomodaram em seu cinto.

Um silêncio pesado perdurara por um instante entre eles, até que Capella dera um passo ameaçador na direção de Judá.

— Acabou, Marina...

“Espero que isso tenha feito você entender o tamanho de sua derrota, e que também o faça vir conosco pacificamente até o Santuário, como nosso prisioneiro. Do contrário, morrerá aqui!”

 

Judá engolira um seco. O orgulhoso Comandante do mar Morto relutava em acreditar no que estava acontecendo. Ele jamais imaginara que um dia seria humilhado daquela forma, ainda mais por desprezíveis seguidores de Athena.

O lacaio de Poseídon tenta recuar, mas a gravidade de seus ferimentos, humilhação e o medo em seu ser, não permitem que suas pernas o obedeçam. Derrotado, ele se vê sem opções e é obrigado a considerar ao que aquele lixo da superfície estava propondo.

Provisoriamente resignado, Judá reprimira seu ódio e orgulho, e então tomara a decisão que lhe parecia ser a mais sensata para aquele momento.

 

A decisão que lhe permitiria sobreviver e quem sabe um dia, se vingar daquele ultraje.

— Certo, eu irei com vocêsssssssssaaaaaaaaarrrrrrrrrrrrrgghh!

MARINA?!

Espantara-se Capella, quando notara uma imensa sombra bloquear o sol e vira, em seguida, o vulto de uma mão colossal, vinda por de trás, suspender Judá no céu por uma das pernas.

 

Erguido a mais de cinquenta metros do solo, o Marina até tenta alvejar o gigante com os espinhos-bombas das costas de sua Escama, mas esses, dada a enormidade de seu alvo, e seu poder regenerativo, se mostram pouco eficazes, e logo, o outrora orgulhoso Judá, fora tomado por um pavor que o fizera implorar, aos berros, pela própria vida.

 

Tudo em vão, diga-se de passagem, já que o Comandante do Mar Morto, acabara assassinado quando o colosso o soltara na direção de sua boca escancarada.

 

No lugar dos dentes, o receberam engrenagens feitas de correntes, que se serviam dos espinhos dos manguais, para em seus giros constantes, tornarem-se verdadeiras serras circulares.

 

Capella, devido ao medo primitivo que o devorara, mal conseguira dizer uma palavra frente à brutalidade do que acabara de testemunhar:

 

Um gigante de metal trucidara o Marina de Poseídon que ele pretendia fazer de prisioneiro!

 

— Como imaginei...

 

Soou uma voz familiar vinda do interior do construto metálico.

 

— A morte é o que essa corja assassina mais teme. Desesperadamente buscam satisfazê-la, aniquilando a outros, esperando com isso que ela se mantenha longe deles.

 

Diante das correntes desfazendo a figura do GIGANTE ENCARNADO, e afundando nas entranhas do solo, aparecera Dante.

S-Seu cretino! — sibilara, Capella ainda meio que em choque.

“Por que fez isso? O Marina já havia se rendido e não representava perigo algum. Ele provavelmente possuía informações valiosas para o Santuário a respeito do possível retorno de Poseídon...”

 

“Dante, por que diabos você o matou?”

Não obtivera nenhuma resposta satisfatória deste, se é que poderia haver alguma.

 

 

 

 

De volta ao presente.

Oceano Atlântico. Costa Brasileira.
Próximo a Ilha de Marajó.

 

 

Sangue fora derramado naquele dia, vidas haviam se perdido, juventude e inocência também.

Naquela fatídica tarde, Capella não reconhecera o amigo bondoso e inocente que compartilhara com ele tantos momentos de felicidade, e descobrira em Dante, um instinto assassino e um gosto pelas matanças que não media suas ações para punir aqueles que ele julgava estar errado.

 

E desde então, passara a observar com cuidado as ações do outro, temendo que este pudesse se desviar do bom caminho de Athena, se tornando aquilo que um dia jurou combater.

 

Daquela vez, Capella não agira. Sequer relatara ao Santuário, o ocorrido.

 

Prometera a si próprio que não deixaria aquela situação se repetir, mesmo que para isso, tivesse que confrontar o Cavaleiro de Prata de Cérbero.

Dante...

Sussurrara e, tomado por um senso ainda maior de urgência, saltara da bóia sinalizadora onde estava empoleirado, retomando a corrida sob as águas marítimas, por intermédio do poder de locomoção de MARATONA.

 

— Aguente firme. Eu já estou chegando.

 

 

 

(1): No universo das Crônicas de Athena, substituindo aquilo que é apresentado em Saint Seiya e suas demais franquias, Leviatã corresponderia ao mesmo que Dragão Marinho. Ou seja, ao invés de ser chamado de Dragão Marinho, o General que guarda o oceano Atlântico, aqui nas Crônicas, será chamado de Leviatã. A respeito de tal criatura, há quem a relacione com a divindade babilônica conhecida como Tiamat. A mitologia fenícia também a agrega. Inclusive, com respaldo de relatos do monstro na Bíblia Cristã. Mais precisamente no Livro de Jó. Na Idade Média, a Igreja Católica tratou Leviatã como sendo o representante da Inveja, o Quinto Pecado. Inclusive, a criatura fora colocada como um dos Sete Príncipes do Inferno. Sua figura relaciona-se com a de uma besta marinha colossal. Indo desde a de um crocodilo, passando pela fusão de um dragão, serpente e polvo.

 

(2): Quem acompanha, como eu, os trabalhos dos fãs de Saint Seiya, espalhados na Internet em Blogs, Fóruns... sabe muito bem que o termo 'Comandante' é bem corriqueiro. Ele faz alusão a uma suposta classe intermediária de guerreiros de Poseídon. Lembrando sempre, que na obra original de Saint Seiya, só temos os Generais e os Soldados. Thetis, a Sereia, que serve como porta-voz ao Imperador dos Mares, parece não pertencer a nenhuma das duas classes mencionadas acima, sendo um caso a parte. Aqui nas Crônicas de Athena, os Comandantes foram agregados com base nos trabalhos desses fãs, a quem dedico todos os méritos. E dentre estes, destaco Nikos, autor da Fanfic Saint Seiya — Atlântida: Contos dos Renegados. Considero notório seu trabalho a frente dos Comandantes Marinas.

 

(3): Aqui nas Crônicas de Athena, o número de Generais Marinas fora reduzido de sete para cinco. A razão não é outra, senão que é esse o valor dos oceanos de nosso planeta. Já adiantando aos leitores, no caso do Pacífico, haverá dois, e não um General, como seu representante. Tratam-se de Scylla e Charibdys. Então, isso nos leva a uma contagem final de seis Generais Marinas. Todos os méritos envolvendo a ideia em torno de Scylla e Charibdys, deve-se, por direito, serem endereçadas a Middle Age, de onde foi inspirada.

(4): O termo Solaria, que se refere a uma das técnicas de Capella, foi escolhido por mim, como homenagem, a um amigo escritor de nome Jorge. Foi na CDZona (nome carinhoso pelo qual nós, seus frequentadores, chamávamos a Comunidade de Saint Seiya mais movimentada do ORKUT), que nos conhecemos, quando por lá, postávamos nossas Fanfics. Inclusive, a história do Jorge se intitulava Solaria. Durante esse tempo, começamos a escrever juntos, para as Crônicas de Athena, um esboço de um Gaiden tendo como protagonista, o Máscara da Morte (num futuro próximo, estarei apresentando esse trabalho para vocês, leitores).

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 1 mês depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

Capítulo 3: Exibindo-se com a figura aterradora de dois gigantes, Crio, que teria alcançado aquela envergadura através de seu incrível poder divino, que por sua vez, teria forçado o crescimento indiscriminado do corpo possuído pelo Titã, e o outro, Dante, que a partir do ajuntamento de suas correntes e manguais gerara um construto metálico para si, protagonizaram um duelo de proporções colossais onde no fim, Crio acabara sagrando-se vencedor. Próximo dali, e indo de encontro aos dois na ilha de Marajó, Capella externava toda sua preocupação quando pressentira o desaparecimento súbito, do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero. Inclusive, um acontecimento recente do seu passado, que envolvia ambos numa situação muito similar aquela, acabara emergindo de suas recordações.

 

Capítulo 4: A partir de uma das lembranças de Capella, ele e Dante são apresentados num confronto com alguns Marinas de Poseídon. A situação em si, revela ao Cavaleiro de Prata de Auriga um lado de seu amigo que ele gostaria de não ter descoberto. De volta ao presente,Capella se põe novamente em movimento, determinado a chegar tão logo, em Marajó.

 

 

 

Capítulo 5 Forte o Bastante

 

 

!... você acabou com minha carreira de modelo, demônio...

 

Dante tinha um sorriso enviesado no rosto, agora, horrivelmente marcado.

 

Uma mancha de sangue ressequido partia lateralmente de sua vasta cabeleireira castanha, denotando um severo hematoma, que juntamente com uma queimadura maculavam a face de feições atrevida.

 

Ele acabara de deixar sofregamente uma pilha de escombros que outrora lhe servira de outeiro.

 

Sangrando, ferido.

 

Mal aguentando-se de pé.

 

Mas ainda assim, não completamente derrotado!

Minutos atrás fora alvo do poder abrasivo de Crio e estaria morto agora caso a Armadura de Prata de Cérbero não tivesse deixado, por conta própria, sua urna de repouso na pesada mochila que levava nas costas e o vestido para salvaguardá-lo.

 

Mas o traje pagará um alto preço pela façanha. Já que sua estrutura metálica mostrava-se acometida por algumas trincas e pedaços faltando.

 

Dante e Crio se encararam por um instante no mais completo e aterrador silêncio.

 

Inesperadamente, ao invés de um novo arroubo de fúria e ultraje, o Titã passara a rir ante a visão e as palavras, do Cavaleiro de Athena a sua frente.

 

Não havia qualquer traço de desdém no seu ato, apenas um divertimento genuíno.

 

— Moleque... de fato, mesmo me desagradando seriamente, você também consegue me divertir...

 

Aos poucos, parava de rir.

 

— Gostaria de continuar nossa luta, e claro, realizar meu pretendido como Arauto de Cronos, mas não posso...

 

O Titã também aparentava sérias dificuldades em se manter de pé.

 

Parecia extenuado.

 

Afligido por severas dores.

 

Devo partir...

 

“Mas antes, preciso realizar algo...”

 

Crio, mesmo naquelas condições lastimáveis, passara a emitir uma série de pulsos energéticos. Um poder magnânimo, divino, inclusive, muito superior aquele que havia abatido anteriormente a Dante em seu GIGANTE ENCARNADO.

 

O rapaz de pele negra, embebido em suor e medo, custa a acreditar naquilo que contempla e recua alguns passos, colocando-se na defensiva.

 

Seu espírito combativo de outrora parecia completamente embotado.

 

— Você deveria ter perecido sem dor quando teve a chance, agora, aquilo que pretendia fazer antes da minha partida, cuidará para que você tenha um fim agonizante...

 

“Essa ilha, sabe... decidi que me pertence!

 

“E como tal, me servirá de refugio, quando regressar triunfante do castigo que eu e a meus irmãos, pretendemos impor a Zeus e o Panteão...”

 

“Mas até que isso aconteça, deixarei por aqui, como amostra do meu direito de posse, um dos muitos souvenirs que arregimentei em minhas gloriosas batalhas:”

 

CHAMADO DO SENHOR DAS BESTAS MARINHAS: TELQUINE(1) CONVOCADO!

 

Com os braços erguidos para o alto, de suas mãos espalmadas, um imenso raio propeliu-se para o firmamento, abrindo-se monstruosamente em leque, interpondo-se a realidade, revelando em seu interior sombrio, toda a vastidão sideral.

 

O fenômeno podia ser visto, mesmo em meio à escuridão da noite, por grande parte da costa litorânea do nordeste brasileiro.

 

De dentro da fenda dimensional, uma besta anfíbia emergia.

 

Enquanto esta se fazia presente em Marajó, postando-se ao lado do seu invocador como a um cão fiel, fitando ameaçadoramente a Dante, exibia toda monstruosidade de sua figura.

 

Apesar de não tão colossal quanto a Dante e Crio, quando estes se mostravam como ‘gigantes’, a fera detinha uma envergadura mais que considerável.

 

O Titã mal chegava à altura dos seus tornozelos.

 

Parecia-se essa com um grande lobo revestido por escuras e impenetráveis escamas de peixe.

 

O torso avantajado e musculoso era bem desproporcional ao restante do corpo.

 

Nadadeiras adornavam as dobraduras de seus membros, estes se armavam com garras e membranas entre os dedos que auxiliavam na deslocação pela água.

 

Um par de longas nadadeiras ocupavam o lugar das orelhas, sendo que em uma delas, havia uma argola semelhante a um brinco.

 

Trazia dentre um dos membros dianteiros, fixado em espiral, um bracelete decorado com runas e pedras preciosas.

 

Guelras se agitavam dos lados do pescoço como ferimentos sem sangue na pele de aço.

 

Uma imensa cauda reptiliana estendia-se com quase o dobro da extensão do corpanzil.

 

Esta era marcada por uma lustrosa cabeleira que partia do topo do crânio até o seu limiar.

 

Estranhamente a besta detinha uma expressão de perversa inteligência, algo bastante perceptível em seu par de olhos negros sem íris.

 

Ela, inclusive, parecia estar sorrindo maldosamente para Dante.

 

— C-Caso não saiba, isto que acabo de invocar, é um Telquine...

 

“Trata-se de uma das prole divina de Pontus quando este, nos primórdios dos tempos, dividiu-se, para se tornar Okeanos e Tétis...”

 

Crio falava com muita dificuldade.

 

O corpo que lhe servia de hospedeiro se mostrava bastante deteriorado.

 

Parecia já ter ultrapassado o limite de sua existência.

 

— E-Eu os derrotei quando se puseram em meu caminho na batalha contra as Moiras...

 

“Poupados de minha ira, eles agora me servem!”

 

A fera pareceu empertigar ante essas palavras finais enquanto aquele que era seu senhor tombava inerte, deixando a ela a incumbência de guardar aquele local e se livrar definitivamente daquele Cavaleiro de Athena.

 

Dante olhava para o corpo esparramado e sem vida de Crio.

 

Assustou-se pela forma acelerada que este se decompunha.

 

Seu monstruoso Cosmo de outrora, já não se fazia mais perceptível.

 

Ele se fora!

 

Remoia, o Cavaleiro de Prata de Cérbero, essas coisas, quando notara, a tempo, o vulto do Telquine se agigantar a sua frente; semelhante a um urso, ficando por um átimo de pé, sobre as patas traseiras, a besta marinha arremeteu lateralmente suas garras; o golpe teria dilacerado Dante, dividindo-o em partes indistintas, caso esse não abaixasse ficando como que deitado no solo, com o rosto voltado para o chão.

 

Sobreveio uma segunda investida antes que o monstro tivesse que voltar a ficar de quatro.

 

Vindas do alto e em linear, as garras do outro membro dianteiro desceram prontas para empalar Dante, mas, no entanto, só conseguindo macular o solo.

 

Mais uma vez o rapaz conseguira escapar, dessa vez saltando em segurança para um dos lados.

 

Irritado pela ineficiência de suas ações, o Telquine escancarara sua imensa bocarra, levando-a perigosamente na direção de Dante, que mal acabara de tocar o solo.

 

Esse não deixara estranhamente de sorrir.

 

O joelho do Cavaleiro de Prata de Cérbero, imbuído com toda força sobre-humana que dispunha, materializara juntamente com o restante de si e explodira no queixo da criatura, surpreendendo-a, jogando seu pescoço para trás, encerrando forçosamente sua boca antes que essa concluísse sua pretensão de abocanhá-lo.

 

Houve um momento em que o Batedor pensara em ter obtido completo êxito em sua investida, e até se regozijara, alargando ainda mais o sorriso atrevido, concentrando feixes luminescentes num dos punhos para um disparo certeiro que poria um fim ao combate, contudo, para o seu mais completo estarrecimento, o lobo-marinho recuperara-se quase de imediato do dano que sofrera, e com sua cauda, varrendo lateralmente o ar, covardemente o atingira pelas costas, lançando-o desastrosamente, em meio a rodopios, contra o chão que arruinara mediante ao choque.

 

O Cavaleiro de Athena permanecia cravado na rocha, numa cratera irregular que se formara e tentava dolorosamente se restabelecer, quando o Telquine, sem lhe dar descanso, lançara de sua boca, uma baforada cósmica:

 

HÁLITO MÁGICO!

 

O que deveria ser a voz da criatura — algo nefasto como a um coro de demônios vindos das entranhas do próprio inferno — soara nos recôncavos da mente de Dante e quando este percebera que fora alvejado, notara pasmo, que aquilo regurgitado pelo monstro, alterara as moléculas do solo que o envolvia, transformando a rocha em algum tipo de metal.

 

Dante estava agora preso naquela arapuca!

 

Mesmo toda sua extraordinária força era incapaz de romper, de imediato, aquela amalgama metálica.

 

Ele precisava de um tempo que não dispunha!

 

O Telquine parecia estar gargalhando ante a cena.

 

Andava de um lado para o outro, satisfeito, empertigando-se, saboreando cada tentativa inútil de Dante para se libertar.

 

Vendo a ‘morte’ se aproximar aos poucos, e deleitar-se com sua agonia, só restava para o Cavaleiro de Prata de Cérbero uma oportunidade de virar aquela situação.

 

No entanto, era bastante arriscada.

 

Poderia, não só matá-lo, caso fracassasse, como também aqueles que até então protegera!

 

A besta anfíbia deteve-se e mudara de expressão quando contemplara, mediante a um forte sacolejar da ilha, os casulos de correntes e manguais se revelarem do interior dos escombros que tinham os ocultado até então.

 

Voltara seu olhar intrigado para Dante e percebera esse refulgindo em Cosmo.

 

Não teve dúvidas de que era ele o responsável.

 

O lobo-marinho ainda estava se decidindo pelo que fazer quando, quase em uníssono, os casulos se desfizeram, deixando as pessoas em seu interior, completamente curadas do massacre imposto anteriormente por Crio, deitadas inconscientes no solo.

 

Pensava o Telquine consigo, algumas hipóteses que explicasse tudo aquilo: talvez o rapaz quisesse usar as correntes para atacá-lo, apesar deste, já ter constado a pouco, a indestrutibilidade de suas escamas, no entanto, a certeza de que aquele Cavaleiro de Athena pretendia sacrificar aqueles infelizes em seu lugar, para se salvar, era a mais premente.

 

Enquanto ele devorava aquelas pessoas, Dante teria todo o tempo necessário para romper a malha metálica que o confinava no solo.

 

A fera aquática não conseguira deixar de sorrir ante aquele estratagema que lhe parecia tão ingênuo.

 

Para burlá-lo bastaria que devorasse primeiro aquele rapaz e só depois, ponderadamente, já que poderia passar um longo tempo naquela ilha até que seu senhor retornasse, se alimentaria do resto.

 

Deveria Dante pensar que ele não era dotado de nenhum traço de inteligência.

 

Que como sua aparência sugeria, fosse algum tipo de monstro estúpido voltado apenas para destruição e matanças.

 

Tolo!

 

Sibilava mentalmente o Telquine enquanto se dirigia ao Batedor ignorando os outros e as correntes, ao seu redor.

 

— Tolo é você, monstro.

 

A criatura estancara de imediato, demonstrando descrença diante da pretensão descabida daquelas palavras.

Mas antes que pudesse articular alguma coisa ou desferir uma merecida punição, contemplara todas as correntes de Dante suspensas no ar, explodirem e formarem uma gigantesca nuvem de partículas de ébano que pairavam ameaçadoras a sua volta, brilhando como a mais preciosa das joias.

 

O-O que é isso?” — indagara o filho de Okeanos e Tétis, visivelmente alarmado.

— VÉU DE CALIGEM(2)!

 

Respondera o rapaz, de posse de uma confiança, que beirava a insolência.

 

Planejava usá-lo, como último recurso, contra aquele que o invocou e fora o responsável pela chacina das pessoas inocentes dessa ilha...

 

No entanto, como este se fora e deixara você em seu lugar, reservo a ti, então, este intento.”

 

A nuvem negra agia como se estivesse viva, subindo pelo corpo do Telquine, queimando seus olhos e entrando por cada orifício que encontrava.

 

Essas partículas de metal foram reunidas por mim a partir do sacrifício daquilo que restara do meu ADVENTO DO GUARDIÃO...

 

“E o destruirão de dentro para fora!”

 

Em seu desespero, a besta marinha até tentara interceptar a investida com seu HÁLITO MÁGICO, que chegara a transformar em borboletas, muito daquela poeira metalizada, contudo sua baforada cósmica era incapaz de arrebatar toda a nuvem em sua extensão.

 

P-Pareeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!” — suplicara, sentindo o enrijecimento do seu imenso corpo e o acometimento de uma agonia que não podia ser descrita.

Internamente, as partículas se espalhavam rapidamente através da corrente sanguínea, se misturando e se fortalecendo com as moléculas de ferro já contidas no próprio sangue.

Em extrema aflição o Telquine urrava de dor.

 

O composto metálico se solidificara e se agrupara.

Nesse momento a figura, outrora imponente e assustadora do monstro, explodira, e de seu interior, banhadas em sangue e vísceras, partindo de um ponto central, movendo para todas as direções imagináveis como os raios fúlgidos do sol, surgia um número incontável de correntes negras com bolas espinhentas.

Em seguida, como que se jamais houvesse existido, estas desaparecem, desintegrando-se, voltando ao pó.

 

Com a morte do Telquine, a poça de metal que aprisionava Dante voltara a ser rocha e este não encontrara dificuldades maiores, para, finalmente, se libertar e colocar-se de pé.

 

Os minutos arrastaram-se até que o Cavaleiro de Athena, cambaleante, dirigiu-se até os restos ensanguentados da fera.

 

A massa disforme de sua carcaça denotava que ela jamais se levantaria outra vez.

 

Acabou...

Sussurrara, abaixando a cabeça, soltando um suspiro do mais completo alívio.

— Mestres...

 

Albiore... Jared... Marfic...”

 

“Adorável Irulane, meu eterno amor e companheira inestimável de treinos...”

 

“O que me ensinaram usei, uma vez mais, para proteger os inocentes, proporcionar a justiça e vingar aqueles que sofreram.”

 

“Obrigado a vocês todos!”

 

Lágrimas escorriam da face do guerreiro implacável.

 

Ele olhava contemplativo para o céu noturno e mal percebera que a sua volta, os habitantes de Marajó, que outrora curara e salvaguardara, despertavam.

 

Enquanto estes indagavam entre si sobre o ocorrido e vislumbravam atônitos toda a devastação que os cercavam, Dante se afastara discretamente, decidido agora em partir para o Santuário, já que seu trabalho ali fora concluído.

 

Distanciara alguns metros daquelas pessoas, ignorando olhares curiosos e perguntas, quando sentiu uma flutuação cósmica.

 

Sobreveio o calor e depois... as chamas!

 

Seja lá o que fosse, era seletivo, pois poupara Dante, incinerando a todos os outros.

 

Corpos carbonizados, nas mais variadas posições, desfazendo-se lentamente em cinzas, estavam por todos os lados e o Batedor encarava trêmulo, com um sentimento de impotência esmagando seu ser, todo aquele horror.

 

Sua mente entorpecida via a tudo como a um terrível pesadelo.

 

Esperava avidamente acordar e perceber que nada daquilo havia acontecido.

 

Aquelas pessoas estavam vivas...

 

Tinham que estar!

 

Balbuciava preces a Athena para que fosse assim.

 

Entretanto, a realidade trágica a sua volta, insistia em permanecer inalterada.

 

O cheiro desagradável de corpos e ozônio queimado empesteava o ar.

 

Cinzas agarravam ao suor de sua pele, tornando sua aparência ainda mais desoladora.

 

NÃOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!

 

Berrou enquanto agarrava em desespero a figura negra e diminuta daquilo que fora uma criança e essa desmanchava em seus braços.


A luta nunca acaba Cavaleiro de Athena!”

 

“Seus tutores e namorada deviam lhe ter, também, ensinado isso.”

A voz inexpressiva ressoara dentro da mente de Dante.

 

O Cavaleiro de Prata de Cérbero buscara recompor-se ao ponto que sentia um Cosmo, antes disperso e imperceptível, reunir-se e ganhar forma.

 

Sua similaridade remetia-se com o precursor que trouxera o fogo vivo até aquela ilha.

 

Diante de si, um garoto franzino de pele pálida, erguera-se.

 

Seus olhos assustavam Dante mais do que qualquer coisa.

 

A voz do Cavaleiro de Prata de Cérbero embarga.

 

Ele dá dois passos cautelosos para trás.

 

Seus sentimentos se misturavam e dentre as diversas perguntas que ansiava por fazer, lançara mão da mais óbvia:

 

— Q-Quem... q-quem é você?

A figura mirrada enfiara os dedos de suas mãos, com exceção dos polegares, nos bolsos da frente de seu jeans e então respondera com uma calma desconcertante:

— Eu sou um dos Dez(3) Titãs... aquele que detém o Sol como guardião... que tem a Razão como estigma... e a Sephiroth de Tipheret, como arma...

 

“Eu sou...”

 

“Hyperion!

 

 

 

(1): Provindos da mitologia grega, como sendo filhos de Pontus com Tálassa, os Telquines seriam bestas marinhas com aparência canídea, mais precisamente de lobos, peritos na arte da ‘magia negra’, sendo inclusive, punidos por Zeus, pela sua prática. Segundo algumas versões relativas, e divergentes, que os ligam à Poseídon, o tridente da divindade dos mares, teria sido forjado por eles e não pelos Ciclopes. No universo das Crônicas de Athena, os Telquines são tratados como filhos de Okeanos e Tétis. Sua aparência, igualmente, faria alusão a um lobo ‘marinho’. Contudo, seu poder viria do arranjo molecular — Alquimia. Sua quantidade fora determinada em três e seus nomes sendo: Wyld, Weaver e Wyrm. Serviam no passado, as Moiras, suas irmãs, mas quando essas foram expulsas de seus domínios por Crio, passaram a servi-lo no lugar delas.

 

(2): O nome da técnica de Dante, VÉU DE CALIGEM, fora retirado da Middle Age.

 

(3): É sempre bom recordar, que aqui nas Crônicas de Athena, o número de Titãs se limita a dez, e não doze, como acontece no Episódio G de Megumu Okada.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 1 mês depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

Capítulo 3: Exibindo-se com a figura aterradora de dois gigantes, Crio, que teria alcançado aquela envergadura através de seu incrível poder divino, que por sua vez, teria forçado o crescimento indiscriminado do corpo possuído pelo Titã, e o outro, Dante, que a partir do ajuntamento de suas correntes e manguais gerara um construto metálico para si, protagonizaram um duelo de proporções colossais onde no fim, Crio acabara sagrando-se vencedor. Próximo dali, e indo de encontro aos dois na ilha de Marajó, Capella externava toda sua preocupação quando pressentira o desaparecimento súbito, do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero. Inclusive, um acontecimento recente do seu passado, que envolvia ambos numa situação muito similar aquela, acabara emergindo de suas recordações.

 

Capítulo 4: A partir de uma das lembranças de Capella, ele e Dante são apresentados num confronto com alguns Marinas de Poseídon. A situação em si, revela ao Cavaleiro de Prata de Auriga um lado de seu amigo que ele gostaria de não ter descoberto. De volta ao presente,Capella se põe novamente em movimento, determinado a chegar tão logo, em Marajó.

 

Capítulo 5: Tendo que abandonar, tão logo, e a contragosto, aquele corpo que lhe servira de morada, já que esse, devido as suas constantes e desmedidas liberações de poder se decompusera rapidamente, Crio vê diante de sua pessoa surgir Dante a quem pensava, outrora, ter eliminado. Muito ferido, o Cavaleiro de Prata de Cérbero trajava sua Armadura, sendo essa, a responsável por sua sobrevivência. Antes de partir, para garantir seu direito de posse perante Marajó e ao mesmo tempo dar cabo em definitivo de Dante, o Titã invoca, através de uma fenda dimensional, um Telquine. Contudo, a besta marinha acaba derrotada. Com a situação aparentemente resolvida, o Cavaleiro de Prata de Cérbero pretendia deixar a ilha, regressando assim, ao Santuário, quando, para o seu mais completo horror, observara impotente os habitantes do lugar, que antes havia salvado, serem brutalmente assassinados. O responsável não é outro, senão Hyperion.

 

 

 

Capítulo 6 A Razão diante dos Laços que os Unem

 

 

H-Hyperion?!

Surpreende-se o rapaz de pele escura, cabeleireira castanha e olhos verdes amendoados, engolindo seco e recuando.

 

Seu comportamento não provinha da revelação do nome do garoto franzino e doentio que o encarava inexpressivo, e caminhava displicente na sua direção, mas sim com o desmesurado Cosmo que provinha deste; uma massa etérea de energia rubra capaz de vitimá-lo, ante sua simples exposição, com uma força esmagadora invisível, que o teria rasgado em pedaços, caso esse, Dante não estivesse de posse de sua Armadura.

 

— Isso mesmo...

 

Respondera o Titã, fazendo seu Cosmo transbordante, cessar.

 

— Me chamo Hyperion e se me permite a confissão, sei muito bem quem você é... Dante!

 

“Antes de me revelar... e matar essas pessoas...”

 

Este lançara um olhar displicente, enquanto andava, com as mãos enfiadas nos bolsos da frente de sua calça, para os muitos corpos carbonizados que os cercavam.

 

Aos poucos, os mesmos estavam desfazendo-se em cinzas, formando montes que eram levados como pó, pelo vento.

 

— Reservei a mim, o direito de assisti-lo em ação nas suas lutas contra Crio, meu irmão e respectivamente Wyld, um dos Telquines...

 

Hyperion, que havia mirado as carcaças do invólucro de Crio e depois do Telquine, voltara sua atenção para o Cavaleiro de Prata de Cérbero.

 

— Percebo seu medo e intenção de fugir... sossegue... não desejo lhe fazer mal... a menos, é claro, que seja necessário... o que quero de ti é apenas aquilo que me pertence por direito...

— N-Não estou com medo... — nega de pernas trêmulas, o Batedor, limpando com as costas das mãos o suor que escorria abundante de suas têmporas.

 

Buscava, em vão, manter-se calmo e prestar a devida atenção naquilo que lhe era falado. No entanto, o novo impasse que descortinara diante de si, como a um horrível pesadelo, o atrapalhava bastante.

 

Tinha o poder absurdo daquele garoto que se revelara e sua indignação pelo assassinato brutal dos habitantes de Marajó.

 

Inocentes que, mesmo diante de todos seus esforços, pereceram!

 

Só restava agora, vingá-los... punir o responsável... Hyperion...

 

Sim, estava determinado em realizar aquilo!

 

Todavia, não sabia ainda como, já que em seus combates de a pouco, ferira-se gravemente e desprendera, praticamente, toda energia que poderia dispor.

 

— Não há necessidade de mentir... admita...

 

As palavras do Titã fazem o Cavaleiro de Prata de Cérbero engolir seco novamente.

 

Dante permanecia bastante inseguro quanto ao que fazer.

 

— Você percebera o óbvio ao notar a diferença entre nossas forças e seu corpo esta reagindo, naturalmente, a isso...

 

“Sejamos francos, você já estaria morto, como os infelizes dessa ilha, caso essa fosse minha vontade.”

— N-Nunca... e-eu... eu sou um Cavaleiro de Athena...

 

Cavaleiro de Prata...”

 

Batedor do Santuário...”

 

“J-Jamais seria morto por um demônio como você.”

 

O rapaz detivera-se, firmando com muito custo, as pernas, assumindo um semblante que tentava denotar, alguma obstinação.

— Cavaleiro de Athena...

Hyperion falara com seu inalterável tom lacônico e num átimo sua expressão transfigurara, ficando este, pensativo ao ponto de cessar com o seu caminhar e então, depois de alguns instantes quieto, continuara:

— Sim, eu sei... de meu cárcere no Tártaro acompanhei os grandes feitos dos assim chamados ‘Cavaleiros de Athena’...

Dante estava agora um tanto consternado e sua postura havia levemente embotado; detectara respeito na voz daquele demônio. Mais do que isso, tinha certa dose de reverência em suas palavras.

— Aprendi tudo sobre os jovens corajosos, que desde tempos imemoriais, vieram dos quatro cantos da Terra para servir, proteger e lutar ao lado da Deusa da Sabedoria...

 

“Seus punhos sendo capazes de rasgar os céus e seus pés esmigalhar a terra...”

Divindades de coração humano, que trazem sobe seus corpos frágeis, vestimentas metálicas chamadas de Armaduras, regidas essas, pelas constelações presentes no firmamento, forjadas a pedido de Athena, pelas mãos do próprio Hefestos(1), o Deus da Metalurgia, aquele que herdara dos falecidos Ciclopes, a faculdade de dominar as chamas e urdir os metais.”

Originalmente são Oitenta e oito Cavaleiros:”

Cinquenta e dois de Bronze; a terceira força, aqueles que expuseram a natureza de seus Cosmo mediante a instrução e treinamento.”

Vinte e quatro de Prata; os guerreiros intermediários que despertaram o Cosmo em algum momento de suas vidas e que depois de serem devidamente preparados, o desenvolveram.”

“E por término, a elite: Os doze Cavaleiros de Ouro. Aqueles que já nasceram com seus Cosmos plenos e com a consciência inata de como usá-los; estes prodígios vergam as Armaduras elípticas, tão próximas em suas fabulosas resistências, as Égides(2) dos Deuses.”

 

Houvera silêncio.

Talvez você tivesse alguma chance comigo se fosse um desses Cavaleiros de Ouro, mas... bem... ainda não o destruí porque exijo algo de sua pessoa, e de certa forma, confesso, você me fascina.

 

Eu o quê?

Dante, reunindo os resquícios de sua força, conseguira fazer seu Cosmo avultar.

O Cavaleiro de Prata de Cérbero, além de constrangido, estava visivelmente alarmado com o fato daquele demônio saber tanto sobre as origens de seus pares.

— Eu disse que você me deixa fascinado...

 

“Afinal, você, um Cavaleiro de Prata, que usa o Cosmo como uma ferramenta desajeitada, forçara, em combate, a inutilização do invólucro mortal de Crio, um Titã, fazendo com que este, tivesse que abandoná-lo prematuramente...”

 

“Se não bastasse a realização dessa façanha, vencera, em seguida, esplendidamente, um dos três Telquines, invocado este, para essa ilha, por intermédio da vontade de Crio; filhos de Okeanos e Tétis, de nomes: Wyld, Weaver e Wyrm; tratam-se de bestas descomunais com locomoção anfíbia, temidas desde a antiguidade pelo seu domínio na prática da reestruturação molecularAlquimia.”

“Mas não querendo desmerecer seus feitos e lhe tirar sua glória, caso meu irmão, inicialmente, tivesse a prudência de utilizar seu poder, não só para a destruição, com seu COLOSSO TITÂNICO, como também para retardar a degeneração do seu hospedeiro, assim como regenerá-lo dos possíveis danos afligidos por você, certamente, o resultado de tudo isso seria bem diferente.”

 

“Para começar, nem estaríamos tendo essa conversa, já que, defuntos, não falam.”

Hyperion parara, uma vez mais, de falar. Estava imóvel... plácido.

 

A cor alva de sua camisa emprestava-lhe à pele um profundo tom sublime, como se ele não fosse real ou que não pertencesse aquele mundo.

Dante estava paralisado. Aquele garoto a sua frente parecia tão passivo e sem vida quanto a uma estátua.

 

Seus olhos negros estavam cansados, injetados. Seu corpo magro e debilitado parecia consumir a si próprio.

Subitamente, o Cavaleiro de Prata de Cérbero entendeu o motivo: aquele corpo estava morrendo. O poder daquele demônio não cessava de infundir-lhe vida, mas não estava dando resultado, só estava adiando o inevitável. Um número demasiado de células e terminações nervosas já se encontravam mortas.

— Que aquilo que ocorreu aqui hoje, nesta ilha, lhe sirva de lição, Crio...

“Enquanto se recupera no Labirinto de Cronos, que você aprenda: a causadora de sua infâmia fora sua visão limitada e simplista das coisas.”

“E se sinta satisfeito por perder somente sua dignidade.”

Hyperion agora encarava, admirado, Dante, depois de toda aquela declamação.

— Mas não nego que você foi formidável, Cavaleiro de Athena. Eu apreciei bastante sua forma de combater. Sua convicção, seu orgulho, até mesmo sua impertinência e fiquei interessado...

Continuou o Titã, até que a voz cheia de ira do rapaz soara cáustica, interrompendo-o.

— “Invólucro mortal”... um inocente... agora começo a entender... vocês, demônios, estão se servindo dos corpos de outros para poderem realizar suas atrocidades.

 

— Me poupe, por favor, de sua ignorância. Não somos demônios... será que não ouviu nada daquilo que Crio, ou eu, lhe falava?!...

 

Somos Titãs!”

 

“Divindades de poder absoluto que existem desde a aurora dos tempos... somos dignos de adoração e temor...”

“Nosso inigualável poder nos dá o direito sobre vocês humanos, afinal, fomos nós que os criamos... nada mais justo que os usemos em nossos propósitos.”

“Servir aos desígnios de um ser, como eu, é um privilégio e honra que não pode ser descrito com palavras, dada a sua tamanha importância.”

 

“E isso nos remete ao que lhe tinha falado no início quando frisara que desejava, de você, algo que me pertencia... ou seja, sua servidão...”

“Também lhe peço, não seja tão ingênuo... pois não existem humanos inocentes... e dentre muito em breve, nem vivos!”

— I-Isso é o que vamos ver, demônio... Titã... ou seja lá o que você for... eu... as pessoas... não somos propriedades dos de sua laia e nem joguetes...

Dante inflama seu Cosmo. Hyperion, por sua vez, prossegue o encarando arrebatado.

— Minha ‘laia’ nasceu para dominar enquanto a sua Cavaleiro de Athena, essa existe com a finalidade única de ser subjugada...

 

O Cosmo do Titã agiganta-se novamente e engloba facilmente o poder manifesto de Dante, fazendo o desaparecer.

 

A pressão energética é tamanha que obriga o rapaz a prostrar-se de joelhos, amparando as mãos no solo que se arruinava molecularmente ao seu redor.

 

Fragmentos de sua Armadura se soltavam como estilhaços de cerâmica.

 

Novas rachaduras surgiam, algumas, a partir daquelas que já existiam.

 

— Q-Quanta... f-força...!

 

Até mesmo falar tornara-se impraticável uma vez que Dante sentia seu corpo sucumbir dolorosamente.

 

Não tardaria e em mais alguns instantes seu fim estaria consumado.

 

De joelhos... essa é a condição habitual de vocês, humanos...

 

O rapaz ouve essas palavras vindas de seu implacável algoz, como se elas proviessem ao longe, sendo-lhe, muito pouco discerníveis.

 

— Qualquer coisa que contrarie isso só resultará em sofrimento... muito sofrimento... pare de lutar contra a ‘razão’... abrace a verdade e esta, como recompensa, o libertará.

 

Humilhado e sofrendo uma agonia extrema, os olhos esverdeados do Cavaleiro de Prata de Cérbero, mesmo que turvados pelo seu sangue, que passara a brotar de todos seus poros, encontrara-se com os de Hyperion em seu falatório; o Titã encarava-o de cima, com piedade agora, a macular suas feições inumanas.

 

Um calafrio percorrera todo ser de Dante gerando pavor.

 

Nunca em sua vida sentira tanto medo.

 

Jamais estivera diante de um adversário como aquele.

 

E não era somente a força deste que o aterrorizava, era a fatalidade, quase palpável, provinda de suas palavras.

 

Seus medonhos olhos azeviche, capazes de fazer gelar o sangue em suas veias.

 

“Que tipo de demônio era esse tal de Hyperion?”

 

“Com o que estava, de fato, lidando?”

 

“Que Athena o ajudasse e o protegesse, daquele abjeto mal encarnado!” — orava o rapaz, em silêncio.

 

Além dessa prece, pedia perdão a sua Deusa e aos inocentes brutalizados daquela ilha por não poder fazer mais.

 

A morte estava prestes a acolhê-lo e ele pretendia despedir-se com abnegação da vida.

 

Não haveria desespero.

 

Nem arrependimentos.

 

Apenas a aceitação daquele que fizera o máximo ao seu alcance.

Misericordioso, o Titã observava-o com interesse, aguardando por sua decisão.

 

Quando percebera, satisfeito, que Dante deixara de resistir à pressão do seu Cosmo, que o duramente afligia, fizera seu poder desvanecer.

 

Com isso, os efeitos calamitosos no cenário e na própria figura de Dante, cessaram.

 

Sem acreditar que ainda permanecia vivo, e imensamente aliviado por esse ‘milagre’, o Cavaleiro de Prata de Cérbero intimamente agradece a Athena por tê-lo atendido, imaginando ter sido ela o motivo pelo qual, o poder do Cosmo de Hyperion, se apagara.

 

Todavia, quando percebe que a figura do Titã continuava do mesmo jeito e que ele mantinha sobre si, o mesmo olhar de compaixão, Dante compreendera amargamente, que sua Deusa, nada tinha haver com sua salvação.

 

Fora o próprio demônio que, por alguma razão, decidira conter a força avassaladora de seu vasto poder.

 

Lentamente, Dante ia se colocando de pé.

 

Seu equilíbrio era precário.

 

Havia perdido muito sangue e desmaiaria a qualquer instante.

 

— Está pronto para admitir sua sujeição?! — quis saber, Hyperion.

 

— F-Fará frio no inferno antes que isso aconteça...

 

— Então já deve estar nevando por lá... afinal, perante mim, colocasse a pouco, prostrado, em nítida amostra de servidão...

 

Dante ruborizou.

 

Com os dentes trincados de raiva e pressionando violentamente um dos punhos expusera seu Cosmo para fora, e despejara contra a figura serena do Titã, uma fagulha incandescente.

 

Como uma capa se fechando, uma mortalha energética, revestira de imediato, Hyperion, dos pés a cabeça, fazendo o ar a sua volta revolver e suas vestes e cabelo, agitarem para o alto, em frenesi. Com as mãos para fora dos bolsos de sua calça, e agora de posse daquela aura defensiva, movendo um dos braços lateralmente, como se esse fosse um bastão, desviara, sem sofrer qualquer dano, o projétil luminoso do rapaz, fazendo com que esse, forçado a admitir uma nova trajetória, fizesse uma curva apertada no céu noturno e explodisse contra o solo.

 

Minúsculos pontos radiantes, que se dispersavam, tanto como um rebuliço de poeira no chão, indicavam na escuridão o caminho percorrido pelo disparo.

 

— D-Droga...

 

Tanto a frustração, como a cólera, permeavam o desabafo de Dante.

 

DROGAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!

 

O Batedor tinha em mente, mesmo com a certeza de um novo fracasso a lhe incomodar, e com a preocupação de que suas reservas de força já estavam no fim, lançar contra o demônio, novas fagulhas, apostando que vários disparos consecutivos talvez pudessem dificultar a defensiva de Hyperion, quando a partir da imagem deste, um flash cegante, irradiara, preenchendo de luz, o negrume da noite:

 

CABRA CEGA!

 

Dissera o Titã, enquanto as vistas de Dante, momentaneamente, eram comprometidas.

 

Cego, a mente do Cavaleiro de Athena ainda registrava a ocorrência da emanação do brilho e suas consequências, quando Dante sentira uma pancada violenta na perna de apoio, que lhe tirara o equilíbrio, fazendo-o girar no próprio eixo, e ir, desajeitado, de cara contra o solo.

 

Preparava para se levantar quando veio um duro, e covarde, golpe na cabeça e mesmo com a quantidade absurda de sangue a se derramar do crânio, tingindo horrivelmente de carmesim, as rochas, a decorrência dos fatos poderia ter sido bem pior, com certeza, letal, caso a tiara da vestimenta de Cérbero, feita em pedaços, não tivesse ali para protegê-lo.

 

Entorpecido, devido à extrema dor que o permeava, Dante não sentia, ou mesmo enxergava, a imagem de Hyperion materializada com o pé em cima de sua cabeça.

 

— Peço-lhe que me diga quando já for o suficiente...

 

“Senão posso acabar te matando sem querer.”

 

Como das outras vezes, não havia troça nas palavras do Titã, muito menos desdém, apenas certa dose de inevitabilidade.

 

— S-Só será suficiente quando eu conseguir... d-dar cabo de você, demônio...

 

O Batedor, com as vistas já recuperadas, se desvencilhara da opressão de Hyperion e mais uma vez, mesmo que vacilante, erguera-se para a luta.

 

Naquela, que deveria ser a última vez, fizera, Dante, seu Cosmo fulgir numa pira argenta!

 

— É realmente incrível que ainda consiga manifestar tal poder estando esgotado e com seu corpo neste estado tão deplorável...

“No entanto, além de lhe ser, superior em força, advirto que tudo que tentar, será em vão contra mim. Deve se lembrar que havia lhe dito, a pouco, ter acompanhado suas batalhas decorridas nessa ilha, dessa forma, presumisse que sei perfeitamente do que você é capaz.”

— Quer dizer que assistiu friamente seu irmão combater e não fez nada para ajudá-lo...

 

E daí?

— Como “e daí”?!

“Sendo seu irmão... companheiro... ou mesmo um completo estranho... você devia vir em seu socorro...”

 

“Essa é a obrigação daqueles que trazem consigo a dádiva do poder...”

 

“Exercê-lo em prol daqueles que não o tem!”

Hyperion ficara por um instante em silêncio.

 

Ele achava extremamente sem sentido aquilo tudo que Dante havia pregado com tanta veemência. Mesmo não tendo a necessidade de rebater aquelas palavras, sentia o Titã, no seu âmago, que devia fazê-lo.

 

— Dante... não percebe a insensatez de suas palavras e como elas subvertem a ordem de todas as coisas?!

 

“Nunca... jamais... o forte deveria se sujeitar aquele que é fraco.”

 

“Inclusive... se faz, desde sempre, em toda esfera da criação, justamente o contrário.”

 

— E-Eu não aceito.

 

“Nossa conversa acaba, definitivamente aqui, Hyperion. Eu não estou disposto a continuar ouvindo sua lógica doentia...”

 

“Vou destruí-lo da forma mais dolorosa possível:”

 

VÉU DE CALIGEM!”

Após o Cavaleiro de Athena bradar isso, e apontar os braços para o Titã, como se quisesse lhe despejar algo, uma nuvem negra de partículas de metal erguera-se do solo, e avançara ‘faminta’, como uma praga, na direção daquele que tinha como alvo.

Eu já disse que não adianta:

 

FAZ DE CONTA QUE SOU O SOL!

 

Em meio às essas palavras de Hyperion, seu corpo magricela e apático, consumira-se numa apavorante combustão interna, essa, depois de reduzi-lo a nada, extravasara para fora com ímpeto, ganhando os contornos de uma miniatura de ‘sol’.

A ilha na costa brasileira explodira em chamas, que alcançavam centenas de metros de altura.

 

O chão, já bastante castigado, treme; os céus noturnos clareiam como se naquele momento o astro-rei tivesse acabado de nascer e resplandecesse com toda sua majestade.

A esfera de calor irradiado, atraía para si, como a um redemoinho, partes inteiras de Marajó, que se desprendiam de seus alicerces e em menos de um piscar de olhos, incineravam-se.

A poeira metálica, invocada pela técnica de Dante, desaparece antes de poder tocar o corpo do Titã.

 

Sumira como uma sombra que fora expurgada facilmente pelo brilho incandescente de uma lâmpada acesa.

O Cavaleiro de Prata de Cérbero esboçara uma careta de surpresa e pavor não crendo que tal poder pudesse existir nesse mundo.

Tamanha é a catástrofe perpetrada por Hyperion que grande parte de Marajó fora obliterado.

 

Quando o pequeno ‘sol’, que o Titã se tornara, deixara de existir, o que se viu, em meio ao crepitar caudaloso do fogo e das densas nuvens de fumaça a cobrir, e empestear os ares, é um novo acidente geográfico, uma ilha de proporções menores, que teve boa parte de sua extensão territorial aniquilada e que se tornara agora, um retrato do próprio inferno, exibindo paragens semelhantes à de um vulcão.

E no centro de toda essa calamidade, revelava-se, espantosamente, a figura materializada de Hyperion, segurando firmemente a Dante, aparentemente desacordado, pelo pescoço.

A Armadura sagrada de Cérbero estava coberta de fuligem e ainda fumegava em certos pontos. As perdas em sua estrutura, tanto como as trincas, haviam alastrados de tal forma, que a impressão que se tinha, era que o traje iria se desfazer em cacos, a qualquer instante.

Já o corpo do rapaz abaixo daquela amalgama de metal, tornara-se um tição, devido as severas queimaduras.

 

Dante perdera os cabelos, e partes do seu corpo, como as orelhas, haviam derretido.

 

Qualquer outro humano já estaria morto devida a tamanha agressão, entretanto, o Batedor ainda respirava.

Vivo?!

 

“É espantoso que um ser, de natureza tão efêmera, agarre-se tanto a vida...”

 

“Mas não se preocupe, Cavaleiro de Athena. Apesar de a contragosto ter lhe feito tamanho mal, não pretendo matá-lo...”

 

“Pelo menos... não agora...”

Os olhos, naquele momento sem íris de Hyperion, enquanto este falava, exalavam uma continua radiação abrasiva, que se encaminhava em direção aos céus como fumaça.

— Como eu havia dito anteriormente, exijo que me sirva... já que tenho planos para você!

As vistas do Titã viraram-se para o horizonte, e ele, pela primeira vez, sorrira.

Na verdade, também estou interessado no seu amigo Cavaleiro, que se aproxima tão velozmente daqui.

 

A imagem muda para uma das inúmeras praias de Marajó, onde a figura em movimento, e preocupada de Capella, deixava a superfície marinha do Atlântico, para correr em solo firme, vindo este, quase na mesma direção, onde os dois estavam.

— Hoje os Cavaleiros de Athena provaram o que eu já havia constatado há muito tempo em meu exílio...

“Vocês são capazes de enfrentarem seres divinos e inclusive, vencê-los!”

“Dessa forma eu pretendo usá-los, como peões, contra Zeus e sua corja, na guerra que está por vir.”

Dante e Capella, vocês dois serão os meus primeiros Acólitos. Rejubilem-se, pois servirão agora verdadeiramente a um propósito maior...”

Servirão a mim!”

Neste instante, a cena torna a enquadrar Hyperion e ao Cavaleiro de Prata de Cérbero.

Sem grandes avisos, o Titã se cala e seu sorriso desaparece quando este percebe, que mesmo inconsciente, Dante também sentira, como ele, a presença do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Auriga e agora chamava por ele:

— C-Capella...

A voz do rapaz era menos que um sussurro. Soava baixa, carregada de dor, todavia, existia nela um traço de contentamento e segurança que intrigava e irritava a Hyperion.

No interior de seu ser, Dante estava feliz e se sentia reconfortado por saber que seu amigo estava por perto.

 

O Batedor sempre estivera acostumado a perdas.

Desde que o Agente do Santuário o encontrara nas ruas de Adis Abeba, mendigando, roubando e sendo abusado por marginais, após sua fuga da severidade da criação imposta por seus pais, o menino de pele escura, cabelos castanhos claros e olhos verdes, compreendera duramente, que não devia se apegar a nada ou ninguém.

Muito menos confiar.

Entretanto, a partir do momento em que chegara ao Santuário e conhecera Capella nos Alojamentos, a quem passara a se afeiçoar como se este fosse seu irmão, sua postura de não se ‘apegar’ desabara.

Os laços de amizade entre eles aumentaram significamente quando, juntos de outros jovens promissores, foram enviados para a Ilha de Andrômeda, o mais importante, posto avançado do Santuário desta época, onde dariam prosseguimento com sua doutrinação para que pudessem, num futuro próximo, sagrar-se Cavaleiros.

Neste local, de intensa preparação e estudos, sobe a supervisão rígida, mas não menos acolhedora, de Albiore, Dante, pela primeira vez, sentiria como é de fato pertencer a uma família.

Ele, e os demais: Algol, Misty, Tristan, Nínive, Marin e Capella, encontrariam no Cavaleiro de Prata de Cefeu, a figura, não só de Tutor, mas como também a de um pai, que ama seus filhos acima de tudo.

 

E agora, tão próximo como estava da morte, o Batedor sente o peito aquecido e uma sensação esmagadora de paz. Ele sabia que nunca estaria mais sozinho. Que sempre teria sua ‘família‘ a seu lado, não importasse o que lhe acontecesse.

 

— Capella...

— Você pode chamar por seu amigo o quanto quiser, Cavaleiro de Athena...

Os dedos de Hyperion afundaram no pescoço de Dante, exercendo uma pressão desmedida no local; o ato em si, é suficiente para que o Batedor esboce uma careta de dor e seja incapaz de continuar proferindo o nome do Cavaleiro de Prata de Auriga em seus delírios.

— Posso garantir que Capella não chegará a tempo de salvá-lo. Na verdade, mesmo que viesse, isso em nada mudaria seu destino, ou ao dele:

 

“TUDO QUE SEU MESTRE MANDAR!”

O Titã projetara sua mente no interior da do Cavaleiro de Prata de Cérbero, invadindo-a, forçando este, a sujeitar-se.

 

 

 

 

(1): Aqui, nas Crônicas de Athena, diferente do que é mostrado em Saint Seiya, as Armaduras dos Cavaleiros teriam sido forjadas por Hefestos, e não pelos Lemurianos. Logo, neste mesmo Livro 1, mais detalhes sobre isso será fornecido a vocês, leitores.

 

(2): Lembrando, que no universo das Crônicas de Athena, as armaduras dos Deuses, ao invés de serem tratadas como Kamuis, são chamadas de Égides.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 1 mês depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

Capítulo 3: Exibindo-se com a figura aterradora de dois gigantes, Crio, que teria alcançado aquela envergadura através de seu incrível poder divino, que por sua vez, teria forçado o crescimento indiscriminado do corpo possuído pelo Titã, e o outro, Dante, que a partir do ajuntamento de suas correntes e manguais gerara um construto metálico para si, protagonizaram um duelo de proporções colossais onde no fim, Crio acabara sagrando-se vencedor. Próximo dali, e indo de encontro aos dois na ilha de Marajó, Capella externava toda sua preocupação quando pressentira o desaparecimento súbito, do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero. Inclusive, um acontecimento recente do seu passado, que envolvia ambos numa situação muito similar aquela, acabara emergindo de suas recordações.

 

Capítulo 4: A partir de uma das lembranças de Capella, ele e Dante são apresentados num confronto com alguns Marinas de Poseídon. A situação em si, revela ao Cavaleiro de Prata de Auriga um lado de seu amigo que ele gostaria de não ter descoberto. De volta ao presente,Capella se põe novamente em movimento, determinado a chegar tão logo, em Marajó.

 

Capítulo 5: Tendo que abandonar, tão logo, e a contragosto, aquele corpo que lhe servira de morada, já que esse, devido as suas constantes e desmedidas liberações de poder se decompusera rapidamente, Crio vê diante de sua pessoa surgir Dante a quem pensava, outrora, ter eliminado. Muito ferido, o Cavaleiro de Prata de Cérbero trajava sua Armadura, sendo essa, a responsável por sua sobrevivência. Antes de partir, para garantir seu direito de posse perante Marajó e ao mesmo tempo dar cabo em definitivo de Dante, o Titã invoca, através de uma fenda dimensional, um Telquine. Contudo, a besta marinha acaba derrotada. Com a situação aparentemente resolvida, o Cavaleiro de Prata de Cérbero pretendia deixar a ilha, regressando assim, ao Santuário, quando, para o seu mais completo horror, observara impotente os habitantes do lugar, que antes havia salvado, serem brutalmente assassinados. O responsável não é outro, senão Hyperion.

 

Capítulo 6: O encontro de Hyperion com Dante, em Marajó, trouxera a razão empregada pelo Titã, para alguns delicados impasses da vida e conhecimentos seus, a respeito dos Cavaleiros de Athena. Em contrapartida, Dante expusera seus sentimentos em relação a Capella e aqueles que considerava como sendo sua ‘família’. A divergência, mesclada ao desejo desenfreado por justiça e punição do Cavaleiro de Prata de Cérbero, contra a intenção declarada, e arbitrária, de Hyperion em exigir deste, total subserviência, os levam ao confronto.

 

 

 

 

Capítulo 7 Oposição ao Mau

 

 

A cor da dor é o vermelho-sangue.”

Seu gosto é o do metal amargo.”

Seu som é uma voz gritando do fundo da alma.”

Dante urra.

 

Sua mente e corpo clamam por liberdade.

 

Não, eles a exigem!

Os braços tentam desesperadamente se livrar do contato com a mão de Hyperion que mantinha seu pescoço agarrado e firme.

 

Quando esta tentativa mostrara-se falha, o rapaz, como a um possesso e grunhido semelhante a um animal enjaulado, desferira socos e pontapés desordenados, estes com força suficiente para por abaixo, uma parede de concreto. No entanto, o corpo mirrado do garoto, a quem buscava agredir, parecia a tudo suportar, apenas os estragos em suas vestes, testificavam o que sofria.

 

Em verdade, o poder do Titã, regenerava os danos, menos de uma fração de segundo, depois destes se manifestarem.

 

Dada a altíssima velocidade do decorrido, causava a falsa sensação que ele estava tolerando ao massacre sem se ferir.

 

Os esforços do Cavaleiro de Prata de Cérbero persistem até quase o seu completo esgotamento e se mostram tão inúteis quanto sua tola tentativa de resistir ao poder mental de Hyperion, que inundava sua mente e o estava forçando a mais abjeta servidão.

 

 

 

 

Mente do Cavaleiro de Prata de Cérbero.

Em um dos Três Planos da Realidade.

 

 

No limiar dos pensamentos de todas as criaturas sencientes, onde memórias e sonhos convergiam, havia um plano, ou melhor, um mundo, totalmente inóspito que se estendia paralelo aquilo que muitos de nós, considerávamos como sendo ‘real’.

Diferente do nosso universo, com sua estrutura física preestabelecida de maneira igualitária para todos que nele coexistem, cada mente projetava, a sua maneira, seja de forma deliberada ou não, sua própria concepção do Plano Astral.

 

No caso do Cavaleiro de Prata de Cérbero, o local em si, neste derradeiro momento, compunha-se de um nevoeiro.

Avançando o olhar por dentro dele é possível notar um vale com rochas áridas e salientes. Ladeando este cenário havia um córrego escarlate.

 

No ponto onde seria a nascente, se encontrava Dante; cansado, ferido, pele e face desfigurada por conta das horríveis queimaduras.

 

Estava mergulhado, até os joelhos, naquele liquido viscoso.

Sobre si, ainda trajava, a já bastante danificada, Armadura de Prata da Constelação de Cérbero!

Saindo do veio carmesim, via-se também, correntes negras entrelaçando o corpo do rapaz, prendendo-o; em demasia, apertavam-no, fazendo dele, escorrer, algo semelhante a sangue, mas que na verdade, era sua vontade, que cada vez mais esvaia.

 

C-Capella...

 

Delirante, chamava pelo amigo.

— Encare a realidade, Cavaleiro de Athena. Isso aqui não é um conto de fadas... não existem finais felizes... pelo menos, não para você...

À voz soara de repente, como vinda de um abismo, fazendo com que alguma lucidez fosse despertada, em Dante.

Dolorosamente, e limitado pelo seu confinamento, o rapaz tentava localizar sua fonte e reconhecê-la.

Foi então que vira uma inusitada e pequena figura emergir do regato.

Era tão diminuta sua silhueta, tão frágil e delicada como a de uma criança.

Completamente nua, lavada de sangue, erguia-se no ar sem qualquer esforço aparente, deslizando com uma calma insuportável, vindo na direção do Cavaleiro de Prata de Cérbero.

 

O menino havia chegado bem próximo dele e se detido.

Sua pele era escura em excesso como ao ébano, e as unhas de suas mãos e pés, reluziam como vidro polido.

Seu rosto infantil era perfeito e sem nenhuma marca de expressão.

Parecia não ter mais que oito anos de idade.

E era tão surreal sua presença, que mais se parecia com um cúpido saído de uma das telas de Caravaggio; sedutor, mas etéreo, com lindos cabelos castanho-avermelhado a moldurar-lhe o crânio, descendo em abundantes cachos, até os ombros diminutos.

— Portanto, desista de uma vez...

 

Continuou, a criança.

— Ninguém aparecerá, no ultimo instante, para salvá-lo.

“Seu amigo e ‘família’ nada podem fazer.”

 

“Suas crenças não passam de ilusão.”

 

 

 

De volta ao Plano Material.

No que havia restado da Ilha de Marajó.

 

 

Nãoooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo!

Mesmo oscilando entre estar desperto e a inconsciência, com sua garganta sendo obstruída pelo aperto visceral dos dedos de Hyperion, e mergulhado dentro de si próprio, Dante berra alto de dor e desespero.

 

O Titã sorri diante da agonia latente que seu TUDO QUE SEU MESTRE MANDAR proporciona ao rapaz.

 

Mesmo consideravelmente limitado pelas circunstâncias sua técnica psíquica ainda se mostrava terrível.

— Trata-se de uma verdade bem simples, Cavaleiro de Athena...

 

“Negá-la só prolongará o seu sofrimento...”

 

“Vamos, minha supremacia me dá o direito sobre você, me sirva...”

 

ME SIRVA!”

Os olhos do Cavaleiro de Prata de Cérbero se abrem num ímpeto; dos globos oculares, um brilho carmesim brotara, se derramando num jorro energético.

A boca do Batedor se abrira, quase ao mesmo tempo, expurgando um grito pavoroso:

Arrrrrrggggggghhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!

Nunca em sua vida, Dante sentira tamanho horror. Uma vontade monumental que se sobrepunha a sua.

 

 

 

Não muito longe dali.

 

 

As fortes pisadas de Capella marcavam o solo vulcânico da ilha com chamas, levantando na esteira deixada por sua corrida, um incêndio.

 

Dada sua pressa, havia intensificado, além dos limites toleráveis e imagináveis, o poder de sua velocidade sobre-humana empregada em MARATONA — a técnica de locomoção dos Batedores do Santuário de Athena. Graças a isso, o rapaz acabara comprometendo um dos princípios cruciais deste poder que se relacionava com o fato de não agredir o cenário ou a si próprio mediante aos efeitos nocivos daquele tipo de deslocação.

 

Por sorte não havia mais nada em Marajó que pudesse ser afetado e em se tratando de sua própria segurança, Capella vestia sua Armadura, que o salvaguardava do severo atrito com o ar e a pressão que o esmagava.

Corria, o rapaz, desabalado, ignorando o cansaço que já se anunciava, cobrindo muitos quilômetros quase que instantaneamente.

Enquanto seu corpo empenhava-se naquela tarefa, ignorando, deliberadamente, suas consequências, a mente do Cavaleiro de Prata de Auriga analisava, repetidamente, os últimos acontecimentos que pudera acompanhar pelo Cosmo:

Já fazia um bom tempo que sentira a presença de Dante desaparecer.

 

Isso ocorrera em meio a um surto luminoso que irrompera da ilha até os céus.

Sobreveio a isto, o reaparecimento do amigo, e junto dele, outro aumento absurdo do Cosmo da Manifestação, que eles outrora perseguiam e que o Cavaleiro de Prata de Cérbero tinha tomado a decisão de enfrentar sozinho.

Capella ficara mais alarmado do que já estava, pois notara que aquele poder, além de mais uma vez, suplantar os dos invencíveis Cavaleiros de Ouro, possuía agora contornos divinos.

Entretanto, aquilo não durara e deveria ter custado muito ao seu perpetrador, já que este se esgotara até seu desfalecimento, contudo, o ocorrido culminara num fenômeno dimensional de onde percebera emergir outro ser.

 

Essa nova Manifestação, que fora, provavelmente, invocada pelo sacrifício da anterior, detinha um Cosmo igualmente avassalador, contudo, havia neste, particularidades que o Batedor não conseguira deduzir.

 

Seu desaparecimento não tardou, e Capella constatara que aquilo só podia significar que Dante conseguira, de alguma forma, vencê-la, resolvendo definitivamente aquela crise.

 

Na verdade, orava fervorosamente a Athena para que isso realmente tivesse acontecido.

A sensação de conforto, infelizmente, fora breve, pois passara alguns instantes, um Cosmo, tremendamente extraordinário e sombrio, aparecera no mesmo local, onde o Cavaleiro de Prata de Auriga detectava a presença do amigo e de outras bem fracas, que imaginava pertencer aos moradores de Marajó, que por sua vez, haviam sido salvos, inicialmente, por Dante.

Junto com essa Manifestação, veio um irresistível esplendor, que como o sol, varrera toda a extensão da ilha, incinerando tudo em seu caminho.

 

Estarrecido, Capella assistira, em meio ao seu desvanecer, grande parte de Marajó sumir e depois as águas do oceano se agitaram, avançando estrondosa, para reivindicar o espaço deixado.

A partir disso, o rapaz não mais conseguira sentir o pequenino Cosmo das pessoas daquela ilha e mesmo o de Dante enfraquecera ao ponto de quase não ser mais percebido, só havia por lá pairando, a assombrosa presença daquele Cosmo.

E este era o ponto de referência para Capella!

 

Mesmo sem conhecer o lugar, já havia o Batedor, traçado uma rota quase que precisa.

 

Como era de seu hábito, e bem característico de sua pessoa, o Cavaleiro de Prata de Auriga já tinha arquitetado um plano.

— Aguente só mais um pouco, Dante... logo estarei junto de você... por isso, até lá, mantenha-se vivo... mantenha-se vivo!

 

 

 

 

Plano Astral.

 

 

Preso pelas correntes do seu próprio imaginário, e imergido num rio vermelho que seria sua força de vontade se esvaindo, Dante perdera o pouco de controle que ainda lhe restava, quando sentira o toque de Hyperion.

 

— Não... nãããããããõooooooooooooooooo... FIQUE LONGE DE MIM!

Entretanto, o Titã parecia alheio aos seus apelos histéricos, sorria com um contentamento genuíno estampado na face.

 

O Cavaleiro de Prata de Cérbero, por sua vez, tinha a cabeça segura, lateralmente, pelas pequeninas mãos daquela criança inumana.

 

— Já que invadir sua alma, privando-o gradativamente de sua vontade, não fora suficiente para que me servisse, irei agora, aprofundar-me em suas lembranças, me escondendo dentre elas e até que me ache, elas o atormentarão:

 

ESCONDE-ESCONDE!”

 

Hyperion sorri.

 

Não havia vestígios de sordidez na sua expressão, apenas certa inocência que ignora deliberadamente qualquer maldade que possa haver em seus atos.

Arghhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!

 

Grita desesperado Dante, quando o Titã, através de suas mãos que o tocavam, fora aspirado para dentro de sua cabeça.

Centenas de ‘fantasmas’, provindos das memórias do Batedor, são ‘vomitados’ do seu interior através de sua boca escancarada. Em seguida, flutuando ao redor dele, num véu fluorescente, gargalhavam com suas expressões distorcidas numa máscara de malignidade. Alguns desses ‘fantasmas’ sussurravam obscenidades e crueldades nos ouvidos de Dante, outros tentavam rasgá-lo puxando com violência seus membros. Totalmente submisso, o Cavaleiro de Prata de Cérbero nada podia fazer além de gritar...

E gritar muito!

 

ARGHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!

 

 

 

 

Ilha de Marajó,

perto de onde Hyperion e

Dante estavam.

 

 

Capella se detém.

Inexplicavelmente suas pernas tremiam assim como seus dentes.

O Cavaleiro de Prata de Auriga percebera sua respiração acelerada e o suor a lhe banhar o corpo.

 

Por Athena... o que está acontecendo?

A resposta para ele não vem com palavras, mas sim, de uma revoada de ‘fantasmas que surgira mais ao longe, no mesmo local para onde estava se dirigindo.

Era neste ponto que sentia a presença cada vez mais débil do Cosmo de Dante e a premência da Manifestação que ameaçava, a qualquer momento, englobar tudo em volta com seu poder.

Enquanto contemplava as tais aparições voarem em círculos, formando ‘anéis’ concêntricos nos céus noturnos, semelhante a uma espiral, Capella se perguntava contra quem, ou o que, seu amigo estaria lutando.

— Dante... — sussurrara.

No local onde estavam o Cavaleiro de Prata de Cérbero e o Titã...

 

A mente de Dante queimava no pesadelo de imagens vívidas, provindas de suas próprias lembranças, que haviam sido violadas e distorcidas, pelo ESCONDE-ESCONDE de Hyperion, destruindo-se por obra deste, em uma miríade incontrolável...

Um suplício psíquico sem fim!

— Você vai me obedecer... ou destruirei sua alma, transformando-o num vegetal de carne e osso...

Nãooooooooooooooooooooooooooooooooo!

Berrara o Batedor, agonizando, o corpo queimado convulsionando violentamente.

Obedeça! Faça o que eu digo! Não está ouvindo? Obedeça! OBEDEÇA! Vamos, seu retardado. É uma ordem! UMA ORDEM!

Cavaleiro de Athena”.

A frase ecoara em meio a neurônios fervilhando, e Dante agarrara-se nela para suportar a loucura e o terror impostos por Hyperion.

Quem era ele, Dante, afinal? O que passara? A brutalidade de seus pais que o fizera deixá-los ainda bem pequeno... toda violência e abandono das ruas, quando já usava, desajeitado, o Cosmo para sobreviver, manifesto este, inicialmente durante a experiência traumática de um estupro... o treinamento no Santuário... na Ilha de Andrômeda e depois... com Jared e Irulane no deserto...

Mestre Jared...

 

 

 

 

Lembranças de Dante.

Anos Atrás — Arábia Saudita,
próximo à cidade de Buraydah.

 

 

Anoitecer.

O sol mergulhara ainda mais baixo e a escuridão se estendera sobre a depressão arenosa. Linhas de cores berrantes espalharam-se sobre o horizonte do poente, fluindo sobre um dedo de trevas que sondava a areia. Depois, sombras negras, como carvão, se propagaram e o rápido cair da noite ocultaram a face sinistra do deserto.

Estrelas!

Jared olhava para elas sentindo um estranho sentimento de presságio.

À noite, em meio às areias, voltando-se para o alto com um sentimento de elevação.

 

O peso do dia se afastava e uma leve brisa soprava em seu rosto encoberto por panos. O ar estava, como sempre, quente e opressivo. Tomado naquele começo de noite, por uma quietude causada pelo mormaço e em parte por um sentimento de temerosa antecipação, como se a vida estivesse em compasso, de espera.

 

Em meio ao rigor e a solidão daquelas paragens, o homem de meia idade e pele acobreada, trajado com as vestes costumeiras dos Peregrinos do Deserto, observava a chegada do menino que fora treinado, inicialmente, por Albiore, o Cavaleiro de Prata de Cefeu e Senhor da Ilha de Andrômeda.

— Eu sou Mahai Jared, um dos Tutores do Santuário e responsável pela Armadura de Prata de Cérbero...

 

“Você deve ser o mais novo Aspirante que veio aqui, tentar obtê-la, estou certo?!“

— S-Sim senhor, e-eu me chamo Jimmy, é uma honra conhecê-lo e poder ser seu discípulo, mestre.

Disse tímido, o menino, tentando ser respeitoso e educado, colocando em seguida, a mochila com suas coisas no chão.

— Quanto tempo ficou na Ilha de Andrômeda, Jimmy?

— Quase três anos.

— Então, diga-me o que Albiore te ensinou...

— A-Agora mesmo, mestre...

O menino tomou fôlego antes de continuar, lutava para se manter calmo, não esperava aquele tipo de recepção. Sua viagem até ali fora cansativa e pouco confortável. Ansiava no momento por descanso e uma refeição.

— Graças a CONSCIÊNCIA CÓSMICA já sou capaz de sentir presenças com meu Cosmo e controlar a intensidade do mesmo...

 

“Sei também enviar e receber mensagens telepáticas em curta distância, e entender as palavras proferidas nos mais variados idiomas, extraindo mentalmente, de quem as diz, seu significado... fazendo o mesmo por aqueles a quem me dirijo... podendo assim, estabelecer comunicação em qualquer língua falada...”

 

“Por fim, posso lançar mão da força e velocidade sobre-humana.”

— Isso foi tudo que aprendeu?

Disse lacônico, Jared, não se mostrando nem um pouco impressionado com aquilo que Jimmy lhe dissera.

Isso deixara o jovem Aspirante constrangido e aumentara significantemente seu nervosismo.

— N-Não, há algo especial que aprendi, diretamente com mestre Albiore, que estava querendo guardar para...

Mostre-me!

Jimmy assentira positivamente com a cabeça ficando sobressaltado com a forma ríspida que fora interrompido. Respirara fundo e fechara os olhos, assumindo uma postura de total concentração.

Seu Cosmo então surgira, envolvendo-o, Jared, com a face e o crânio envoltos em panos, onde apenas os olhos castanhos escuros ficavam visíveis, observava tudo atentamente, e com um disfarçado interesse.

 

Súbito, inúmeros pontos cintilantes cor de ébano apareceram, vindos de dentro do solo arenoso, pairando ao redor de Jimmy.

 

ARSENAL INFINITO!

O menino conclamara estendendo as mãos, e nelas, começara a se reunir toda aquela poeira negra brilhosa.

Incrivelmente, dessa concentração formara-se uma corrente com dois manguais nas extremidades.

Terminado o processo, Jimmy abrira os olhos e exibira confiante, para seu mais novo Tutor, o produto de seu árduo treinamento com Albiore.

Alquimia, hein?!

 

“Nada mal, menino. Quem sabe você sobreviva um pouco mais que os outros.”

Jimmy não se intimidara ante a esse comentário de Jared. E retribuíra o olhar de desafio do mesmo com confiança e determinação.

Surpresa!

 

“Parece que encontramos mais do que um mero Aspirante, dessa vez.” — pensara consigo, cheio de expectativas, o Peregrino do Deserto.

 

“E já não era sem tempo... muitas gerações de Cavaleiros haviam se passado sem que a Armadura de Prata de Cérbero, tivesse um portador.”

 

“Quem sabe esta criança consiga reverter isso... sobrevivendo ao árduo treinamento... e em principal, a Irulane, sua serva e que no passado, também fora sua aluna. Está, achando agir em segredo, insistia em assassinar seus aprendizes... um hábito repudiável da jovem, mas que servia aos desígnios dele, logo que o ajudava determinar o poderio daqueles a quem estava ensinando.”

 

“Se estes não eram capazes de vencer Irulane, que chances teriam de trazer do Mundo dos Mortos, a Armadura?”

 

A princípio, esta ‘lógica’ parecia bastante cruel, no entanto, no entendimento de Jared, fazia-se necessária, pois a tentativa da recuperação do traje custaria lhe à vida.

 

Queimando seu Cosmo além do tolerável, o Peregrino do Deserto abriria um portal para o submundo, pelo qual, seu discípulo haveria de adentrar e daí então resgatar a Armadura. Caso esse falhasse, não só morreria, como o sacrifício de Jared, teria sido em vão.

 

— Este é o deserto, Jimmy. Aqui a comida é escassa e quase não há água. A temperatura vai de um calor causticante a noites que enregelam os ossos. O Cavaleiro de Prata que pretendo sagrar não pode ser menos do que resistente a isso...

 

Estou sendo claro?!”

— Sim, mestre.

— Você me parece ser uma boa pessoa. Seu ser emana bondade e preocupação para com seu próximo, requisitos básicos e indispensáveis para ser um devoto de Athena...

O menino sorrira timidamente em retribuição ao comentário, que a seus ouvidos, soara como elogio.

Entretanto, essas coisas em demasia podem comprometer sua sagrada obrigação, você me compreende?

Jimmy não compreendia, mas mesmo assim balançara a cabeça, positivamente.

 

— E guarde bem o que vou te dizer agora:

Sua vida não é minha responsabilidade. O meu único dever aqui é te preparar para que se mostre apto a incorporar-se as fileiras do Santuário.”

 

“Mesmo assim, eu só lhe mostrarei a porta, a decisão de atravessá-la será inteiramente sua... está entendendo onde estou querendo chegar?”

— Sim, mestre.

Dessa vez ele entendia. O sorriso desaparecera do seu rosto assim como a arma que tinha em mãos e que havia se desfeito em pó.

Ordenara, Jared, em seguida a resposta do menino, que esse acomodasse sua mochila, junta com as outras bagagens, que já estavam condicionadas, ao lado do lombo de um de seus camelos.

— Teremos um longo caminho pela frente. Quero que me diga uma última coisa para que possamos, enfim, partir...

Jimmy ouvia atentamente Jared, enquanto pela primeira vez, avaliava os dois animais que estavam parados, indiferentes, e próximos de onde ele e seu Tutor estavam.

O menino achara os camelos bastante desagradáveis e sentia arrepios só de imaginar que teria de montá-los.

 

— Albiore lhe contou pelo que vai passar aqui? Ele lhe falou do Legado de Cérbero?

Não, mestre...

 

“Confesso que insisti muito para que me contasse alguma coisa, mas limitou-se a dizer que eu ouviria tudo que precisava do senhor.”

Jared parecia bastante satisfeito com o que ouvira.

 

Sempre admirara o Cavaleiro de Prata de Cefeu, a quem conhecia bem, por sua postura, poder, caráter e discernimento impecáveis.

Contudo, só achava que Albiore era paternalista demais para com seus alunos.

 

Um erro, pensava Jared.

— Bom, enquanto viajamos, eu lhe contarei tudo...

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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  • 1 mês depois...

LEMBRE A HISTÓRIA

 

Capítulo 1: Um ano se passou desde que os Titãs foram libertos do Tártaro por um desconhecido. Hyperion e Crio, ambos de posse de corpos mortais que lhes servem provisoriamente de morada, decidem vir a Terra. Enquanto o primeiro, Hyperion, veio no cumprimento de uma obrigação imposta por Réia, àquela que governa os Titãs na ausência de Cronos, e em meio a isso, aproveitou para desfrutar daquilo alcançado pela humanidade em sua jornada, o segundo, Crio, que viera a Terra por conta própria, pratica uma mortandade numa ilha remota do Brasil. Depois de um breve encontro entre eles, fica sabido que dois Cavaleiros de Athena estão se dirigindo para o mesmo local da chacina onde agora se encontra Crio.

 

Capítulo 2: Dante e Capella, Batedores do Santuário, respectivamente Cavaleiros de Prata de Cérbero e Auriga, dirigem-se velozmente ao encontro de Crio na ilha de Marajó. Durante o percurso, e depois de uma breve discordância, envolvendo a decisão e as consequências de enfrentar, ou não o Titã, Dante se propõe a encará-lo sozinho, afirmando ser o mais indicado para a batalha.

 

Capítulo 3: Exibindo-se com a figura aterradora de dois gigantes, Crio, que teria alcançado aquela envergadura através de seu incrível poder divino, que por sua vez, teria forçado o crescimento indiscriminado do corpo possuído pelo Titã, e o outro, Dante, que a partir do ajuntamento de suas correntes e manguais gerara um construto metálico para si, protagonizaram um duelo de proporções colossais onde no fim, Crio acabara sagrando-se vencedor. Próximo dali, e indo de encontro aos dois na ilha de Marajó, Capella externava toda sua preocupação quando pressentira o desaparecimento súbito, do Cosmo do Cavaleiro de Prata de Cérbero. Inclusive, um acontecimento recente do seu passado, que envolvia ambos numa situação muito similar aquela, acabara emergindo de suas recordações.

 

Capítulo 4: A partir de uma das lembranças de Capella, ele e Dante são apresentados num confronto com alguns Marinas de Poseídon. A situação em si, revela ao Cavaleiro de Prata de Auriga um lado de seu amigo que ele gostaria de não ter descoberto. De volta ao presente,Capella se põe novamente em movimento, determinado a chegar tão logo, em Marajó.

 

Capítulo 5: Tendo que abandonar, tão logo, e a contragosto, aquele corpo que lhe servira de morada, já que esse, devido as suas constantes e desmedidas liberações de poder se decompusera rapidamente, Crio vê diante de sua pessoa surgir Dante a quem pensava, outrora, ter eliminado. Muito ferido, o Cavaleiro de Prata de Cérbero trajava sua Armadura, sendo essa, a responsável por sua sobrevivência. Antes de partir, para garantir seu direito de posse perante Marajó e ao mesmo tempo dar cabo em definitivo de Dante, o Titã invoca, através de uma fenda dimensional, um Telquine. Contudo, a besta marinha acaba derrotada. Com a situação aparentemente resolvida, o Cavaleiro de Prata de Cérbero pretendia deixar a ilha, regressando assim, ao Santuário, quando, para o seu mais completo horror, observara impotente os habitantes do lugar, que antes havia salvado, serem brutalmente assassinados. O responsável não é outro, senão Hyperion.

 

Capítulo 6: O encontro de Hyperion com Dante, em Marajó, trouxera a razão empregada pelo Titã, para alguns delicados impasses da vida e conhecimentos seus, a respeito dos Cavaleiros de Athena. Em contrapartida, Dante expusera seus sentimentos em relação a Capella e aqueles que considerava como sendo sua ‘família’. A divergência, mesclada ao desejo desenfreado por justiça e punição do Cavaleiro de Prata de Cérbero, contra a intenção declarada, e arbitrária, de Hyperion em exigir deste, total subserviência, os levam ao confronto.

 

Capítulo 7: Em meio ao horror vívido de ter suas memórias violadas e direcionadas contra si próprio, Dante resiste bravamente à dominação psíquica imposta por Hyperion. Durante os pesadelos intermináveis que o acomete, e da aproximação de Capella até onde estavam, a lembrança do que seria o Legado de Cérbero vem a tona no relato de um dos seus Tutores, Jared (aqui começa, o que seria o Hipermito de Saint Seiya, adaptado para as Crônicas de Athena).

 

 

 

 

Capítulo 8 (primeira parte) Legado de Athena

 

 

— O dia não tarda a nascer... — dissera a figura envolta em panos, montado no camelo, com apenas as vistas descobertas mirando o firmamento.

 

“No deserto deve-se viajar à noite e repousar na sombra durante o dia.”

 

Completara, Jared.

 

Haviam percorrido já uma boa distância.

 

O movimento cadenciado das montarias causava sono e náuseas em Jimmy(1).

 

Ele mal ouvira o que seu Tutor acabara de lhe dizer.

 

Abrira os olhos preguiçosamente, contendo um bocejo, sua visão demorando a focar-se na imobilidade da paisagem homogênea que se apresentava infindável diante de si.

 

Incansáveis redemoinhos de ar aquecido começavam a tremular entre as dunas.

 

Focava o que acreditava ser o norte, ao longo de uma linha pedregosa, e observara uma escarpa longínqua.

 

O perfil das rochas desnudas era como o de um antigo encouraçado, recortando-se entre as estrelas. Sua longa extensão erguendo-se sobre uma onda invisível.

 

A lua, avermelhada pela poeira, erguia-se acima do horizonte à esquerda, e Jared sabia que, aquilo, representava perigo.

 

— Vamos para o sul mantendo-nos junto das rochas. Se a tempestade de areia nos apanhar em espaço aberto, teremos sérios problemas.

 

Com um comando hábil de arreio, o Peregrino do Deserto fizera com que seu camelo, aumentasse o passo.

 

Tentando imitá-lo, Jimmy executara o mesmo, só que com um pouco mais de brusquidão e isso fizera sua montaria dar uma guinada, que por sua vez, o arremessara de costas ao chão.

 

Erguera-se aborrecido. Jared se limitava a observá-lo. Em nenhum momento dera sinais que voltaria para ajudá-lo.

 

O menino engolira um seco quando assimilara que não teria auxílio e que se não fizesse algo rapidamente seria tragado pela ameaça que se anunciava.

 

A calma se esvaia e dava lugar ao medo. Jimmy sentia seus dentes baterem. Mordera com força para pressioná-los. Então ouvira sua própria voz, baixa e controlada, recitando os ensinamentos valiosos do seu, outrora Tutor, Albiore, o Cavaleiro de Prata de Cefeu:

 

— O medo é o assassino da mente.

 

“Deve-se enfrentá-lo. Permitir sua passagem sem que esse o carregue consigo.”

 

“E quando este se for, passe a vislumbrar atentamente sua trilha.”

 

“Assim, notará que por onde o medo trilhara seu caminho, apenas você... permanecera!

 

Calmo, Jimmy voltara a montar o camelo, e dessa vez, executara o movimentando corretamente.

 

O Peregrino do Deserto mantivera seu olhar, todo o tempo, sobre ele, reprimindo a satisfação.

 

Caminharam lado a lado e em total silêncio por mais algum tempo, até que o Guardião da Armadura de Prata de Cérbero resolvera novamente, falar:

 

— O que está achando do deserto, Jimmy?

 

— A vida poderia ser boa aqui — o menino respondera sem se voltar.

 

Antes de continuar, fizera uma pausa e depois concluíra, se virando na direção de Jared.

 

— Aprecio principalmente a quietude que se faz presente em todo lugar.

 

“A mente deve-se ajustar ao ambiente e a qualquer situação.” — pensara Jimmy, agarrando-se uma vez mais, ao que aprendera com Albiore, na Ilha de Andrômeda — “Mantenha-se no controle, não importando aquilo que o acerca, ou que lhe esteja afligindo.”

 

Jared sabia que o jovem Aspirante estava tentando usar sua CONSCIÊNCIA CÓSMICA para abarcar todos os rigores à volta, como se esse fosse, um lugar comum, adaptando-se a si próprio as circunstâncias.

 

Passara por ele, erguendo uma espécie de monóculo rústico, ajustando sua única lente e observando a escarpa adiante.

 

“Sim, estavam chegando.”

 

Havia, entre as rochas, uma tenda.

 

Sua serva, Irulane, estaria à espera deles, com uma refeição matinal para recepcioná-los.

 

Enquanto Jared ocupava-se com aquilo, Jimmy aproveitava, para trazer a tona, em seus pensamentos, o que lhe fora dito a respeito do Legado de Cérbero, que por sua vez, envolvia diretamente, o Legado de Athena...

 

 

 

 

Algumas horas atrás.

Revelações de Jared.

 

 

 

— O que lhe direi aqui, eu como seu mestre, o proíbo de registrar, ou mesmo, contar para alguém...

“Que você guarde tudo, em segredo, no seu coração.”

 

“Sei que é muito novo para entender o peso do que lhe será revelado, entretanto mais do que fazê-lo compreender ou lhe proporcionar conhecimento, eu desejo lhe dar os meios para combater o mal quando este, no futuro, tentar seduzi-lo com poder e promessas de grandiosidade.”

“Quando se sentir compelido a tomar, em mãos, o poder que trás consigo, o usando em seu proveito pessoal, lembre-se que este, não lhe pertence...”

 

“Pertence ao mundo... à Athena... que a tudo sacrificou pela humanidade e que, a nós, confiou o mesmo destino.”

“A imolação de nossa adorada Deusa e tudo mais que irei te contar agora foi me revelado por palavras escritas do seu próprio punho.”

“Saiba que Athena mantém um registro detalhado de todas MachiasGuerras Divinas, ou Santas, como alguns preferem chamá-las — que travara e tivera conhecimento, e ainda, algumas valiosas informações que lhe foram conferidas. Dentre as tais há aquelas conferidas pelo seu grandioso pai, Zeus, e também, pelo seu avô, Cronos, que a estimava muito, e sentia por ela, uma imensa e arrebatadora admiração.”

 

“Em suma, o que lhe será dito, está gravado, para sempre, em códices(2) antiquíssimos que estão guardados na Biblioteca Principal do Santuário, que fica no Templo de Athena.”

Ninguém tem acesso a eles, a não ser, claro, nossa Deusa, ou aqueles poucos abençoados, como eu, que têm sua autorização pessoal para vê-los.”

 

“Mesmo aos Grandes Mestres, muitas dessas informações, permanecem veladas.”

“Estes textos formam uma imensa coleção intitulada de:”

 

AS CRÔNICAS DE ATHENA!”

 

“Se encontram protegidos, por meios divinos, que os impedem de deteriorar ou de serem consultados por quem não é devido.”

“Para que entenda o Legado de Cérbero, deve antes ter noção do Legado de Athena.”

“Voltaremos agora no tempo, até a época, onde mesmo, os Deuses, ainda não existiam.”

É desse ponto que tudo começa:”

“A vida originou, quando do Caos, Gaia, após emergir, disseminou a criação, através da Dunamis.”

 

“Havia também Uranus, e este, a desposara.”

“Dessa união vieram os Hecatônquiros, Ciclopes e Titãs.”

“Por razões que envolviam temor e ciúme, Uranus aprisionara seus filhos no Tártaro, poupando deste terrível destino, apenas os Titãs.”

“Essa arbitrariedade em nada agradou Gaia, que após não conseguir fazer com seu conjugue voltasse atrás em sua decisão, inspirou a vingança nos corações da sua prole que fora poupada, fazendo com que esses, viessem contra seu pai.”

Cronos, agraciado por sua mãe, com uma das Sephiroths, batalhara então, sendo ele, auxiliado pelos seus outros irmãos.”

 

“Assim teve origem a primeira guerra chamada de Genesemachia.”

 

“Sobrepujado pelos seus filhos, Uranus fora deposto.”

 

“Em seu lugar, como soberano de tudo que havia, apresentara-se Cronos.”

“Nos seus instantes finais, Uranus lançara sobre esse seu filho, uma profecia, trazendo está, a revelação que, assim como ele, Cronos cairia pelas mãos de sua descendência.”

 

“Atormentado por razão disso, o Titã acabara incapaz de dedicar amor a sua progênie, os Deuses, e os tratava com eterna desconfiança.”

“Inconformados... Zeus, Poseídon e Hades... colocaram em curso, apoiados pela maioria dos seus pares, e outros, uma rebelião que cumpriria o previsto por Uranus.”

“Tal evento ficou conhecido como Titanomachia.”

“Essa guerra, entre Titãs e Deuses, tratada como a mais calamitosa que se tem notícia, trouxera, entre tantas coisas, o surgimento da raça humana.”

“Antes do seu desfecho, por um demasiado tempo, humanos e divindades partilharam de uma convivência mútua e mesmo quando Zeus, após prevalecer sobre seu pai, os apartara, confinando cada qual, em seu próprio plano, interagiam, vez ou outra, em completa harmonia, e por vastos anos isso perdurara, até aparição daquela que seria, a criatura mais temida que já houvera, Tífon!”

“A besta era, supostamente, uma das muitas Feras Mitológicas geradas por Réia.”

“Muitas foram as ‘crias’ da Rainha dos Titãs que tiveram que ser combatidas arduamente pelos Deuses e até por alguns heróis humanos da antiguidade, durante a Titanomachia e mesmo depois dela, pois alguns desses monstros, como era o caso de Tífon, não haviam se manifestado.”

 

“O que fazia desta Fera Mitológica uma ameaça como nenhuma outra, era que essa, trazia consigo, algo que a destoava e tornava sua força sem limites... uma habilidade chamada de:”

 

OUROBOROS!”

“Cada vez que confrontado por um poder que excedia ao seu, Tífon, semelhante uma serpente em sua troca de pele, criava para si, quase que de imediato, um novo corpo, emergindo com este, do interior de seu antigo, trazendo em sua posse, uma recém adquirida capacidade, que superava a daquele com o qual rivalizava.”

 

“Muitos foram aqueles que vieram em seu encalço para detê-la, exércitos inteiros, celebridades como Hércules, mas não houvera quem, pudesse lhe fazer frente.”

 

“Mesmo os Deuses, experimentaram de sua preeminência.”

 

“Como todos que eram chacinados pela besta tinham seus espíritos consumidos e não enviados para o Mundo dos Mortos como era de hábito após suas mortes físicas, Hades tivera que agir em razão dessas inestimáveis perdas, pois quanto mais numerosos eram os mortos em seus domínios, maior era seu poder, assim enviara seus Querubins, que apesar de acossarem a Fera Mitológica, acabaram vencidos, e tendo suas essências também devoradas.”

 

“Após o final do conflito com Tífon, viria à tona que alguns dos Querubins de Hades sobreviveram ao massacre a que foram sujeitados pela cria de Réia, e estes, agora liderados pelos dois maiores dentre seu meio, Hypnos e Thanatos, se rebelariam contra seu senhor, usurpando deste, após confrontá-lo mediante um ardil, seu domínio do submundo. Graças a Athena, que também se viu ameaçada por esses Querubins, Hades recuperaria sua posição, na batalha que ficou conhecida como, Anjomachia.”

“Zeus, preocupado com o agravo da situação, que trazia Tífon como uma desgraça sem precedentes, decidira envolver-se, e juntamente com um grupo de guerreiros que o servia pessoalmente no Olimpo, investiram contra o monstro.”

“Sobre os tais que combateram valorosamente ao lado do Senhor do Panteão, posso dizer, que pertenciam a uma raça de seres, com certo grau de divindade, chamados de Anjos.”

“Estes também eram conhecidos, vulgarmente, pela alcunha de Semi-Deuses, e tinham sua origem, na carnalidade de algumas divindades para com humanos.”

 

“A copulação que os gerara, após o término da primeira Machia contra Ares, um evento que ocorreria diversos anos mais tarde, seria proibida por Zeus, assim como qualquer tipo de interação, seja ela direta ou indireta, que pudesse haver entre divindades e mortais.”

“O Deus da Justiça, através de sua autoridade, decidira organizar os Anjos, e os reunir na sua presença.”

 

“Capacitando-os, atribuindo-lhes poder, ele selecionaria os mais tenazes e merecedores de sua confiança, para compor uma armada como nenhuma outra, antecedidos estes, por sua fama, como sendo os Atalaias do Olimpo.”

 

“Distribuídos entre cada componente do Panteão, a quem prestavam serviços e adoração, representavam a supremacia dos Deuses.”

“Os que serviam diretamente a Zeus, foram agraciados com o título de Serafins.”

Poseídon era assistido pelos Oceânides. Depois que rompera os laços com seus pares, seu lugar fora ocupado por Nereu, e o séquito deste, ficara conhecido como Nereidas.”

 

Hades, tinha ao seu lado, como já os mencionei, os Querubins. Assim como ocorreu com Poseídon, o Deus dos Mortos também desertara do Olimpo, e para o seu lugar, apresentara-se Deméter, e os Anjos dessa, tinham a alcunha de Elfos.”

 

“Diferente do Deus dos Mares, que não se importara de ter perdido seu posto no Panteão, Hades, por sua vez, ficara insatisfeito, ou melhor, indignado, e como punição a Deméter, por esta, ousar, em aceitar sua posição, raptara sua filha mais amada, Perséfone, desposando-a. Tal ato enfurecera a Deusa dos Bosques, que após invadir o submundo com suas hostes, e travar ferrenhas batalhas, tivera que ser contida pelo próprio Zeus que, mesmo com todas as diferenças interpostas entre ele e seu rancoroso irmão, propusera uma solução pacífica para o impasse. Depois de um longo debate, e devido a Perséfone confessar ter aceitado Hades, de bom grado, ficara decidido que ela passaria determinado tempo do ano com Deméter, e o outro meio tempo restante, com o seu esposo.”

 

“Voltando aos componentes dos Atalaias e aos Deuses a que reportavam:

“Aqueles que serviam a Hera, chamavam Musas.”

Virtudes era os que estavam ao lado de Athena. Depois dessa, abandonar o Olimpo, fora substituída por Pallas, e essa, tinha sobre sua incumbência, os Paladinos.”

Hércules trazia sob suas ordens os Trabalhos.”

“Já os de Hermes, revelavam como Presságios.”

Ares; Arsenais. Depois de sua rebelião contra Zeus, tivera seu posto ocupado por Afrodite, e consigo a Deusa do Amor, possuía os Cúpidos.”

Dionísio apresentava-se com seus Sátiros.”

Apolo; Planetas.”

Ártemis, aquela que possuía, dentre todo o Panteão, o maior séquito de Atalaias; Satélites.”

 

Hefestos, responsável por forjar, a partir de Cosmo solidificado, as Glórias, trajadas essas, pelos Anjos, tinha como seus auxiliares, os Nibelungos vulgarmente também conhecidos como Anões.”

 

Ao fim do embate com Tífon, mesmo com Zeus usando dos seus Selos para enfraquecer o monstro e até mesmo aprisioná-lo, algo que dera resultado em tempos passados, e até mesmo havia sido relevante, para a derrocada dos Titãs e de Cronos na Titanomachia, o Deus da Justiça, na companhia de seus Serafins, acabaram derrotados por Tífon e obrigados a se retirar do campo de batalha, regressando estes, para a segurança do Olimpo.”

 

“O Senhor do Panteão decidira então convocar seus demais pares e Anjos para a guerra contra a Fera Mitológica.”

“Entretanto, Poseídon e Hades não respondem aos chamados de seu irmão e permanecem, cada qual, em seus próprios domínios, apenas observando e aguardando o desfecho do que viria acontecer.”

 

“Mesmo lamentando a perda cada vez mais gradual dos espíritos terrenos arrebatados por Tífon, e a aniquilação dos seus inestimáveis Anjos por intermédio do mesmo, o Deus dos Mortos preferira manter-se o mais longe possível do monstro, e contava com o difícil acesso ao submundo, para isso.”

 

“Poseídon, por outro lado, preparava-se em segredo, tendo em mente, conter Tífon ao seu jeito, já que a cria de Réia, cedo ou tarde, se voltaria para seu esplendoroso reino submerso, principalmente quando tivesse devastado, e reduzido a nada, toda a superfície, inclusive, aniquilando ao próprio Olimpo.”

 

"Zeus teria investido contra os irmãos, por essa afronta, caso não fosse grande sua afeição e respeito pelos mesmos."

"Além das razões já citadas, Poseídon e Hades sempre desejaram a Terra, domínio de Zeus, e também queriam destituí-lo do comando do Panteão por acreditarem que eram mais capazes que o Deus da Justiça para tal ordenança, porém, por temerem combatê-lo abertamente, isso, remetente a Hades, ou de uma guerra generalizada que jogaria cada Deus um contra o outro, este, o caso de Poseídon, apenas aguardavam o momento de seu enfraquecimento para colocar em ação, esses seus planos."

“Foi a partir desse incidente que ficara claro para Zeus as reais intenções destes dois.”

“Dessa forma, viria a apartá-los do Olimpo e a destituí-los de seus postos de honra no Panteão, substituindo-os.”

“Nesse meio tempo, Tífon, ciente do imenso poder que Zeus estava reunindo contra ele, decidira agregar asseclas, para também formar um exército.”

 

“Assim, entrava em cena os Nefilins; uma raça de humanóides com corpos tão altos como montanhas.”

 

“Estes eram resultado da copulação praticada por alguns Anjos com humanos.”

 

“Tal coisa, assim como ocorrera com a interação entre divindades e mortais, seria, mais tarde, terminantemente proibida por Zeus.”

 

“Como amostra de seu comprometimento, Tífon partilhara com os Nefilins, superficialmente o conhecimento sobre OUROBOROS, fazendo com que estes, desenvolvessem um arremedo dessa habilidade, chamada de BERSERKER.”

 

“Graças a um surto de frenesi, os Nefilins podiam elevar seu poder contra seus rivais até o ponto de superá-los, contudo no processo, acabavam também enlouquecidos ou se autodestruíam quando a força acumulada excedia os limites toleráveis.”

 

”Além deste poder, foram agraciados com as Adamas, tornando agora, os Gigas de Tífon.”

“Tais couraças, feitas de pedras preciosas e semipreciosas, inspiradas nas Feras Mitológicas de Réia, dividiam-nos em duas classes:”

 

Elois e Morlocks.”

 

“Uma impressionante batalha é então travada!”

 

“Mediante a força incomparável de Tífon e, a brutalidade dos seus Gigas, o Panteão e seus Anjos, acabam vencidos e forçados a fugirem, se escondendo no Egito, onde acabariam sendo adorados pelos povos daquela região pela alcunha de outros nomes.”

“Sem a intervenção do Olimpo, a besta e suas falanges, implantariam seu domínio, aniquilando sumariamente qualquer oposição.”

 

“Aqueles que não são devorados, tornam-se escravos, e responsáveis por gerarem mais alimento para o monstro.”

“Logo após a passagem de alguns anos, exercendo sua hegemonia e barbárie, a Fera Mitológica, como já previsto, tentara invadir o reino submerso de Poseídon.”

“Este, para proteger, não somente seu império, como também aquilo que considerava como sendo a raça de humanos supostamente perfeita, os Lemurianos, com o qual, algum dia, pretendia povoar toda a Terra, dando origem assim, a Utopia que tanto acalentava quanto a um mundo ausente de mau, havia sacrificado sua unidade, com a DESENCARNAÇÃO, para tornar-se um, com os oceanos, detendo, graças a isso, pelo menos por enquanto, Tífon e suas hordas.”

“Os Oceânides também participam desta batalha, e em meio aos conflitos, os Lemurianos, organizados estes, como Marinas.”

 

“Enquanto isso, nos Campos de Iaru — o ‘paraíso’ egípcio — Athena reluta contra a atitude repulsiva e covarde de Zeus e do Panteão, que se negam, a enfrentar a Fera Mitológica novamente.”

“Inconformada, a Deusa da Sabedoria, junto de suas Virtudes, decide ir contra a besta.”

“Contudo estes acabam repelidos.”

Athena teria perdido a vida caso um grupo de jovens humanos não tivesse intervindo.”

“Comovidos pela dedicação e o amor da Deusa para com os povos oprimidos da Terra, um grupo de jovens heróis, vindo dos quatro cantos da Terra, e dotados de grande coragem, bondade e força, decidem lutar a seu lado.”

 

“Pela primeira vez desde sua criação, a raça humana cessara com os intermináveis conflitos entre si, e unidos em prol de uma só causa, haviam deixado suas diferenças e interesses provisoriamente de lado.”

“A fonte do poder sobre-humano desses heróis era o Cosmo.”

Aqui abre um parênteses na história...”

 

 

 

(1): Como revelado no capítulo anterior, vimos que Jimmy seria o verdadeiro nome de Dante.

 

(2): Códice trata-se de folhas de pergaminhos, ou papiros, dobradas e costuradas juntas, num formato que lembra muito o de um livro.

Editado por Leandro Maciel Bacelar
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